A Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA) quer a anulação de três questões abordadas no Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) 2023, aplicado em todo o país no último domingo (5). Além disso, os parlamentares também pedem em requerimento a convocação do ministro da Educação, Camilo Santana, para prestar esclarecimentos sobre "as questões de cunho ideológico e sem critério científico ou acadêmico", segundo nota emitida pela bancada.
"É inacreditável o governo federal se utilizar de desinformação em prova aplicada para quase 4 milhões de alunos brasileiros que disputam uma vaga nas universidades do Brasil", disse a FPA no comunicado divulgado nessa segunda-feira (6).
O Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), responsável pela aplicação do Enem, afirmou que as questões são "elaboradas por professores independentes, selecionados por meio de edital de chamada pública para colaboradores do Banco Nacional de Itens (BNI)".
Ainda segundo o Inep, que é uma autarquia vinculada ao Ministério da Educação, ele não interfere nas ações dos colaboradores selecionados para compor o Banco. "Os itens selecionados para a edição 2023 passaram pelo fluxo estabelecido nas normativas do BNI", respondeu o instituto por meio de nota.
Veja quais são as questões que causaram polêmica:
As questões do Enem que estão envolvidas na polêmica são as de número 89, 70 e 71. A questão 89, presente na prova branca, traz como questionamento a "lógica do agronegócio", usando como referência bibliográfica o artigo "Territorialização do agronegócio e subordinação do campesinato no Cerrado" publicado na Revista Élisée da Universidade Estadual de Goias (UEG).
- "No Cerrado, o conhecimento local está sendo cada vez mais subordinado à lógica do agronegócio. De um lado, o capital impõe os conhecimentos biotecnológicos, como mecanismos de universalização de práticas agrícolas e de novas tecnologias, e de outro, o modelo capitalista subordina homens e mulheres à lógica do mercado. Assim, as águas, as sementes, os minerais, as terras (bens comuns) tornam-se propriedade privada. Além do mais, há outros fatores negativos, como a mecanização pesada, a 'pragatização' dos seres humanos e não humanos, a violência simbólica, a superexploração, as chuvas de veneno e a violência contra a pessoa", aponta o enunciado.
Sobre os elementos descritos no texto, a respeito da territorialização da produção, os candidatos teriam que escolher entre as seguintes alternativas: a) "cerco aos candidatos camponeses, inviabilizando a manutenção das condições para a vida"; b) "descaso aos latifundiários, impactando a plantação de alimentos para a exportação"; c) "desprezo ao assalariado, afetando o engajamento dos sindicatos para o trabalhador"; d) "desrespeito aos governantes, comprometendo a criação de empregos para o lavrador"; e) "assedio ao empresariado, dificultando o investimento de maquinários para a produção".
Na questão 70, que também foi apontada como "mal reformulada" pela bancada ruralista e setores ligados ao agronegócio, o tema foi sobre o avanço da cultura da soja e o desmatamento na Amazônia. Na prova, foi apresentado um trecho do texto "A Amazônia e a nova geografia da produção da soja", publicado em 2006, pela Revista Terra Livre.
- "Alternativas logísticas estão servindo de instrumentos que ativam os mercados especuladores de terras nas diferentes regiões da Amazônia e constituem em indicadores utilizados por diferentes atores para defender ou denunciar o avanço da cultura da soja na região e, com ela, a retomada do desmatamento. É evidente que o crescimento do desmatamento tem a ver também com a expansão da soja, porém atribuir a ela o fator principal parece não totalmente correto. Parto da compreensão central de que a lógica que gera o desmatamento está articulada no tripé grileiros, madeireiros e pecuaristas".
Sobre a visão do autor a respeito de qual seria o motivo que desencadeou o problema central da situação descrita, os candidatos deveriam escolher entre as seguintes alternativas: a) "apropriação de áreas devolutas; b) "sonegação de impostos federais"; c) "incorporação de exportação ilegal"; d) desoneração de setores produtivos"; e) "flexibilização de legislação ambiental".
Por fim, a questão 71 do Enem tratou da nova corrida espacial financiada por bilionários, discutindo as perspectivas que ela aponta. No texto 1, a prova traz um trecho da matéria "Corrida espacial dos bilionários pode trazer vantagens para todos", publicada pelo portal de notícias R7, em 2021. E no texto 2, uma charge do artista Fernando Cazo.
- "Por hora, apenas os mais abastados poderão sonhar em viajar ao espaço, seja por um foguete ou por um avião hibrido, mas toda a população global poderá sentir os efeitos dessas viagens e avanços tecnológicos. Para uma aventura dessas, as empresas tiveram que criar novas tecnologias que podem, em algum momento, voltar para a sociedade. A câmera fotográfica, hoje comum no mundo, antes foi uma invenção para ser usada em telescópios , e o titânio, usado até na medicina, foi desenvolvido para a construção de foguetes"
Sobre o que relevam as novas perspectivas da corrida espacial baseada nos dois textos, os candidatos se depararam com as seguintes alternativas: a) "Dependência e progresso"; b) "Expectativa e desconfiança"; c) "Angústia e adaptação"; d) "Pioneirismo e retrocesso"; e) "Receio e civilidade".