O Brasil tem o mais recente ganhador do "Nobel da Matemática", o carioca Artur Avila Cordeiro de Melo, de 35 anos, que neste mês foi escolhido pela União Internacional de Matemática para receber a Medalha Fields, maior prêmio da área no mundo. Mas a realidade da educação básica brasileira está distante da excelência alcançada por Melo.
O País, por exemplo, ocupa a 58ª posição entre 65 países na prova de Matemática do Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa).
Preocupada com o desempenho brasileiro na área de exatas, a ONG americana Worldfund capacita professores de escolas públicas da rede estadual de São Paulo para passarem o conteúdo do ensino médio não só com teoria, mas também com experimentos práticos. Tornando as aulas mais atraentes, o projeto pretende aproximar os estudantes dessas áreas e, com isso, descobrir possíveis talentos que nem sabiam que tinham afinidade com as ciências exatas.
O passo escolhido para melhorar a performance dos alunos é aperfeiçoar as aulas dos professores. Para isso, a ONG capacita docentes das disciplinas de Matemática, Física, Química e Biologia.
Chamado de STEM Brasil (sigla em inglês para Ciência, Tecnologia Engenharia e Matemática), a iniciativa da ONG no País começou em 2009 e, depois disso, já formou mais de 1,7 mil professores em escolas públicas de Pernambuco, São Paulo e Rio Grande do Sul. Só neste ano, ela promove a formação continuada de docentes de 47 escolas integrais e coordenadores pedagógicos de 72 escolas integrais da rede estadual paulista. A estimativa de investimentos em 2014, feitos em parceria com empresas, chega a R$ 2 milhões.
As ações já renderam frutos: dentre as 47 primeiras escolas integrais de São Paulo que aderiram ao projeto no ano passado, as que mais utilizaram as atividades propostas pelo programa mostraram um aumento de até 40% na nota de Matemática na Avaliação da Aprendizagem em Processo, aplicada pelo Estado.
Segundo a diretora executiva da Worldfund Brasil, Kelly Maurice, as atividades propostas para os professores têm como foco o conteúdo exigido pelo governo para as séries do ensino médio e também o que é cobrado nos principais vestibulares e no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). "O foco são as habilidades necessárias para o século 21, para o mundo do trabalho e usamos muito o 'link' com vida real e com o dia a dia."
Em cada um dos ciclos do projeto são contratados, em média, oito professores formadores, que vão ensinar aos demais como incluir atividades práticas nas aulas. As primeiras experiências propostas pela ONG aos professores são feitas com materiais básicos e de fácil execução. Os formadores propõem projetos complexos conforme os docentes melhoram desempenhos.
Kelly explica que, com o projeto, os professores formados em suas licenciaturas resgatam o gosto pelas disciplinas que estudaram. "A paixão pela matéria volta e isso acaba sendo contagiante para o aluno."
A professora Mary Inez Galvão, de 56 anos, que dá aula de Física na Escola Estadual de Ensino Médio Integrado Reverendo Tercio Moraes Pereira, em São Miguel Paulista, na zona leste, participa do projeto desde o ano passado. Ela tem acrescentado as atividades aprendidas a suas aulas. "Os alunos conseguem ver conexão com conceitos históricos, teoria da Física e da Química, por exemplo."
A estudante Marcela Cristina Lages Ribeiro, de 16 anos, aluna do 2º ano do ensino médio da escola, conta que passou a entender mais as aulas das disciplinas de exatas e melhorou suas notas desde que passou a frequentar os laboratórios. tNão achava que tinha facilidade com Matemática. Nos laboratórios é mais divertido porque você vê que não é tão difícil e começa a entender como funciona a teoria na prática."
Talentos. Segundo especialistas em educação, quanto antes o aluno for exposto a boas aulas de exatas ou de biológicas, mais fácil será captar um possível talento. Para a professora Roseli de Deus Lopes, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), é importante ensinar desde cedo à criança como funciona o método científico. "A criança às vezes tem talento, mas não sabe. Se não tiver uma oportunidade de ter uma iniciação talvez nunca descubra."
O ex-reitor da USP Roberto Lobo diz que o estímulo a essas disciplinas deve ser feito ainda mais cedo que o ensino médio. "Teria de trabalhar a partir do 4.º ano do ensino fundamental, já fazer de forma lúdica, mas ir passando esse tipo de metodologia. Criatividade é sempre bom em qualquer época", afirma.
Para Rafael Lucchesi, diretor de Educação e Tecnologia da Confederação Nacional da Indústria, o fortalecimento do ensino nessas áreas garante aos alunos conhecimentos funcionais, independentemente da área em que passem a atuar. "Vai ser instrumento para construir outros saberes depois."