O Estado que só conseguiu em 30 anos de democracia eleger três deputadas federais – as duas últimas inclusive duas décadas depois da precursora, Cristina Tavares – e tem apenas 10% de suas prefeituras comandadas por mulheres, terá um novo teste este ano para tentar reverter a baixa representação feminina nas eleições de outubro, como incentiva, no País inteiro, uma campanha da Justiça Eleitoral.
Três grandes cidades, Recife (Priscila Krause), Caruaru (Raquel Lyra) e Olinda, têm pré-candidatas na majoritária e, na última, a disputa poderá concentrar três concorrentes competitivas: a ex-prefeita e deputada federal Luciana Santos (PCdoB), a deputada estadual Teresa Leitão (PT) e Isabel Urquiza (PSDB), filha da ex-prefeita Jacilda.
O PSB, sigla da metade das prefeitas em atividade no Estado, quer ampliar a margem. Pretende lançar candidatas em 25 dos 184 municípios. Já o PT, além de Olinda, foca em Petrolândia, no Sertão, onde a professora Adriana Gomes já é pré-candidata ao comando do município, e, obviamente, deseja manter representação nas 12 cidades em que já tem vereadoras. Entre elas, Carnaubeira da Penha, no Sertão. Lá a legenda é representada pela cacique Maria das Dores dos Santos (Dorinha), da etnia Pankará.
No PSDB, 5% dos recursos do fundo partidário são destinados às mulheres, mas a proposta é lançar 200 candidatas ao Executivo e ao Legislativo em diferentes regiões do Estado. Entre elas, Judite Botafogo, em Lagoa do Carro, e a empresária Lucinha, de Toritama, a prefeita, informa a ex-deputada Terezinha Nunes, que tentará vaga na Câmara do Recife. “É a melhor estrutura para as mulheres”, comenta, em relação ao PSDB.
Há uma secretaria nacional das mulheres, que se repete em outros níveis. Para Terezinha, mulheres que almejam carreira política no cenário atual, de proibição de doações de empresas à campanha, podem ter mais chance se representarem segmentos sociais, porque terão eleitores daquela área, não ficando dependente da propaganda. Embora tenha vindo de uma família de políticos, ela tornou-se parlamentar meio por acaso. “Meu pai achava que as filhas deveriam ser professoras”.
A jornalista foi secretária de Estado no governo de Jarbas Vasconcelos (PMDB) e ganhou visibilidade ao comandar o disciplinamento do transporte alternativo. Aceitou o desafio e acabou cumprindo dois mandatos. “Quando cheguei na Assembleia Legislativa nem banheiro feminino existia no plenário”, comenta.
A professora Teresa Leitão, deputada estadual do PT, que entrou para a política como resultado de 14 anos de militância sindical, lembra que no primeiro mandato houve um verdadeiro marco na Assembleia: “Éramos dez deputadas, conseguimos criar a Comissão de Direitos da Mulher e também a participação feminina na mesa diretora da casa”, lembra. Para ela, a reforma política é fundamental para ampliar a participação das mulheres.
A também deputada estadual Priscila Krause (DEM) e pré-candidata a prefeita do Recife herdou a vocação do pai, ex-prefeito e governador, mas construiu trajetória própria. “Não posso ser candidata só por ser filha de Gustavo Krause. Embora me orgulhe disso, preciso de um significado maior”, argumentou quando se preparava para o primeiro mandato de vereadora. E no início da carreira vivenciou algumas discriminações.
“Certa vez defendi a mudança de posicionamento da Câmara em relação a uma matéria e um vereador bateu na mesa dizendo ser macho o suficiente para não mudar de opinião”. Para ela, a política foi criada por homens e para homens. Por isso exclui a mulher. E quem é eleita é reduzida a determinados espaços. “Temos que criar novos paradigmas. Além de estar na Comissão das Mulheres, lutei para participar de outras. Romper o tecido político é difícil. Ninguém transfere poder, ele é tomado num processo de disputa”, avalia.
A educadora e militante feminista Carmen Silva, da ONG S.O.S. Corpo, considera importante a quota de 30% que o Tribunal Superior Eleitoral obriga os partidos a cumprirem em relação a candidaturas de mulheres. “Mas não dá garantia de que serão eleitas, tanto é que muitas vezes não chega a 10% a participação feminina em espaços legislativos”, observa. Para Carmen, é preciso mudar o sistema político. “O voto nominal misto exige que a pessoa tenha votação expressiva, porém, precisa estar numa coligação ou partido com votos suficientes para fazer o coeficiente eleitoral.” Há países em que as vagas no Legislativo são divididas paritariamente entre os dois sexos: 50% homens e 50% mulheres.
No interior dos partidos no Brasil, observa, as coisas funcionam como na sociedade: “Os lugares de poder são controlados pelos homens. Sem poder, no momento da eleição, as candidaturas femininas são as que têm menos recursos, menos espaço na televisão. As mulheres têm menos capacidade de arrecadação porque não são vistas por financiadores de campanha como nomes que darão certo”.
Mesmo as que vêm de família de políticos, com força econômica, enfrentam dificuldades no exercício do mandato. “As mulheres ainda são cobradas socialmente, responsabilizadas pelo trabalho doméstico e cuidado dos filhos.” O machismo explica, portanto, a razão de muitas até se filiarem aos partidos, mas não se arriscarem numa disputa.