Cientistas brasileiros revelam efeitos positivos de substâncias psicodélicas no cérebro

Um estudo mostrou como uma substância psicodélica produz alterações benéficas em circuitos cerebrais associados à neuroplasticidade, à inflamação e à neurodegeneração
Estadão Conteúdo
Publicado em 09/10/2017 às 12:41
Um estudo mostrou como uma substância psicodélica produz alterações benéficas em circuitos cerebrais associados à neuroplasticidade, à inflamação e à neurodegeneração. Foto: Foto: United States Drug Enforcement Administration (DEA)


Com estudos feitos em organoides celulares conhecidos como "minicérebros", um grupo de cientistas brasileiros mostrou como uma substância psicodélica produz alterações benéficas em circuitos cerebrais associados à neuroplasticidade, à inflamação e à neurodegeneração.

A pesquisa, publicada nesta segunda-feira, 9, na revista científica Scientific Reports, é a primeira a revelar as alterações que drogas psicolélicas causam no funcionamento molecular do tecido neural humano. De acordo com os autores, os resultados ajudam a explicar os efeitos antidepressivos e antiinflamatórios que as substâncias psicodélicas vêm mostrando em diversos outros estudos.

No experimento, os cientistas utilizaram o 5-MeO-DMT, um composto da família da dimetiltriptamina, que está presente em drogas psicodélicas como o MDMA, o LSD e o chá de ayahuasca - uma planta da Amazônia utilizada ritualmente por indígenas para produzir estados alterados de consciência.

"Pela primeira vez pudemos descrever mudanças relacionadas a psicodélicos no funcionamento do tecido neural humano", disse o autor principal do estudo, Stevens Rehen, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e do Instituto D’Or de Pesquisa e Ensino.

As drogas psicodélicas estão cada vez mais ganhando espaço nos laboratórios de pesquisas, como mostrou reportagem do Estado. Diversos grupos internacionais têm feito estudos e experimentos com essas substâncias a fim de desenvolver terapias para problemas psiquiátricos como ansiedade, depressão, estresse pós-traumático e para a dependência de drogas como álcool, cocaína, heroína e crack.

Apesar dos resultados promissores em um número cada vez maior de pesquisas, a identificação dos circuitos moleculares envolvidos com a ação dos psicodélicos no cérebro era limitada pelas restrições para estudos com essas substâncias e pela falta de ferramentas biológicas apropriadas.

Para estudar os efeitos do DMT, Vania Dakic, do Idor e Juliana Minardi Nascimento, do Idor e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) expuseram os organoides cerebrais - que são culturas de células neurais tridimensionais que imitam um cérebro em desenvolvimento - a uma única dose do psicodélico.

Depois de receber o psicodélico, os "minicérebros" foram submetidos a uma análise proteômica - isto é, um mapeamento do conjunto de proteínas neles presentes - com uma técnica espectrometria de massas. Eles conseguiram assim observar alterações na expressão de cerca de mil proteínas - e conseguiram identificar qual o papel dessas proteínas no cérebro humano.

Efeitos positivos

Os cientistas descobriram que proteínas importantes para a formação das sinapses tiveram uma regulação positiva - entre elas, proteínas relacionadas aos mecanismos celulares de aprendizado e memória, que são componentes centrais do funcionamento do cérebro.

Por outro lado, proteínas envolvidas em inflamação, degeneração e lesão cerebral tiveram uma regulação negativa, sugerindo que a substância psicodélica tem um potencial papel de proteção neural

"Os resultados sugerem que os psicodélicos clássicos são poderosos indutores da neuroplasticidade - uma ferramenta de transformação psicobiológica sobre a qual sabemos muito pouco", disse outro dos autores do novo estudo Sidarta Ribeiro, diretor do Instituto do Cérebro, ligado à UFRN."

"O estudo sugere possíveis mecanismos pelos quais essas substâncias exercem seus efeitos antidepressivos, que temos observado em nossas pesquisas. Nosso estudo reforça o potencial clínico escondido dessas substâncias que estão hoje sob restrições legais, mas que merecem total atenção das comunidades médica e científica", afirmou outro dos autores, Draulio Araújo, professor da UFRN.

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