“As pessoas estão sedentas de escutar as palavras de Francisco, e acredito que nos próximos anos vão acontecer muitas mudanças relacionadas às questões familiares dentro da Igreja, a partir do Sínodo que vai ocorrer em 2015”, afirma o arcebispo de Olinda e Recife, dom Fernando Saburido.
Ele diz que Francisco “tem a mesma coragem de surpreender o mundo” demonstrada por um antecessor revolucionário, João XXIII, “que também foi um papa de transição, e que fez muito bem à Igreja”. Dom Saburido, porém, é prudente ao falar do caminho que ainda terá que ser percorrido pelo papa. “Ele é um homem de coragem e seu pontificado não tem ainda sequer dois anos. Sei que está enfrentando dificuldades, e não é por acaso que a toda hora pede orações. As oposições existem, são uma realidade”, aponta.
Dom Saburido confessa que “escuta muitas pessoas elogiando o papa, felizes com a linha que ele está assumindo”, mas que alguns também realizam comentários negativos, especialmente os ligados aos setores mais conservadores. “A maioria das críticas é no plano da liturgia, porque ele é despojado e há quem deseje coisas mais elaboradas, com mais pompa. Não são questões graves, mas que incomodam a uma parte da Igreja”, desconversa.
Já o jornalista e dominicano Carlos Alberto Libânio Christo, mais conhecido como frei Betto, é um dos expoentes da chamada Teologia da Libertação, corrente de esquerda da Igreja e se mostra mais explícito ao analisar a repercussão das ações do papa no Brasil. “Os bispos brasileiros foram nomeados pelos pontificados de João Paulo II e Bento XVI, por isso ainda levará tempo para se sentirem as inovações introduzidas por Francisco”, resume.
Frei Betto define Francisco como “uma dádiva de Deus à Igreja e ao mundo” e reza para que, através dele, a Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) “recupere seu caráter profético, tão evidente nas décadas de 1970 a 1990”.
De forma curiosa, conforme bem apontado pelo especialista em marketing José Nivaldo Júnior, Francisco faz a rota oposta à dos primeiros jesuítas que vieram catequizar a América Latina, sendo uma espécie de “restituição” à Europa, que coincide com os cem anos de restauração da Ordem pelo papa Pio VII (a Companhia de Jesus, conhecida por seu trabalho missionário e educacional, havia sido extinta por Clemente XIV, quatro décadas antes). “Um papa jesuíta e latino-americano é, sim, uma justa retribuição oferecida à Europa”, afirma dom Saburido.
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Em nosso continente, onde a religião católica ainda assume uma dimensão muito ampla, há menos dificuldades do ponto de vista das vocações do que na Europa, tradicional “celeiro” de papas. Além disso, há a questão geopolítica de que, quantitativamente, há mais católicos aqui e na África. A opção por Francisco se reflete no Brasil, um dos países que mais têm obtido destaque dentro desse contexto.
“Nossa Igreja viveu várias fases na sua história. Não há mais lugar para príncipes dentro dela”, afirma o professor de teologia da Universidade Católica de Pernambuco, padre Antonio Mota, que é também jesuíta. “Francisco é um homem muito humilde, é um servidor, não é dono da verdade”.
Entre as diversas histórias que coleciona a respeito de Francisco, Mota relata um episódio que retrata sua trajetória de vida. “No contexto hierárquico, ele primeiro foi líder muito jovem, coerente e austero. Com 36 anos, coordenava a província jesuítica da Argentina e gerou uma impressão de autoritarismo acerca de si. Depois, fez um doutorado na Alemanha e, por birra, no regresso mandaram que fosse cuidar do chiqueiro de um convento em Córdoba. Por oito anos, ele tratou dos porcos e foi capelão de uma igrejinha. Foi aí que o cardeal de Buenos Aires o encontrou e ficou muito impressionado com o testemunho desse homem que, com tanta capacidade, tinha a humildade de aceitar essa função. O cardeal levou Bergoglio para ajudá-lo em Buenos Aires, e ele deslanchou pastoralmente. Hoje ele diz que graças a cuidar dos porcos chegou a ser papa, e que quem quiser ser o primeiro, seja o último”.