Há um ano e três meses, o senador Romero Jucá (PMDB-RR) anunciava o fim de sua breve passagem pela cadeira de ministro do Planejamento no governo Michel Temer. Gravado costurando uma forma de "estancar a sangria" causada pela Operação Lava Jato, não durou duas semanas no cargo. Correndo pelos corredores do Congresso, Jucá usou um eufemismo para confirmar sua demissão: seria uma "licença", um afastamento. A exoneração não tardou. Mas o afastamento nunca veio.
Espécie de eminência parda na gestão Temer, Jucá, atual líder do governo no Senado, ainda é chamado de ministro por parlamentares de vários partidos - e não pela deferência de tratamento, mas por ato falho mesmo. Afinal, dizem, o atual ministro era assessor de Jucá, que manteve sua influência direta sobre o economista Dyogo Oliveira - que permaneceu como interino por quase um ano. E ainda espalhou seus tentáculos por outras áreas enquanto inquéritos (14) e denúncias (3) no Supremo Tribunal Federal se ampliaram.
São dele, por exemplo, algumas das principais ideias em debate na reforma política. Dois dos principais deputados envolvidos nas discussões, Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA) e Vicente Cândido (PT-SP), que comandaram os trabalhos na comissão especial, confirmam a influência de Jucá. O senador quase emplacou a extensão da imunidade criminal do presidente da República aos demais integrantes da linha sucessória, os presidentes da Câmara, do Senado e do Supremo. "O Romero tinha uma reforma política na pasta, com vários temas. Esse era um deles", disse Cândido sobre a adoção de um artigo que pretendia blindar os chefes do Legislativo - depois abandonada. No início do ano, Jucá havia proposto e recuado de uma PEC idêntica, mas negou tentativas de proteger aliados contra a Lava Jato.
Na "pastinha azul" do senador havia ao menos outros dois projetos de lei e uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que foram incorporadas ao texto do relator. Também era do senador a ideia de custear o fundo público de campanha com R$ 3,6 bilhões a partir de recursos das emendas parlamentares e de acabar com programas partidários nos anos ímpares, que não têm campanha, para derrubar as compensações fiscais de rádio e TV. "Isso estava num texto dele, um rascunho, e as isenções de rádio e TV foram só verbalizadas, mas o Eunício defendeu também", afirmou Cândido.
Jucá atuou como um intermediador das propostas discutidas na comissão especial da reforma política, formada por deputados. Cabia a ele checar a viabilidade, no Senado e na área econômica do governo, das ideias formuladas ou adaptadas na Câmara. Teve o aval do senador peemedebista ainda o texto que vinculava o montante do fundo público a 0,5% da receita corrente líquida, recursos do Tesouro, depois retirada pelo plenário da Câmara por causa da repercussão negativa.
Para boa parte dos deputados da base governista, Jucá tem avançado em todas as áreas do governo, deixando rastros nem sempre identificáveis a quem não transita nos bastidores do poder. O líder do governo circula quase sempre com andar apressado pelos corredores, num ritmo ligeiro semelhante ao de marcha atlética, difícil de acompanhar, driblando jornalistas e parlamentares entre uma audiência e outra nos ministérios, no Planalto e em seu gabinete.
Em apenas um dia da semana passada, contabilizou 13 km e mais de 6 mil passos entre reuniões no Congresso e nos ministérios. Os números são computados por meio de um aplicativo de celular com informações do seu smartwacht.
Raras são as vezes em que participa de uma sessão de debates do início ao fim. Cabe aos assessores de seu gabinete correr para alertá-lo de alguma votação nominal importante, o que provoca a correria do parlamentar para dar seu voto. Recentemente, deixou apressado o plenário para votar numa sessão do Conselho de Ética do Senado, quando se pretendia punir senadoras da oposição que atrasaram a votação da reforma trabalhista. Ficou menos de quatro minutos na sessão.
Um senador da base aliada disse, reservadamente, que o governo anda desarticulado porque Jucá, assoberbado, apesar de "muito trabalhador e inteligente", não tem dado atenção às votações do plenário. Para o aliado, "nem Jesus Cristo" daria conta de "acumular a presidência do PMDB, a Casa Civil, o Planejamento, a Fazenda, a liderança do governo, as questões pessoais e ainda o Estado de Roraima".
Na votação sobre a mudança da meta fiscal, não foram poucas as vezes em que o presidente do Congresso, Eunício Oliveira (PMDB-CE), cobrou a atuação do líder. "Não cabe ao presidente do Congresso correr atrás de senador para votar. Isso é função do líder do governo", repetia sempre que a oposição ameaçava derrubar a sessão por falta de quórum.
O senador Romero Jucá disse que muitas vezes não se envolve em alguns assuntos na Casa para "evitar ciumeiras". Ele disse estar "em dia" com a função de líder do governo. "O Senado está em dia com tudo." Um aliado próximo afirma que, se pudesse, Jucá preferia não acumular tantas funções, mas o momento do governo pede alguém com suas características.
Ele cita como exemplo a presidência do PMDB e diz que, sem o "pulso firme" de Jucá, Temer perderia o controle do partido. Enquanto isso, o senador segue se desdobrando para manter o protagonismo. Há cerca de dez dias, por exemplo, deixou uma reunião no Senado e foi até a Câmara para vistoriar um auditório onde pretende realizar a convenção do partido no fim do mês.
Detalhista, quis saber onde seriam posicionados banners, púlpito e convidados. No caminho, gritava ao telefone contra o líder do governo no Congresso, deputado André Moura (PSC-SE). "Não posso também fazer a função dele", repetia ao interlocutor. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.