Os talibãs anunciaram nesta quarta-feira (14) que abandonaram a cidade afegã de Kunduz, duas semanas depois da conquista da cidade com uma ofensiva relâmpago, sua maior vitória militar desde 2001.
Paralelamente, a organização independente Comissão Internacional de Investigação Humanitária ( IHFFC, em inglês) anunciou que começou seu trabalho para esclarecer as circunstâncias do bombardeio contra um hospital da ONG Médicos Sem Fronteiras na mesma cidade, que deixou 24 mortos, segundo novo balanço.
Os habitantes de Kunduz, traumatizados pelos combates dos últimos dias, retornavam nesta quarta-feira à cidade, que recuperava certa normalidade.
Os serviços de eletricidade e água corrente foram parcialmente restaurados e as lojas começavam a abrir suas portas.
As cicatrizes dos combates eram vistas nas ruas e nas fachadas dos edifícios, marcadas pelos tiros.
"As forças de segurança estão pedindo às pessoas que voltem, mas as pessoas ainda têm medo que a situação mude de novo", comentou à AFP Akhmal Kakar.
Imagens divulgadas pela televisão mostraram tropas afegãs patrulhando as ruas e retirando dos edifícios públicos as bandeiras dos talibãs.
Os insurgentes controlaram Kunduz, a grande cidade do norte do Afeganistão e a quinta mais populosa do país, durante poucos dias.
O anúncio da retirada de Kunduz aconteceu depois de uma nova ofensiva na segunda-feira dos talibãs contra outra capital provincial, Ghazni, que conseguiu impedir os ataques.
Os talibãs "ordenaram aos seus combatentes que se retirem das principais avenidas, mercados e edifícios governamentais e se dirijam às zonas rurais próximas", segundo o site da organização.
A retirada tática tem por objetivo "reforçar as linhas de defesa e preservar as forças para futuras operações", indicou o movimento talibã.
A queda de Kunduz em 28 de setembro foi um espetacular e doloroso fracasso para as tropas afegãs formadas pelos ocidentais em seu primeiro confronto direto com os talibãs desde o fim da missão de combate da Otan, em dezembro de 2014.
A batalha de Kunduz marca, talvez, o início de uma nova estratégia dos talibãs para reforçar suas posições na região norte do país e nas cidades, além de seus redutos rurais do sul.
Na segunda-feira, quase 2.000 combatentes talibãs iniciaram um ataque contra a cidade de Ghazni, capital da região de mesmo nome, o que provocou violentos combates.
Na semana passada, os talibãs cercaram a cidade de Maimana, capital da província de Faryab.
Nos dois casos, os talibãs foram repelidos, mas as ofensivas evidenciaram a capacidade militar dos insurgentes islamitas para atacar os grandes centros urbanos.
Bombardeio
Após os ataques aéreos lançados pelos Estados Unidos no dia 3 de outubro contra o centro de traumatologia da ONG Médicos Sem Fronteiras em Kunduz, foi lançada nesta quarta-feira uma investigação para estabelecer as causas do incidente.
"A Comissão enviou cartas aos governos de Estados Unidos e Afeganistão para iniciar oficialmente seu funcionamento. Ainda espera resposta", indicou a MSF em um comunicado.
Para a ONG, trata-se de "uma primeira etapa indispensável para poder realizar uma investigação independente sobre o ataque contra o hospital da MSF em Kunuz".
"Recebemos suas desculpas e suas condolências, mas isso não é suficiente. Ainda não temos nenhuma explicação sobre por que um hospital muito conhecido que estava cheio de pacientes e médicos foi bombardeado, de forma reiterada por mais de uma hora", disse a presidente internacional da MSF, Joanne Liu.
"Temos que saber se as regras da guerra mudaram, não apenas em Kunduz, pela segurança de nossa equipe que trabalha nos hospitais situados nas linhas de frente em todo o mundo", acrescentou Liu.
A Comissão Internacional de Investigação Humanitária, sujeita à Convenção de Genebra, é o único órgão permanente para investigar as violações do direito internacional humanitário.
A MSF começou a trabalhar no Afeganistão em 1980 e abriu em 2011 o centro de traumatologia.
Nesta semana, o Pentágono anunciou que indenizará as vítimas, e o presidente americano, Barack Obama, apresentou suas desculpas à organização.