Pelo menos 11 pessoas morreram no Quênia desde o anúncio, na sexta-feira à noite (11), da reeleição do presidente Uhuru Kenyatta, e a oposição se radicalizou, ao anunciar que não desistirá de questionar o resultado.
Assim que a Comissão Eleitoral comunicou a reeleição para um segundo mandato do líder de 55 anos, explodiram conflitos nos redutos da oposição, que denuncia "uma farsa" nas urnas.
Oito corpos foram levados para o necrotério de Nairóbi desde a noite desta sexta, provenientes da periferia da capital, tomada por atos de violência pós-eleitoral, disse uma fonte policial, acrescentando que sete foram alvo de disparos.
"Os corpos provenientes de Mathare, Kibera e Kawangware são oito desde a noite passada e foram transportados para o necrotério da cidade", declarou o policial neste sábado (12) à AFP, pedindo para não ser identificado.
Segundo ele, o corpo de uma menina morta esta manhã em Mathare também seria recuperado.
Convencidos de terem sido roubados nas urnas, os partidários da oposição tomaram as ruas no oeste do país e em bairros pobres de Nairóbi, como Kibera, Mathare e Kawangware.
De acordo com balanço da AFP, a repressão aos protestos deflagrados na sexta-feira (11) deixou pelo menos 11 mortos, nove deles em favelas de Nairóbi, um no oeste do país, no condado de Kisumu, e outro na cidade de Siaya, no sudoeste.
Em Kisumu, "temos uma pessoa morta, e outras quatro deram entrada no hospital com ferimentos a bala", declarou Ojwang Lusi, uma autoridade de saúde desse condado.
"Não sabemos o motivo de a polícia atirar", lamentou Truphena Achieng, cujo irmão ficou ferido.
No condado vizinho de Siaya, um oficial de polícia confirmou a morte de uma pessoa.
"Não conseguimos recuperar o corpo desse motorista de moto-táxi, devido à resistência dos manifestantes", relatou.
Em Nairóbi, no bairro de Mathare, uma menina de nove anos foi morta por disparos hoje. A organização Médicos sem Fronteiras anunciou ter atendido a 19 feridos desde ontem à noite nessa mesma comunidade.
Com 54,27% de votos, Kenyatta, do Partido Jubilee, no poder desde 2013, estendeu a mão a seu adversário, Raila Odinga (44,74%), em discurso à nação ontem à noite.
"Temos de trabalhar juntos (...) Temos de fazer esse país crescer juntos", declarou, pedindo à oposição que "não recorra à violência".
Há dez anos, mais de 1.100 pessoas morreram, e 600 mil deixaram suas casas em dois meses de violência pós-eleitoral, após a reeleição de Mwai Kibaki, também denunciada por Odinga.
Os distúrbios atuais não significam que o país esteja caminhando para um conflito similar. Embora apontem velhas divisões tribais, por enquanto, encontram-se circunscritos aos bastiões eleitorais da oposição.
O contexto político também é distinto. Depois da disputa eleitoral de 2007, a maioria dos confrontos opôs os kibuyu de Kenyatta aos kalenjin, duas etnias que hoje são aliadas. O vice-presidente William Ruto é um kalenjin.
"Acredito que tudo isso seja uma farsa total. É um desastre", declarou na sexta James Orengo, um de seus principais líderes.
Diferentemente de 2013, a oposição ainda não fala em recorrer à Justiça. Naquele ano, Odinga denunciou a vitória do rival ao Tribunal Supremo, em vão.
"Comunicaremos no momento adequado a maneira como realizaremos nossa ação", declarou em entrevista coletiva Johnson Muthama, uma das lideranças da coalizão política Super Aliança Nacional (Nasa), acrescentando que, "por enquanto, pedimos aos nossos partidários e aos quenianos que se mantenham em segurança".
"Não vamos nos deixar intimidar. Não renunciaremos", insistiu Muthama, descrevendo a repressão policial como uma tentativa "de dominar" a oposição.
Muthama denunciou que a Polícia matou - segundo ele - "mais de 100 quenianos inocentes, incluindo dez crianças". Nenhuma evidência dessas mortes foi divulgada ainda pela oposição.
"Uhuru Kenyatta não tem qualquer legitimidade para ser presidente do Quênia", continuou Muthama.
A Nasa de Odinga, de 72 anos, decidiu deixar o futuro nas mãos do "povo", mas sem um pedido explícito para que fosse às ruas. Ele não se pronunciou desde a divulgação oficial dos resultados. Suas primeiras declarações podem ser determinantes para a evolução dos confrontos.