Nem todo investidor perde com a desvalorização das ações na Bolsa neste 2018. Existem os aplicadores "do contra", que apostam na queda dos ativos e, ultimamente, têm ganhado dinheiro com isso. É o caso dos fundos que, no jargão do mercado financeiro, "operam vendidos". Nos últimos seis meses deste ano (de fevereiro a julho), eles se deram bem. Enquanto o Ibovespa, índice com as principais ações da B3, registrou queda de 6,70% no período, esses fundos fecharam, em média, com alta de 3,21%.
Os operadores de mercado dizem que uma posição é vendida quando os investidores apostam na desvalorização de uma ação. Os Estados Unidos e a Europa têm longa tradição nesse mercado. No Brasil, ainda é difícil encontrar fundos "do contra". No entanto, o atual momento da economia, afetada por incertezas políticas e pelo aumento da tensão em torno do comércio global, tem levado investidores a se interessarem por esse tipo de produto.
Esses fundos ganham dinheiro "alugando" ações de outros investidores. Por meio das corretoras de valores, os gestores encontram quem esteja disposto a emprestar seus papéis recebendo um valor fixo mensal. Quando o contrato de aluguel termina, eles recompram as ações e devolvem aos investidores. O objetivo é ganhar na diferença, vendendo o papel na alta para recomprá-lo na baixa. Por exemplo: um investidor aluga uma ação e a revende por R$ 10. Como ele acredita na queda do ativo, ele espera por sua desvalorização, digamos a R$ 7. Daí ele recompra o mesmo papel e lucra R$ 3 pela operação, descontando-se os custos da locação
A pedido do jornal "O Estado de S. Paulo", um levantamento realizado pelo professor do Insper Adalto Barbaceia identificou 121 fundos que apostam na queda da Bolsa no País. Juntos, eles somavam em julho R$ 24 bilhões em patrimônio. Os demais fundos de ações somam R$ 816 bilhões.
Apostar na queda de uma ação é uma estratégia de alto risco, já que a maioria das empresas que vendem suas ações, governos e os demais investidores estão o tempo todo trabalhando para inverter essa realidade, fazendo as ações subirem. É por isso que esses fundos não ficam integralmente expostos a essa estratégia. Quando o mercado está com uma tendência de alta, eles reduzem seu portfólio de apostas contrárias, podendo até mesmo zerá-las. E, quando a situação se inverte, incrementam as "operações vendidas".
"Os gestores têm mais liberdade para trabalhar nesses fundos", explica Adalto Barbaceia, dando como exemplo o período de greve dos caminhoneiros, quando muitos conseguiram neutralizar a queda da Bolsa com o lucro de suas posições vendidas. Mas, essa operação não é garantia de menos risco. "Quando (a ação) sobe, pode-se perder em dobro", alerta.
A possibilidade de prejuízos enormes e a complexidade da operação são alguns dos fatores apontados pelos especialistas para que esse tipo de estratégia seja executada apenas por profissionais. "A operação mais trivial é de comprar ações, em que a ideia é vender por um preço maior. Na operação vendida, temos de inverter esse raciocínio", observa Giácomo Diniz, do portal Profundamentos.
Ele explica que a possibilidade de perda, contudo, é diferente. Isso porque, na compra tradicional de ações, se pode perder no máximo o valor investido no papel. Mas, no caso do investidor vendido, as perdas podem ser maiores
Gestores de fundos, entretanto, afirmam que a flexibilidade de poder apostar "a favor ou contra" ações é uma aliada para capturar rentabilidade na alta ou na baixa do mercado. Segundo eles, esse é um fator que ameniza os riscos para o investidor.
"Se bem utilizada a flexibilidade, esse tipo de fundo oferece mais possibilidade de proteção", afirma o gestor de portfólio da AZ Quest, Welliam Wang. "Em uma crise econômica, como a de 2008, por exemplo, o fundo, cairia menos que um fundo de ações comum", diz.
Para o gestor da Explora Investments, Leonardo Stockler, a decisão de apostar na queda do preço de uma ação parte de uma análise profunda do conjunto do mercado. Gatilhos como divulgação de balanços, perda de margens ou a entrada de um concorrente forte no mercado podem levar a essas apostas.
"Normalmente são empresas que entendem que determinado negócio não tem uma solidez tão relevante e, em função dessa dinâmica, os resultados podem sofrer no futuro", diz. Segundo ele, as posições vendidas geraram cerca de 70% da rentabilidade de 17,3% do fundo Explora LatAm Long Biased FIA em 2018.
Já Fabio Spinola, gestor da Apex Capital, afirma que a estratégia é uma boa alternativa para o investidor que quer acumular patrimônio no longo prazo. "Tenho convicção de que essa estratégia pode proteger o investidor na queda e alavancar o retorno nas altas. Mas, é preciso escolher um bom gestor."