Notícias sobre educação e formação profissional

Enem e Educação

Por Mirella Araújo e equipe
ENSINO SUPERIOR

Cota na USP: Justiça autoriza aluno barrado por banca a frequentar aulas de Medicina

Em decisão provisória, o juiz Danilo Martini de Moraes Ponciano de Paula determinou que a USP permita que Alison frequente as aulas no prazo de 72 horas sob pena de multa de R$ 500 por dia de atraso

Cadastrado por

Estadão Conteúdo

Publicado em 05/04/2024 às 14:20
Alisson dos Santos Rodrigues, de 18 anos, participou do Provão Paulista, novo vestibular unificado das instituições públicas de ensino superior de São Paulo - Arquivo pessoal/Laise Mendes dos Santos

A Justiça de Cerqueira Cesar, no interior do Estado, concedeu, nesta sexta-feira, 5, liminar para permitir que o estudante Alison dos Santos Rodrigues, de 18 anos, seja matriculado no curso de Medicina da Universidade de São Paulo (USP). A efetivação da matrícula havia sido barrada pela instituição após a banca de heteroidentificação não ter considerado o candidato como pardo, como ele pleiteava.

Em decisão provisória, o juiz Danilo Martini de Moraes Ponciano de Paula determinou que a USP permita que Alison frequente as aulas no prazo de 72 horas sob pena de multa de R$ 500 por dia de atraso, limitada ao teto de R$ 20 mil.

Leia Também

Nesta semana, provocada a se manifestar no processo, a universidade havia descrito o estudante como sendo "de pele clara", com "boca e lábios afilados" e que o "cabelo raspado", o que impediu a bancada de identificá-lo adequadamente.

Para o magistrado, o candidato, aprovado por meio do Provão Paulista, foi prejudicado no processo de avaliação por ter sido submetido à etapa de confirmação de sua autodeclaração de forma virtual, "enquanto os candidatos oriundos da Fuvest puderam ser avaliados em entrevista presencial".

"Com efeito, a avaliação presencial poderia ter surtido resultado diverso, à medida que condições de iluminação e definição de equipamentos eletrônicos podem gerar distorções."

PARECER DA COMISSÃO

O juiz pontuou ainda que, a partir do parecer da comissão que negou o recurso ao aluno, é possível concluir que "a fundamentação exarada, ao menos em sede de cognição sumária, mostra-se genérica, sem referência específica às condições do candidato e em aparente contradição com as fotografias trazidas aos autos pela parte autora (Alison)", escreveu na decisão.

A advogada Giulliane Jovitta Basseto Fittipald, que representa Alison no processo, emitiu nota após a manifestação da USP no processo para ressaltar que "é evidente o erro de julgamento da comissão (da universidade) e a ausência de razoabilidade em sua decisão, bem como é nítido que os parâmetros utilizados pela Comissão de Heteroidentificação são absolutamente subjetivos, sem critérios adequados para serem aferidos".

"É fácil identificar no Alison traços de pessoas de cor negra, como: pele escura, nariz achatado, com o dorso curto, asas da base ainda mais alargadas, assim como narinas maiores e ponta arredondada. Da mesma forma, no desenho dos lábios, tendo em vista em pessoas negras o aspecto dos lábios é maior que em pessoas de cor branca, além do cabelo crespo, características estas fenotípicas pardo, descendente de negros", acrescentou a defensora.

MANIFESTAÇÃO DA USP

Na manifestação à Justiça, a universidade disse que o candidato passou pela 1ª fase da heteroidentificação, análise dos documentos e fotos, "em que nenhuma das duas bancas confirmou sua autoidentificação para os critérios da universidade (sem que uma soubesse da decisão da outra)".

Alison Rodrigues passou, então, para a 2ª etapa da análise, feita por videoconferência. "Ele leu sua autodeclaração para a Banca de Heteroidentificação, que concluiu que o candidato tem pele clara, boca e lábios afilados, cabelos raspados impedindo a identificação, não apresentando o conjunto de características fenotípicas de pessoa negra", afirmou a universidade.

A USP também anexou no documento o parecer produzido pelos membros da Comissão de Heteroidentificação, que afirma que "diante do conjunto de informações apresentadas, a comissão entendeu, de maneira consensual, por ratificar a conclusão da Comissão de Heteroindetificação, segundo o qual o recorrente não cumpre os requisitos necessários à vaga reservada para o grupo PP (Pretos e Pardos) na Universidade de São Paulo, porque não possui traços fenotípicos aptos a defini-lo como preto e pardo", diz a instituição.

Na declaração, a USP defendeu o processo de avaliação. Afirmou que Alison "foi submetido a procedimento bastante criterioso, com múltiplas conferências, bancas diferentes, sistema cego de double checking (dupla checagem), possibilidade de recurso administrativo e com exercício do contraditório e da ampla defesa".

A pró-reitora de Inclusão e Pertencimento da Universidade de São Paulo (USP), Ana Lúcia Duarte Lanna, rebateu as críticas de que a banca de heteroidentificação para avaliar candidatos às cotas seja um "tribunal racial".

"Essa posição que diz que as comissões de heteroidentificação como tribunal racial são muito complexas, porque desconhecem o acúmulo de debate em torno dessa questão, indo contra a política de cotas", disse ao Estadão a professora, à frente do órgão criado em 2022 para cuidar das políticas de diversidade na maior instituição de ensino superior da América Latina. (Colaborou Ma Leri)

 

Tags

Autor

Veja também

Webstories

últimas

VER MAIS