“DigaSim!” gritam os favoráveis à mudança. “Diga Não!” é o que clama quem defende a atual legislação. No meio do debate acalorado está o Estatuto do Desarmamento, que após 11 anos em vigor pode estar com seus dias contados. É que está marcada para esta terça-feira (20), na Câmara dos Deputados, sessão que deverá votar uma série de mudanças. A finalidade é flexibilizar as atuais regras, que estabelecem limites para a compra e o porte de arma no Brasil.
Os pontos que forem aprovados não vão precisar passar pelo plenário da Casa, pois a decisão de uma comissão especial tem caráter conclusivo e segue direto para apreciação do Senado, por isso uma mobilização grande deverá acontecer na capital federal. O relator do PL 3722/12 que altera o Estatuto, o deputado federal Laudivio Carvalho (PMDB-MG), adiantou ao JC que acredita, principalmente, que “dois pontos passem com mais facilidade”. O primeiro é a alteração do prazo de validade do porte de arma, de cinco para dez anos.
Em seguida, o parlamentar elenca a mudança na concessão dos registros, que deverá passar a ter caráter definitivo. A legislação de registro atual, que permite a pessoas terem armas em casa, determina uma validação do documento a cada três anos. Olhando friamente, os números oficiais embasam os argumentos dos dois lados envolvidos na discussão. De acordo com a Polícia Federal, entre 2003, quando o Estatuto foi sancionado, e o início de 2015, foram mais de 135 mil armas apreendidas. O número é mais que o triplo do que saiu das ruas nos 13 anos anteriores à aplicação da legislação. Entre 1990 e 2003, cerca de 40 mil. Quando contabilizado o quantitativo proveniente da Campanha do Desarmamento, iniciada em 2004, são mais 650 mil armas até o ano passado.
Se for levado em consideração o argumento de que menos armas nas ruas significa uma violência menor, ganha aqui quem defende o Estatuto do Desarmamento. No entanto, outro índice é sempre colocado nessa discussão por quem é favorável a mudança. Acada hora,mesmo com a atual legislação,uma média de seis pessoas são assassinadas no País. Em 2014, 143 pessoas foram mortas por dia. Esses homicídios foram considerados dolosos (quando há intenção de matar).
MAIS ATRITOS
Nem a chamada “Bancada da Bala”, que tem forte influência na discussão sobre o tema, deverá votar com consenso na próxima terça. A importação de armas é o ponto mais polêmico entre eles, poisa flexibilização da regra para trazer armas de fora contraria os interesses da indústria brasileira, com forte atuação e lobi nos bastidores. Ela quer o fim do Estatuto do Desarmamento, mas não pretende que seus interesses fiquem comprometidos com essa abertura.
ESPECIALISTAS DIVERGEM
Especialistas avaliam proposta violência. Temos pessoas morrendo pelo fato de não possuírem arma e o bandido sabe disso”, discorre. Ele alerta que até o registro da arma como é feito não dificulta a propagação da violência. “O Estado sabe quem tem arma legal, mas e as ilegais? Essa lei é mentirosa ao passar a sensação de que existe um controle. Até tem, mas só para quem tem armamento regular”, pontua o especialista, que ainda discorda das alegações de que arma na mão da população é armar bandido. A frieza dos números não se aplica aos dados apresentados na primeira matéria desta reportagem. Os índices de armas recolhidas e homicídios são usados tanto por quem é a favor da manutenção do Estatuto como pelos que querem a mudança como base para seus posicionamentos.
O JC traz a análise de dois nomes da sociedade civil que estão diretamente envolvidos nessa discussão em Brasília. O jornalista Flavio Quintela, um dos autores do livro Mentiram Para Mim Sobre o Desarmamento, usa o alto índice de homicídios para frisar a“falência do Estatuto do Desarmamento”, eque a nossa legislação faz com que a sociedade não tenha arma, mas não atira do bandido. “Em nada o Estatuto contribuiu para a redução da Na contramão de Flavio, vem o sociólogo e autor de estudos como o Mapa da Violência 2015 - Mortes Matadas por Armas de Fogo, o sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz.
Ele pontua que nós já temos um país mais violento do que muitos em guerra. De 1980 até 2003, o sociólogo coloca que houve um aumento constante no número de homicídios, mas que essa tendência foi interrompida a partir de 2004, por conta do Estatuto. Já em 2005, ele mesmo conclui que os números estagnaram e posteriormente voltaram acrescer, tendo chegado em2012 com valores iguais aos de 2003. Então a legislação de fato está falida? Para Jacobo, não. “Sem o Estatuto o número de homicídios seria muito maior e não teria diminuído e nem estagnado”, afirma. Ele defende ainda que o Estatuto é parte de um processo, eque o Estado tem falhado em sua implantação. “O próprio desarmamento da população está sendo ignorado pelo governo. Não é feito o mesmo trabalho intensivo do início”.