O calendário oficial para a realização de um referendo revogatório contra o presidente da Venezuela, Nicolas Maduro, arruinaria os planos da oposição de retirá-lo do poder este ano. Mas que chances teria de atingir o seu objetivo?
A coalizão Mesa da Unidade Democrática (MUD) quer que o referendo seja realizado antes de 10 de janeiro de 2017, porque se Maduro perder, novas eleições deverão ser convocadas.
No entanto, se for revogado após essa data, os dois anos restantes de seu mandato serão conduzidos por seu vice-presidente.
Acusado pela MUD de servir ao chavismo, o Conselho Nacional Eleitoral (CNE) afastou na terça-feira (9) a possibilidade de o referendo revogatório ser realizado este ano.
A presidente do órgão eleitoral, Tibisay Lucena, anunciou que a coleta das quatro milhões de assinaturas necessárias para convocar o referendo se realizará no fim de outubro.
Isso empurraria o referendo para o final de fevereiro ou início de março de 2017.
Embora a CNE tenha organizado a eleição de Maduro em cinco semanas após a morte de Hugo Chavez em 2013, os analistas acreditam que não há nenhuma vontade de acelerar o processo revogatório.
A MUD considera as manifestações como sua principal arma de pressão e convocou uma marcha nacional em Caracas em 1º de setembro para exigir a data da coleta de assinaturas.
Mas desde 2014, quando houve protestos maciços que deixaram 43 mortos, a oposição não é capaz de organizar passeatas em massa.
"Não há uma conexão entre os líderes políticos com a população. É um desafio. Além disso, as pessoas estão focadas em suas vidas diárias, em filas cedo de manhã à procura de alimentos e medicamentos", diz à AFP Marco Ponce, coordenador do Observatório do Conflito Social.
Mas a MUD alega ter reunido 1,8 milhão de assinaturas em apenas cinco dias em abril - nove vezes mais do que exigido - na primeira etapa.
"A oposição deve repensar a sua estratégia de pressão. O venezuelano já se cansou das manifestações, porque não tem efeito prático", estima Eugenio Martinez, um especialista em questões eleitorais.
A MUD tem a seu favor a impopularidade do Maduro (74%) e espera que a recolha de assinaturas seja tão avassaladora que acelere o processo.
De acordo com a empresa Venebarómetro, 64% do eleitorado (12 milhões de pessoas) revogaria o presidente. Para derrubá-lo são necessários 7,5 milhões de votos.
Para o analista Luis Vicente Leon, a Venezuela não está em uma "batalha legal ou ética, mas política", e a oposição deve superar suas diferenças internas para ganhar força e negociar, o que envolverá ceder.
"Esperamos agora que o governo insista muito mais no diálogo", acredita o cientista político Benigno Alarcon.
Por iniciativa do governo, um grupo de ex-presidentes liderado pelo espanhol Jose Luis Rodriguez Zapatero promove aproximações, mesmo sem resultados.
E embora neutralizado pela justiça - também acusada pela MUD de trabalhar para o governo - o Parlamento, de maioria opositora pode pressionar o governo.
Na quinta-feira terá início o processo de renovação de dois dos cinco diretores do CNE.
A Assembleia também deve aprovar quotas de empréstimos, num momento em que o governo precisa urgentemente de fundos para reanimar a economia prostrada.
"À medida que a oposição é capaz de elevar os custos da não colaboração, pode fazer o governo ceder. A questão é se a MUD tem essa capacidade", afirma Alarcon.
A MUD lançou uma ofensiva internacional para conseguir o apoio dos Estados Unidos e outros países, bem como do secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almagro, que exigem o referendo.
Almagro ameaça aplicar a Carta Democrática Interamericana, uma sanção diplomática que, no pior dos casos, poderia fazer o país deixar o organismo.
A Venezuela também enfrenta um boicote da Argentina, Brasil e Paraguai para que não exerça a presidência rotativa do Mercosul.
A pressão internacional é tão importante quanto os protestos internos, afirma Alarcon, para quem o governo teme perder completamente a governança.