O Reino Unido tentava digerir nesta quinta-feira (30) a resposta destemperada do presidente americano Donald Trump à primeira-ministra britânica Theresa May depois que ele retuitou vídeos antimuçulmanos, mas o governo tenta não prosseguir com o caso.
May insistiu nesta quinta que o presidente Trump cometeu um erro por retuitar os vídeos, mas enfatizou que as relações entre os dois países continuarão como antes.
"Retuitar o Britain First foi um erro, mas a relação com os Estados Unidos devem continuar", afirmou May em coletiva de imprensa na Jordânia, se comentar especificamente o ataque pessoal que Trump dirigiu contra ela.
Na véspera, Downing Street também chamou de "erro" a atitude de Trump, que divulgou nas redes sociais alguns vídeos da organização britânica de extrema-direita Britain First que atribuem atitudes violentas aos muçulmanos.
Trump não gostou da repreensão e afirmou que May deve se concentrar nos assuntos de seu país: "Theresa @theresamay, não foque em mim, foque no destrutivo terrorismo islâmico radical no Reino Unido. Nós vamos bem", escreveu no Twitter.
A crise acontece no momento em que Londres precisa de grandes aliados alternativos à União Europeia (UE), com destaque para os Estados Unidos, país com o qual presume manter uma histórica "relação especial", a expressão utilizada para o relacionamento bilateral.
A Casa Branca, por sua vez, argumentou que as mensagens elevaram o debate sobre o tema da segurança.
"Acho que o que eu fiz foi elevar a conversa para poder falar de temas reais e de ameaças reais como são a violência extrema e o terrorismo extremo", disse a assessora de imprensa da presidência, Sarah Sanders.
Este, no entanto, não foi o primeiro ataque de Trump ao Reino Unido. O presidente já discutiu diversas vezes com o prefeito da capital britânica, o muçulmano Sadiq Khan.
A ministra da Educação britânica, Justine Greening, primeira pessoa do governo a comentar o assunto, tentou minimizar o incidente.
"No fim, nossa relação com os Estados Unidos tem uma longevidade que sobreviverá aos presidentes que vêm e vão", disse Greening à rádio BBC.
"Não concordo com o tuíte do presidente Trump, mas também acredito que não deveria nos distrair de nossa agenda doméstica, nem da estreita relação que o Reino Unido teve durante muitos, muitos anos, e que continuará tendo, com os Estados Unidos", completou.
A ministra do Interior, Amber Rudd, repetiu que Trump cometeu um "erro ao retuitar os vídeos", durante uma sessão parlamentar especial para debater o ocorrido, mas insistiu que a relação bilateral deve ser priorizada.
"Posso assegurar à Câmara a importância da relação entre os dois países. O intercâmbio sem paralelo de informação de inteligência e vital, sem dúvida salvou vidas britânicas. Este é o conjunto general e peço às pessoas que não esqueçam", disse Rudd.
May procurou Trump quando o americano assumiu a presidência, com a esperança de concluir algum dia um grande acordo comercial, e o convidou a fazer uma visita de Estado ao Reino Unido, a mais elevada no nível protocolar, durante a qual o visitante se hospeda no Palácio de Buckingham e é objeto de homenagens.
Mas a possibilidade de uma visita, que deveria acontecer em 2018, gera polêmica e não tem uma data definida.
Pelo menos quatro deputados pediram a Rudd o cancelamento definitivo da visita, mas ela descartou a possibilidade: "O convite foi apresentado e aceito".
O prefeito de Londres afirmou que "está cada vez mais claro que qualquer tipo de visita oficial do presidente Trump ao Reino Unido não seria bem-vinda".
As ações de Trump, disse Khan, "são uma traição à relação especial entre nossos dois países".
"A primeira-ministra de nosso país deveria usar a influência que ela e seu governo afirmam ter sobre o presidente e sua administração para que apagasse os tuítes e pedisse desculpas aos britânicos", completou o prefeito.
A polêmica jogou o foco sobre o grupo de extrema-direita Britain First. A número dois da organização, Jayda Fransen, publicou os polêmicos videos retuitados por Trump.
O Britain First é legal, mas o governo britânico apertou o cerco às organizações similares desde o assassinato, em junho de 2016, da deputada Jo Cox por um militante de extrema-direita.
"Quando o presidente dos Estados Unidos promove a vice-líder de uma organização de extrema-direita facilita que outros sigam o exemplo dela. E até mesmo que vão mais longe", escreveu no jornal The Guardian o viúvo da deputada, Brendan Cox.