A Organização das Nações Unidas (ONU) informou, em Genebra, que continua “acompanhando de perto” a questão dos direitos humanos na Venezuela. O porta-voz do Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), Ravina Shamdasani, afirmou que funcionários do escritório não têm conseguido visitar o país.
Desde 2014, a ONU solicita visto de entrada na Venezuela e ainda não recebeu resposta, o que dificulta a obtenção de informações sobre a situação do país. “Continuamos buscando acesso e, apesar de não termos conseguido, continuamos acompanhando de perto a situação, reagimos [agora] e já reagimos no passado”, completou.
Shamdasani classificou como “extremamente preocupantes” as situações como violência e insegurança, a escassez de alimentos e os protestos em relação ao tema, além de informações sobre linchamentos e o impacto do decreto de emergência.
O governo da Venezuela não se manifestou oficialmente sobre a declaração das Nações Unidas.
FRONTEIRAS
O governo da Colômbia quer reabrir de maneira "definitiva" a fronteira com a Venezuela, fechada pelo presidente venezuelano Nicolás Maduro desde agosto de 2015, para evitar que se reproduzam os deslocamentos em massa registrados quando a divisa é aberta temporariamente.
Nos últimos dois fins de semana, dezenas de milhares de venezuelanos cruzaram a fronteira colombiana em busca de alimentos, remédios e outros produtos que estão em escassez em Caracas e outras cidades do país.
A cidade brasileira de Pacaraima, em Roraima, fronteira com Santa Elena de Uairén, na Venezuela, também tem recebido centenas de venezuelanos em busca de medicamentos e comida. O comércio local passou a funcionar de domingo a domingo para atender a demanda gerada pelo país vizinho. Para chegar ao Brasil, cidadãos venezuelanos chegam a percorrer mais de mil quilômetros de estradas.
MERCOSUL
O Conselho do Mercado Comum (CMC) do Mercosul, em Montevidéu, convocou uma reunião para o dia 30 de julho para debater o impasse acerca da transferência da presidência pro tempore do bloco para a Venezuela. A transferência sofre forte oposição de Brasil, Argentina e Paraguai.
No contraponto aos três países, o governo do Uruguai, que atualmente exerce a presidência do Mercosul, informou que pretende transferir o comando do bloco para a Venezuela.
O Conselho do Mercado Comum (CMC) é formado pelos ministros das Relações Exteriores e da Economia do Brasil, Uruguai, da Argentina, do Paraguai e da Venezuela, todos membros do bloco.
A troca da presidência pro tempore do Mercosul é feita a cada seis meses e deveria ocorrer na próxima Cúpula de Presidentes do bloco, prevista para primeira quinzena de julho, em Montevidéu, mas que foi cancelada.
CLAÚSULA DEMOCRÁTICA
Entre os integrantes do bloco regional, o Paraguai é o maior crítico da Venezuela. O chanceler paraguaio, Eladio Loizaga, defende inclusive a aplicação da chamada cláusula democrática do Mercosul, que prevê sanções a um país do bloco em caso de ruptura democrática. O próprio Paraguai foi suspenso, em 2012, após o afastamento do então presidente Fernando Lugo.
Na época, com a ausência do Paraguai, os demais países do bloco aprovaram a entrada da Venezuela no Mercosul, que estava travada pelo Senado paraguaio.
O ministro das Relações Exteriores do Brasil, José Serra, tem criticado o governo de Nicolás Maduro, dizendo que não existe democracia no país, referindo-se aos opositores detidos, considerados “presos políticos”. Brasil e Argentina acusam o governo Maduro de dificultar a organização de um referendo por parte da oposição venezuelana que pode tirá-lo do poder.
Em artigo publicado na imprensa brasileira, Serra argumenta que a Venezuela não cumpre diversas normas negociadas entre os países do Mercosul, como o Protocolo de Assunção sobre o Compromisso com a Promoção e Proteção dos Direitos Humanos no Mercosul (2005) e o Acordo de Residência do Mercosul (2002).
“A não incorporação dessas normas faz da Venezuela um sócio incompleto, inadimplente em relação a deveres que são fundamentais, como regras de origem, que definem se um produto pode ingressar nos demais parceiros sem pagar imposto de importação, cooperação judicial e regulamentos técnicos sobre meio ambiente, alimentos, direitos do consumidor e requisitos fitossanitários, entre outros”, ressalta o ministro no artigo.
Apesar do questionamento sobre a transferência da presidência do bloco à Venezuela e a crise enfrentada por Maduro, o país deve permanecer no Mercosul, na avaliação do professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília (UnB), Carlos Alberto Vidigal. “Acredito que essa pressão deve existir, mas ela não irá às últimas consequências, ou seja, uma eventual suspensão no bloco - que necessitaria de consenso dos demais países e dificilmente o Uruguai vai apoiar uma iniciativa dessas. O que ocorre agora é que a conjuntura político-regional está se modificando, tanto na Argentina quanto no Brasil com governos mais à direita, que usam instrumento ideológico para questionar a presença da Venezuela no Mercosul”, disse.