A disparada do dólar, que já subiu mais de 25% no ano e na semana passada atingiu a maior cotação desde o início do Plano Real, provocou um corte de pelo menos 30% nas quantidades importadas de alguns dos produtos mais vendidos no Natal. A queda nos volumes de itens típicos dessa época do ano, como alimentos, bebidas e enfeites, especialmente os chineses, ocorre para evitar prejuízos com o possível encalhe. É que, com a alta do dólar, esses artigos devem ficar mais caros em reais para o consumidor.
"Calculo que a redução nas quantidades seja de 30% para mais", diz Rita Campagnoli, presidente do Conselho Brasileiro das Empresas Comerciais Importadoras e Exportadoras (Ceciex). A entidade reúne cerca de 800 empresas de médio porte que importam boa parte dos itens vendidos pelas lojas. A redução nos volumes, diz ela, ocorre principalmente nos produtos de menor valor, porque o risco de encalhe nesse caso é maior. Os consumidores desses itens têm menor poder de compra e são os mais afetados pelo desemprego elevado.
O corte nos pedidos é confirmado por Rodrigo Luis, sócio da Winpoint Technology, especializada em importar itens da China. Segundo ele, a redução é da ordem de 25% em relação aos volumes do fim de 2017. "Negociamos para outubro e novembro entre 25 a 35 contêineres com árvores de Natal, brinquedos, tablets e artigos de decoração com luzes de LED."
Diante da incerteza política, responsável pela maior parte da alta do câmbio, na opinião dos analistas, os importadores estão preocupados porque não conseguem repassar para os varejistas os aumentos de preços. Também não têm margem para absorver a alta de custos acima do esperado, uma vez que muitas empresas não contavam com o câmbio acima de R$ 4.
Por isso, há importadores que optam por perder menos: cancelar pedidos no exterior, abrindo mão de parte do pagamento que foi feito. "Há importadoras que cancelaram linhas de produtos", diz Rita.
Na lacuna deixada pelos concorrentes que cancelaram pedidos de Natal, Gustavo Almeida, diretor comercial da Yangzi Brasil, acredita que vai ganhar mercado. A empresa, que importa 4 mil itens, entre artigos de Natal e utilidades domésticas, decidiu manter os preços dos produtos de Natal e reajustar o de outros importados para compensar o aumento de custo nos itens de fim de ano. O empresário conta que fez três aumentos de preços neste ano que somaram 21% na linha de utilidade domésticas.
"Se eu tivesse só a linha de Natal estaria morto. Seria um ano todo jogado fora e dinheiro pessoal colocado na empresa para cobrir o prejuízo." A Casa Santa Luzia, tradicional revenda de alimentos e bebidas estrangeiros, sentiu a interrupção nas linhas de importados.
"Muitas importadoras deixaram de trazer uma série de coisas porque acharam que o preço não seria competitivo", explica a diretora Ana Maria Lopes. A saída é substituir o importado por um similar nacional, quando há, porque a importação por conta da própria empresa só se justificaria se fosse feita em grandes volumes.
"O poder aquisitivo caiu e as pessoas estão comprando menos importados", diz a diretora da Santa Luzia, voltada para o consumidor de maior renda. Para se ajustar à nova realidade de mercado, a empresa chegou a trocar alguns fornecedores no exterior e reduziu os volumes de itens exclusivos, como panetone italiano.
A freada nas importações de Natal não foi sentida pelas grandes empresas de comércio exterior. Elas normalmente importam carros e bens duráveis de maior valor. Isso acaba mais que compensando o recuo de bens não duráveis.
Lilia Miranda, diretora da Abece, associação que reúne as grandes tradings, espera um pequeno aumento, de 5% - menor do que o previsto -, nas importações de fim da ano feitas por essas empresas.
Importadoras que mantiveram os volumes de encomendas de final de ano tentam ganhar tempo para reverter as pressões de alta no câmbio. Uma das estratégias tem sido adiar os embarques no exterior, na expectativa de que o dólar dê uma trégua após o resultado das eleições.
Ciro Lilla, presidente das importadoras de vinhos Mistral e Vinci, que trazem 3 mil rótulos de 15 países, conta que, quando a cotação do dólar beirou R$ 4, o grupo decidiu atrasar os embarques no exterior. "Atrasamos na expectativa de pegar um dólar menor na hora de nacionalizar o produto."
Com a disparada do câmbio, os importadores foram duplamente penalizados, explica o presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro. Isso porque eles têm de desembolsar mais reais para trazer o produto de fora e gastam uma cifra maior para nacionalizá-lo.
Nacionalizar a importação significa pagar todos os impostos e as despesas e taxas com frete portuário. A conversão dessas despesas de dólares para reais é feita usando a cotação do câmbio do dia anterior à data do desembarque do produto no porto Com isso, as despesas de nacionalização, que já são elevadas, acabam sendo maiores ainda quando o dólar sobe.
Castro explica que a cifra gasta para nacionalizar um importado é o dobro do valor do produto em dólar, independentemente da taxa de câmbio. "O cenário para os importadores é muito ruim neste ano porque eles perdem sob o aspecto cambial e tributário", disse Castro.
Há também importadoras que tentam ganhar tempo de outra maneira: renegociando os prazos de pagamento com os fornecedores no exterior. "Muitos tentaram renegociar principalmente prazos", conta a presidente do Conselho Brasileiro das Empresas Comerciais Importadoras e Exportadoras, Rita Campagnoli.
Para Castro, da AEB, quem consegue renegociar contrato tem sorte "Pode ser até que para preservar clientes, os fornecedores aceitem alguma coisa, mas isso é uma raridade", diz.
Desconto. Na Mistral, onde o volume de vinhos importados está mantido, o presidente da importadora conta que tem conseguido pequenos descontos nas novas compras com alguns países. "Na compra, a gente chora e explica que é uma situação emergencial por conta das eleições." Neste momento, a empresa decidiu não repassar a alta do câmbio para o preços porque não vê espaço para aumentos. Com isso, tem conseguido ampliar as vendas. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.