Em uma ação que reduz poderes do Palácio do Planalto, os presidentes da Câmara e do Senado, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e Renan Calheiros (PMDB-AL), apresentaram nesta segunda-feira (1) uma versão inicial da futura "Lei de Responsabilidade das Estatais", que transfere ao Senado a palavra final sobre a escolha dos presidentes das empresas públicas e de economia mista.
Pela proposta, os presidentes das estatais terão que ser aprovados pelo Senado, e passar por sabatina, antes de assumirem os cargos.
O anteprojeto também impede que os integrantes do Conselho de Administração das estatais sejam ministros ou que ocupem cargos de até terceiro escalão na União -mais um recado de Cunha e Renan para o governo federal.
No modelo em vigor, diversos ministros integram os conselhos das estatais, como ocorreu com a então ministra Dilma Rousseff ao presidir o conselho da Petrobras. Na época, Dilma era ministra da Casa Civil do governo Lula. O ex-ministro Guido Mantega (Fazenda) também foi integrante do Conselho de Administração da empresa.
A reportagem apurou que os congressistas também pretendem incluir no projeto, durante sua discussão no Legislativo, um mecanismo que permita ao Senado destituir os presidentes das estatais.
No modelo em vigor, o presidente da República centraliza todos os poderes para indicar os presidentes das estatais, sem nenhuma participação do Congresso no processo. Se aprovado, o projeto transfere ao Senado a palavra final sobre as indicações -que poderá mantê-las ou derrubá-las em votação secreta.
Também cabe exclusivamente ao presidente da República afastar um presidente de estatal. Se a lei estivesse em vigor em meio às denúncias de corrupção na Petrobras, os senadores teriam poderes para retirar a presidente Graça Foster do cargo, o que ocorreu somente após decisão da presidente Dilma Rousseff.
As mudanças atingem em cheio empresas de economia mista como a Petrobras, Eletrobras, Banco do Brasil, e empresas públicas como Correios, BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e Caixa Econômica Federal.
Um dos artigos da futura lei exige que os indicados para a presidência das empresas de economia mista tenham pelo menos um ano de experiência no mercado, apresentando comprovante de exercício no cargo. A trava reduz as chances de indicações exclusivamente políticas para o comando dessas empresas.
A regra, porém, não vale para as empresas públicas, numa brecha que permite aos partidos, deputados e senadores continuarem indicando para a presidente nomes de sua preferência e sem experiência para os cargos de comando desses órgãos.
RECADO
Embora neguem que o projeto seja uma resposta ao governo Dilma Rousseff, Cunha e Renan têm articulado a votação de propostas indigestas para a petista. Os dois autores do projeto são investigados pelo STF (Supremo Tribunal Federal) na Operação Lava Jato, que desmontou esquema de corrupção na Petrobras.
"Não é um projeto contra ninguém, mas as estatais precisam se submeter a regras de controle público e governança. Hoje o universo das estatais é meio paralelo", alfinetou Renan.
Cunha disse que o anteprojeto não "interfere" nas estatais, mas impõe regras mais claras para essas empresas. O deputado disse que a proposta também é uma resposta aos atos de corrupção descobertos nas estatais. "O objetivo é esse, ter qualificação e transparência", afirmou o deputado.
O anteprojeto será analisado por uma comissão de quatro deputados e quatro senadores que, no prazo de 30 dias, vai apresentar o projeto oficial da "Lei de Responsabilidade das Estatais". O texto final terá que ser aprovado pela Câmara e Senado. Renan e Cunha querem votá-lo até o início de julho deste ano, antes de o Congresso entrar em recesso parlamentar.
DIRETORES
Pelo anteprojeto, as estatais continuam com autonomia para escolherem seus diretores, mas eles terão que ser eleitos pelo Conselho de Administração -que, por sua vez, devem ser escolhidos em assembleia geral dos acionistas da empresa.
Se algum diretor for destituído pelo comando da estatal, o conselho fica obrigado a tornar pública a ata da reunião que houve essa deliberação.
O anteprojeto ainda obriga as empresas públicas e de economia mista a criarem conselhos fiscal e auditorias para tornarem públicos seus gastos. A ideia dos congressistas é incluir na proposta o fim do sigilo das transações financeiras das empresas, especialmente de bancos públicos, como o BNDES. Deputados e senadores também querem mecanismos para controlar os gastos das estatais, atualmente mantidos em sigilo.
A comissão que vai analisar o anteprojeto terá como presidente o senador Romero Jucá (PMDB-RR). O deputado Arthur Maia (SDD-BA) vai ser o relator dos trabalhos. Também vão integrar a comissão os senadores José Serra (PSDB-SP), Walter Pinheiro (PT-BA), Otto Alencar (PSB-BA), além dos deputados Danilo Forte (PMDB-CE), André Moura (PSC-SE) e Rogério Rosso (PSD-DF).