Nathaly Fogaça, 21 anos. Recém formada em Comunicação Social – Publicidade, ela decidiu fazer uma viagem de dois meses até Ushuaia, no Sul da Argentina. Os planos previam a companhia de um amigo, mas logo nos primeiros dias de viagem teve que seguir sozinha. O roteiro então mudou: do Sul do Brasil, seguiu para a Argentina, cruzou para o Chile, subiu até o norte do país, cruzou até o Paraguay e cheguei no Brasil. Para acompanhar as viagens pelo Facebook acessar @ChãodaAmérica.
De onde surgiu a ideia da viagem? Foi um desejo seu se viajar só? Qual o roteiro? Como foi a decisão? O fato de ser uma mulher só na estrada pesou na hora?
Desde 2012 eu viajo por aí, acompanhada ou não. Conheci alguns lugares do Brasil, da Argentina, Bolívia e Uruguay, mas sempre com data pra voltar, porque eu estudava e trabalhava. Ano passado, quando "percebi" que iria me formar, me juntei com um amigo e começamos a planejar esse mochilão e, como não tínhamos muito dinheiro, decidimos ir de carona e acampando por aí. Seguimos juntos, mas ainda nos 10 primeiros dias de viagem, meu amigo precisou voltar pra São Paulo e pensei em toda a viagem e em todos os perigos. "Se muitas conseguem, por que eu não vou conseguir?" e "É só pensar em um dia de cada vez" foram os pensamentos que eliminaram parte do medo e me incentivaram a seguir. O fato de ser mulher pesou muito, por isso que, inicialmente, decidi viajar com um amigo; não me sentia segura. Mas aos poucos fui descobrindo que não é tão perigoso assim como dizem, basta ter os mesmos cuidados que tem na sua cidade, por exemplo. Não pego carona a noite, uso roupas "comportadas" e sempre que entro no automóvel, conto sobre a viagem, atitudes que são necessárias para que quem vai te dar carona não confunda as coisas.
Imagino a quantidade de sentimentos que passaram logo nos primeiros dias e semanas. Medo, expectativa, excitação, apreensão. Como os avalia no início e agora?
Inúmeros sentimentos! O primeiro deles foi o medo, quando pensei na viagem como um todo. Mas esse foi passando e dando espaço para a ansiedade, pelo novo, e curiosidade pela história de pessoas e suas culturas. De lá pra cá, me tornei uma pessoa muito mais tranquila e aberta para mudanças, já que logo no começo descobri que viajando assim, sem muita coisa planejada, tudo pode mudar. Aprendi a me virar muito mais, principalmente com o dinheiro, a valorizar o que tenho aqui, no meu lar, e a administrar melhor os sentimentos.
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Como foram os primeiros dias?
Como ainda estava no Brasil e em contato com o nosso idioma, os primeiros dias foram mais tranquilos: abordava caminhoneiros em postos ou mercados (como CEASA) e consegui caronas rapidinho! De vez em quando eu ainda pensava "o que estou fazendo aqui?", mas sempre acontecia alguma coisa boa para me animar. Dormi em cabine de caminhão, em casa de amigos de amigos (em Buenos Aires) e, só depois que conheci a viajante Liz, que escreve na página Doces Aventuras e que já mochila faz um tempo, é que comecei a acampar em lugares como postos de gasolina.
Na estrada, encontrou muitas outras mulheres viajando só?
Como disse, em Buenos Aires encontrei a Liz que viaja com a sua filha, Mel, de dois anos. Com ela, aprendi muita coisa sobre a estrada e caronas. Em Mendoza nos separamos e, dali em diante, não encontrei outras mochileiras solitárias como eu. Encontrei muitas meninas viajando, até de carona, mas sempre estavam acompanhadas de homens. Apenas uma vez encontrei uma dupla de garotas viajando sozinhas (e me juntei a elas, já que tínhamos o mesmo destino!)
Falam sempre dos perigos para você?
O primeiro assunto que abordam quando eu conto sobre meu estilo de viagem, é sobre os perigos da estrada. Assédio, estupro e roubo sempre são citados, mas eu gosto de mostrar pro pessoal que isso pode acontecer em qualquer lugar, até na minha cidade enquanto vou trabalhar, por exemplo. Infelizmente, não estamos livres do perigo em lugar algum, mas digo que a vida na estrada é muito mais tranquila do que dizem e do que eu pensava. Eu sempre encontrava outros mochileiros, não passei um dia sozinha. Pessoas me deram comida, pagaram refeições, me convidaram para acampar em suas casas (aconteceu mais de duas vezes na viagem) sem eu mesmo pedir e, dessa maneira, me mostraram que existem pessoas boas sim!
Que aprendizados tirou ao longo da sua viagem, principalmente para amenizar essa vulnerabilidade?
Aprendi a ser mais cara de pau, porque você precisa ser seja para pedir emprego ou comida, e a ser muito mais simpática - não para conseguir algo, mas porque assim as coisas fluem melhor para mim e para o próximo. Um sorriso contagia, mesmo quando você não fala nada e pode mudar, para melhor, o dia de uma pessoa. Em relação à vulnerabilidade, aprendi a ser firme na minha fala, a sempre explicar o objetivo da carona e ficar atenta para não dar abertura para duplas interpretações.
Em que você acha que o fato de ser mulher limitaria as suas vivências e experiências numa viagem como essa?
Em nada. Independente de gênero, todos nós podemos conhecer o mundo. Infelizmente, sendo mulher, ainda precisamos tomar alguns cuidados, mas nada fora do que já temos que fazer em nossas cidades.
Como foi a reação dos amigos e da família?
Todos se assustaram mais com o fato de seguir de carona, do que de seguir sozinha, afinal os planos eram de viajar com um amigo. Mas quando publiquei na página que ele voltaria para SP, todos ficaram preocupados, principalmente minha mãe. Mas depois, com os relatos e fotos mostrando que tudo estava bem, foram se tranquilizando e percebendo que a estrada não é tão perigosa assim.