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Cena Política

Por Igor Maciel
Cena Política

Os recados, as exclamações e as interrogações que Bolsonaro enviou com seu ato

Confira a coluna Cena Política nesta segunda-feira (26)

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Igor Maciel

Publicado em 25/02/2024 às 18:32 | Atualizado em 25/02/2024 às 18:32
Silas Malafaia e Jair Bolsonaro em ato na Avenida Paulista, neste domingo (26) - NELSON ALMEIDA/AFP

O ato convocado por Bolsonaro (PL) para a Avenida Paulista, em São Paulo, correu como o planejado pelo ex-presidente em todos os aspectos. Houve as centenas de milhares de pessoas que ele precisava, ninguém levou faixas pedindo golpe, intervenção militar e nem atacando as instituições do país, quatro governadores estiveram presentes e os parlamentares de todo o Brasil no local conseguiram dar a dimensão de força política que muitos acreditam que ele precisa demonstrar.

Mas tem gente achando que essa demonstração nas ruas impedirá o processo contra ele de seguir ou que, agora, ele não poderá mais ser preso. Errado. O processo continua e ele, em algum momento, deve vir a ser preso.

Mas ninguém precisa se exaltar, porque ele sabe disso muito bem. Já tinha isso calculado.

“Não sem mim”

A foto do evento deste domingo (25) não foi para ser utilizada como salvo-conduto no STF, como ameaça às instituições ou como grande pressão para os adversários, embora também vá servir para isso. O maior recado que Bolsonaro queria dar, e conseguiu, foi para os próprios aliados.

O que Bolsonaro quer dizer aos mais próximos é que ainda tem força, que ainda consegue colocar gente na rua, que terá influência nas eleições de 2024 e uma palavra dele pode fazer o sujeito ter votos nos próximos pleitos ou não, no ambiente da direita brasileira.

O recado de Bolsonaro para os aliados foi: “não me abandonem, pois sem mim vocês não vivem”. E, agora, ninguém poderá dizer que ele não tem razão.

Custo e benefício

Nos últimos dias, quase dava para ouvir as engrenagens das cabeças de figuras como Tarcísio Gomes de Freitas (Republicanos), Ricardo Nunes (MDB) e Valdemar Costa Neto (PL) fazendo barulho enquanto pesavam os prós e os contras de ir ao evento e discursar no evento. E estes são apenas alguns exemplos de políticos que pensaram em não viajar para o ato.

No fim, viram que as caravanas estavam indo a São Paulo, sabiam que haveria muita gente e preferiram não arriscar. Estar ao lado de Bolsonaro neste momento requer muita habilidade para identificar os prejuízos que o ato de abandonar o barco pode trazer nas urnas.

E o resultado, além do discurso do ex-presidente deixou isso muito claro.

Poder da imagem

Bolsonaro precisava dizer aos aliados que é dono dos votos que muitas dessas pessoas tiveram nos últimos anos e que muitas vão querer outra vez no futuro. “Vocês ainda dependem de mim e vão continuar dependendo”, é a mensagem subliminar.

É verdade que o ato foi organizado e pago pelo pastor Silas Malafaia, é verdade que ali estavam, em sua maioria, os fiéis da igreja. É verdade que isso acabou fazendo até com que os discursos seguissem uma linha mais religiosa em alguns momentos do que política, mas as imagens têm poder. E Bolsonaro sabe.

As fotos com a multidão em verde e amarelo vão ocupar espaços nas mídias bolsonaristas por um bom tempo daqui por diante.

Nova delação

Bolsonaro sabe também, porque os segredos em Brasília são quase sempre públicos, que outros participantes da tal trama golpista já avisaram à Polícia Federal na semana passada que pretendem fazer delação premiada.

Essa informação de bastidor circula desde quinta-feira (22), algumas horas depois de o ex-presidente e mais um grupo de ex-assessores e auxiliares terem prestado depoimento.

Anistia

O combinado era que ninguém falaria nada, mas dois decidiram responder às perguntas quando chegaram lá e ao menos um teria se oferecido para fazer sua delação dentro do processo.

O cerco está fechando e Bolsonaro sabe. O próprio discurso do capitão demonstrou um pouco disso. Ele procurou se justificar, negou a trama golpista, disse que não faz sentido querer acusá-lo de algo que não aconteceu e acenou com a “paz”, pedindo que o Congresso Nacional aprove uma “anistia” para os presos do 8/1 e, lógico, para ele também.

Quem é fiel

O apelo é para a base que se elegeu usando sua imagem, ocupa mandatos na Câmara e no Senado, e poderia propor algo desse tipo. Seria uma espécie de perdão coletivo, abrangendo também Bolsonaro, sua família e seus auxiliares envolvidos.

É muito provável que alguma proposta de anistia apareça nos próximos dias circulando pelo Congresso. Devido à sintonia entre Arthur Lira (PP) e Lula (PT), é difícil acreditar que possa vingar, mas os parlamentares farão para demonstrar sua fidelidade ao ex-presidente. E isso dará mais movimentação às redes bolsonaristas.

Curioso

A fala sobre “anistia”, apesar de tudo, pode ter um efeito contrário entre aqueles que não simpatizam com o ex-presidente. É que a “sugestão”, de sucesso improvável, pode soar como uma rendição e ser entendida até como uma admissão de culpa para alguns.

Afinal, ninguém pede para ser desresponsabilizado por algo que não admite ser responsável. Não faz sentido.

Exclamação no PT

Por outro lado, o ato bolsonarista do domingo é uma grande exclamação, como alerta, para o PT e para o governo Lula.

Os dois lados odeiam quando isso é dito aqui na coluna, mas essa reação só comprova o fato. Bolsonaro sobrevive graças a Lula e Lula sobrevive graças a Bolsonaro. É impressionante como os dois estão sempre se ajudando.

Um novo sintoma disso é que o único símbolo a rivalizar com as cores da bandeira brasileira no ato bolsonarista foi a bandeira de Israel.

Combustível

Ao falar bobagens comparando a guerra contra o Hamas ao Holocausto, Lula deu combustível para o ato bolsonarista. O próprio ex-presidente subiu para discursar abraçado com uma bandeira de Israel.

Um pedido de impeachment contra o atual chefe do Executivo, com 139 assinaturas, foi protocolado por causa disso. Dará em nada, já se sabe, mas 139 deputados toparam assinar. Isso diz muita coisa.

Não foi a primeira e não será a última vez que os erros dos petistas reavivam adversários moribundos. Mas este, deu para perceber, que não estava tão moribundo como eles imaginavam.

Interrogação

O evento também deixa uma interrogação imensa. Qual é o tamanho real, eleitoral, de Bolsonaro?

Depois da derrota em 2022 e depois de ficar inelegível, o ex-presidente foi tratado como peso morto pelos petistas e também por alguns antes fiéis escudeiros. Para quem anda menosprezando o poder dele para transferir votos, talvez seja o caso de refazer as contas com mais cuidado.

Ainda mais com Lula falando bobagens dia sim e dia também.

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