Somente 5% dos estudantes que estão no ensino médio querem ser professores, segundo pesquisa realizada pelo Instituto Península. Um outro estudo mostra que até 2040, ou seja, em menos de duas décadas, o Brasil poderá ter uma carência de 235 mil docentes na educação básica, conforme levantamento do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior de São Paulo (Semesp). A duas semanas para o segundo turno das eleições para governos estaduais e a presidência da República, os resultados dessas pesquisas reforçam a urgência da adoção de políticas para formação e valorização dos professores.
O País tem quase 2,2 milhões de docentes na educação básica, dos quais 1,7 milhão lecionam na rede pública. A categoria celebra neste sábado (15) o dia dedicado a ela. "Valorizar e desenvolver os professores é tarefa central para promover a melhoria da qualidade da educação pública e o desenvolvimento do Brasil. Mas para além do posicionamento da carreira em um lugar competitivo financeiramente, o prestígio social tem relação direta com a atratividade", afirma a diretora de Pesquisa e Políticas Educacionais do Instituto Península, Mariana Breim, no texto de apresentação de uma outra pesquisa, divulgada anteontem (13), sobre a percepção da população brasileira em relação à profissão de professor.
"Uma carreira valorizada socialmente é uma carreira que atrai jovens talentosos e que entra para a lista de pautas sociais que merecem ser monitoradas. Mais do que isso: a valorização social pode despertar nos 2,2 milhões de professores do Brasil o reconhecimento que alarga a motivação, turbina o comprometimento e aumenta o desejo de autoria. Ao pensarmos que, segundo as evidências, professores são, entre os fatores intraescolares, os principais responsáveis pelo desempenho dos alunos, a valorização ganha ainda mais relevância", complementa Mariana.
O estudo mostra que 72% dos entrevistados reconhecem que a profissão docente não é valorizada quando comparada com outras como médicos, engenheiros e advogados, sendo que 74% acreditam que seja tão ou mais difícil ser professor. Apenas 20% da população acha que os mestres têm melhores condições de trabalho do que outras profissões. A pesquisa foi feita em junho com 2 mil pessoas com idade de 16 anos ou mais.
FALTA DE INCENTIVO
Foi justamente a pouca valorização do magistério que quase fez a estudante Ariely de Morais, 17 anos, desistir de ser professora. Aluna do 3º ano da Escola de Referência em Ensino Médio Sizenando Silveira, em Santo Amaro, área central do Recife, a jovem começou o ano letivo pensando em tentar vestibular para direito. Mas mudou para letras depois de ter aceitado o convite de um professor para participar de aulas de uma disciplina eletiva. Ao sentir a sensação de estar diante de outros jovens passando um pouco do que sabia ela teve certeza de que deveria seguir o desejo de tornar-se docente.
"Na maioria das vezes que digo que quero ser professora, ouço palavras que me desestimulam. Que professor não ganha bem, se desgasta muito, é pouco valorizado e trabalha demais. Então comecei a pensar em cursar direito pois gosto de leitura, de oratória. Mas conversando com o professor Vamberto, de história, ele comentou que não me via com perfil de fazer direito", conta a vestibulanda.
"Ele perguntou se eu queria participar de uma roda de conversa com a turma do 1º ano. Participei como mediadora de dois debates. Ouvir vários pontos de vista, trocar ideias e conhecimento acendeu uma luz na minha cabeça. Decidi que é isso que quero para minha vida", assegura Ariely.
"Um professor pode fazer a diferença na vida de tantos alunos. Como o professor Vamberto fez comigo. Ir além do pedagógico. Quero fazer isso também", comenta Ariely. Na sua turma, com 40 alunos, ela é a única que planeja cursar magistério. Também uma das poucas da escola.
A pesquisa Atratividade da Carreira Docente no Brasil, realizada pelo Instituto Península, em julho do ano passado, ouviu 1.600 estudantes do ensino médio, técnico e magistério. Só 5% dos entrevistados disseram que serão professores.
Outros 12% até pensam em ser professor e 50% nunca cogitaram a docência. Embora metade dos alunos já pensou em ser professor, dois em cada três desistiram da ideia. Entre os que desistiram, duas das principais razões estão ligadas ao retorno financeiro: não consideram a carreira bem paga para sustentar uma família ou não consideram a carreira meritocrática (salários que aumentam no futuro.)
DECISÃO TARDIA
Vamberto Gonçalves, 43 anos, só ingressou na licenciatura em história aos 36 anos. Despertou para vontade de ser professor 10 anos antes. Mas desde adolescente precisou trabalhar para ajudar no sustento da família. Por isso adiou o ingresso na faculdade. Vendeu picolé e vale transporte, foi auxiliar de serviços gerais e entregador. Atuou em uma locadora de filmes. Fez o Enem, tentou passar numa universidade pública, não conseguiu. Foi aprovado numa instituição particular bancado pelo Fundo de Financiamento Estudantil (Fies), programa do governo federal.
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"Meu pais são analfabetos. Sonhava em fazer um curso superior. A partir do interesse em discutir como o mundo funciona, a organização da sociedade, onde estamos, é que optei por história. Não consigo hoje me ver fazendo outra coisa que não seja estar numa sala de aula. Nunca estive tão feliz. É uma profissão pouco valorizada, cheia de desafios, complexa", comenta Vamberto. "Mas quando escolhi ser professor já sabia desses problemas. Porém a satisfação supera tudo isso. Inspirar jovens como Aracely, contribuir além das questões cognitivas é o que nos motiva", garante Vamberto.
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