Existe um motivo crucial para que um grupo de oposição tenha vencido as eleições em Pernambuco: o governo em exercício estava mal.
Só relembrando, o candidato de Paulo Câmara (PSB) terminou a eleição em quarto lugar. Não é, exatamente, a posição de um competidor cuja popularidade está muito boa.
Os problemas de Pernambuco, na Saúde, na Educação, na Segurança, na Infraestrutura, com desemprego e miséria, vêm sendo relatados há anos.
O diagnóstico é importante para entender o tamanho de cada problema? É. Mas, o que será feito com esses problemas? O que o novo governo fará de diferente para trazer soluções? Isso, após quase dois meses do fim das eleições, ainda não se sabe.
E não é culpa da equipe de transição. A missão deles era técnica, de levantamento de dados. O trabalho deles era, realmente, ficar no universo do Excel e do Powerpoint para ajudar a guiar as ações no futuro.
Mas, como esse futuro será construído é que ainda não ficou claro para ninguém e, essa é a impressão que começa a vingar. Nem a própria equipe que irá trabalhar com a nova governadora parece ter ideia do que será feito.
Todo mundo repete a mesma frase, aliás: “É o jeito de Raquel Lyra fazer as coisas”.
Na vida pública, é preciso ter muito cuidado para não virar folclore. Ter um “jeito de fazer as coisas”, e sendo ele tão peculiar, é um caminho perigoso para isso.
Porque não se trata de uma estratégia para jogar o jogo, mas de não jogar. Não se trata de proteger informações, mas de parecer nem tê-las.
Não se trata de ter um “jeito de fazer as coisas”, como foi em Caruaru, porque a complexidade da administração pública estadual é imensamente maior do que a de qualquer prefeitura em Pernambuco.
Se você analisar o que foi feito desde que a eleição acabou, o que foi apresentado, cria-se uma narrativa que não é boa para quem está prestes a assumir uma gestão desse tamanho.
Que sinalizações o futuro governo deu aos pernambucanos até agora, além da continuidade da discussão de palanque que funcionava na campanha?
Histórias reais são construídas e vão para o imaginário coletivo a partir de uma junção de acontecimentos ao longo de um determinado período. As narrativas são formadas a partir dessa conexão entre acontecimentos e, claro, dos interesses dos envolvidos que as influenciam.
Agora, analisando esses quase dois meses desde a eleição de Raquel, o que se tem é muita reclamação sobre o governo que sai e nenhum apontamento para o futuro. Essa é a História até agora.
As coletivas que foram feitas, as apresentações da transição, todas construíram um ambiente em que não se tem a mínima ideia de pra que lado Pernambuco vai a partir de domingo que vem. E isso é muito ruim. Toda imprevisibilidade na gestão pública é perigosa. Pior ainda quando o governo nem começou.
Paulo Câmara venceu duas eleições que acabaram entrando para a história com a explicação do “era o que tinha”.
Por causa disso, havia um certo desânimo na hora de cobrá-lo. Todo mundo estava insatisfeito, mas não se via grande repercussão dessa insatisfação, porque “era o que tinha”.
Sem a cobrança da sociedade, Pernambuco alcançou índices terríveis e perdeu espaço para outros estados, inclusive Ceará e Bahia.
O maior desafio do governo Raquel Lyra, agora, é provar que o eleitor não agiu por emoção apenas. É mostrar que foi a opção mais sensata.
Na coletiva em que fez um balanço do ano, o secretário da Fazenda do Estado, Décio Padilha, aproveitou para responder sobre as contas de Pernambuco, por causa das críticas da vice-governadora eleita, Priscila Krause (Cidadania).
Ela afirmou que a gestão Paulo estava entregando o governo com as contas "desequilibradas". Padilha rebateu: "nunca vi dizer que R$ 3 bilhões era pouco". Ele ainda falou sobre a melhora na capacidade de crédito do governo e destacou o endividamento: "o menor da História".
No fim, parece mais um cabo de guerra usando os números. O governo que entra quer dizer que está "pegando tudo quebrado" e o governo que sai diz que "o dinheiro é tanto que está vazando nos cofres". Há exageros dos dois lados.
A verdade é que é muito difícil entregar qualquer coisa no primeiro ano de qualquer gestão, por burocracia mesmo, até quando tem dinheiro. Precisa fazer projeto, licitação, e isso demora.
Os dois lados estão colocando suas narrativas para quando houver cobrança. Um diz que foi a "herança maldita" e o outro diz que estava "tudo organizado". Só começaram cedo demais.
O trabalho conjunto de Fernando Haddad (PT) na Economia e Simone Tebet (MDB) no Planejamento, em dois ministérios que não vivem um sem o outro, vai ser muito bom para as colunas de jornais e blogs de notícias.
Porque a visão dos dois é tão diferente que não há a menor chance de isso dar certo sem uma boa dose de submissão ideológica de um lado ou do outro.
Haddad está montando uma equipe que não promete abrir espaço para parcerias com a iniciativa privada. Tebet só aceitou assumir o Planejamento porque poderia controlar o PPI (Programa de Parcerias de Investimento), que é exatamente o responsável por aproximar a máquina pública com o capital privado.
Ainda que todos, absolutamente todos, estejam imbuídos das melhores e mais republicanas intenções, haverá atritos e crises internas.
Na hipótese mais otimista, os dois grupos terão dificuldade para trabalhar juntos em qualquer projeto.
A outra opção é Tebet começar a encher os olhos de emoção ao ver um estado grande e maternal fabricando dinheiro ou Haddad passar a fazer jus ao apelido que os próprios petistas usavam para atacá-lo: o “petista mais tucano do Brasil”.