Começa nesta segunda-feira (18) em São Paulo o júri popular de dois policiais militares (PMs) e um guarda civil envolvidos no caso que ficou conhecido como Chacina de Osasco. O fato ocorreu no dia 13 de agosto de 2015, na região metropolitana da capital. Segundo a denúncia do Ministério Público (MP), 17 pessoas foram mortas e sete baleadas em um intervalo de aproximadamente duas horas. O reconhecimento de um dos atiradores por um sobrevivente, as contradições em depoimentos dos acusados e os antecedentes homicidas dos denunciados são os principais elementos a serem levados a júri pela promotoria do caso.
De acordo com a denúncia, os assassinatos ocorreram para vingar as mortes do policial militar Admilson Pereira de Oliveira, que foi baleado ao reagir a um assalto a um posto de gasolina, onde fazia “bico” como segurança, e do guarda civil de Barueri Jeferson Luiz Rodrigues da Silva, que foi morto enquanto atuava como segurança em uma adega. Eles vão responder por organização criminosa e homicídio qualificado. Somadas, as penas podem chegar a 300 anos de prisão, disse o promotor do caso Marcelo Oliveira.
Vão participar do júri 43 testemunhas, sendo 20 de acusação. Entre elas, está o sobrevivente da chacina, que identificou o policial Fabrício Emmanuel Eleutério, além de familiares das vítimas e delegados que atuaram no caso. O plenário do Fórum Criminal de Osasco está reservado para 12 dias de julgamento. Por uma questão de segurança, a rua em frente ao tribunal estará interditada a pedido da juíza Élia Kinosita Bulman, que presidirá a sessão. As atividades vão começar às 13h com, previsão de término para as 20h. A partir de amanhã (19), a sessão começa às 10h.
Os dois policiais militares acusados são Fabrício Emmanuel Eleutério e Thiago Barbosa Henklain. Segundo o MP, eles teriam efetivamente feito os disparos. Os PMs vão responder pelas 17 mortes e pelas sete tentativas de homicídio. Eles estão presos desde o início das investigações, assim como o guarda civil.
Eleutério foi o PM reconhecido por um sobrevivente da chacina. O promotor Marcelo Oliveira informou que o policial se recusou a fazer um exame biodinâmico que pudesse confrontar imagens das movimentações do corpo dele com filmagens de câmeras de segurança.
Em entrevista anterior concedida à Agência Brasil, a advogada do policial, Flavia Artilheiro, disse que dados do celular de Eleutério mostram que, no momento dos crimes, ele estava a 7 quilômetros do local da chacina e que o rastreador do carro indica que, entre as 19h30 e as 22h40, ficou estacionado no endereço da namorada dele, o que foi confirmado pela jovem e pela mãe dela. Para Oliveira, como se trata de um crime intencional, os assassinos, que inclusive conhecem os métodos de investigação da polícia, já poderiam prever o rastreamento desses aparelhos.
Além do reconhecimento por uma vítima, o promotor destaca as contradições no depoimento de Eleutério. “Se uma pessoa reproduz o mesmo fato e conta várias histórias diferentes, há fragilidade no álibi”, afirmou. Segundo o promotor, o PM se contradisse ao contar que tinha pedido uma pizza por telefone e, quando questionado sobre o nome do estabelecimento, disse ter comido algo congelado.
Em relação a Heinklain, há relato de testemunha de que o policial discutiu com a esposa, que o teria reconhecido em imagens de câmeras de segurança divulgadas por emissoras de televisão sobre o caso. A discussão foi ouvida por uma pessoa, que relatou o ocorrido para outra pessoa próxima, que, por sua vez, testemunhou à Polícia Civil. No entanto, a testemunha teve medo de reafirmar o depoimento perante a juíza. O promotor disse, em entrevista, que deve apresentar esses fatos aos integrantes do júri popular.
Em nota, o advogado Fernando Capano afirmou que isso não é suficiente para demonstrar a participação do seu cliente nos fatos. “Creio que o ônus da prova é do Ministério Público, no sentido de provar que o Tiago estava nas cenas dos crimes. Nesse sentido, com todo o respeito ao trabalho do doutor Marcelo, o conjunto probatório é extremamente frágil e deficiente para dar lastro à eventual condenação do Thiago”. Ele destacou que espera que “os jurados possam entender e decidir que crimes odiosos como a Chacina de Osasco não podem ter como resposta a condenação de um inocente”.
O guarda civil Sérgio Manhanhã, por sua vez, teria atuado para desviar viaturas dos locais onde os crimes ocorreriam. O promotor disse que ele trocou mensagens simbólicas com o policial Victor Cristilder Silva dos Santos, que estava em um dos carros da chacina, segundo a denúncia. As mensagens foram trocadas antes do início dos fatos, com uma mão fazendo sinal de positivo, e, ao final, com o mesmo símbolo e com outro representando um braço forte. Em depoimento, o PM alega que o conteúdo se referia ao empréstimo de um livro. As mensagens foram apagadas e recuperadas após perícia.
Cristilder foi o único a recorrer da sentença que determinou o julgamento, portanto não vai a júri nesta segunda-feira. No entanto, segundo Oliveira, a determinação de levá-lo a júri já foi confirmada pela juíza.
Marcelo Oliveira lembra que este não será um julgamento fácil, sobretudo pela concepção recorrente na sociedade de que “bandido bom é bandido morto”. “Mesmo que fosse bandido, a Justiça está aí para isso”, defendeu. Ele lembrou ainda que uma das pessoas mortas foi uma adolescente de 16 anos. “Ninguém está livre de ter um filho viciado em drogas, de ter filho que frequenta o 'Bar do Juvenal' e ter que enterrar o filho, porque ele frequenta o bar do suposto homicida do guarda civil que morreu no dia anterior”, disse, em referência ao local das mortes.