Por Fernando Castilho, do JC Negócios.
O presidente Jair Bolsonaro está absolutamente certo de que seu governo corre risco efetivo se a economia parar. Teme que a chamada “voz rouca das ruas” não esteja do seu lado quando os efeitos dessa parada acontecer - provavelmente entre junho e agosto – e que sua milícia digital já não esteja mais do seu lado neste momento.
Mesmo sem dizer que não sabe “nada de economia” e se escorar no seu “Posto Ipiranga”, o presidente conhece a história de antecessores de dentro do Congresso. Até porque estava lá.
Isso pode explicar o comportamento errático na abordagem ao problema da covid-19 também em relação a economia. Isso, é verdade, o empurra perigosamente para buscar ancoragem numa realidade paralela. E isso, também, o leva a atrapalhar as ações de quem já incorporou a situação e que exige dela ações de apoio à ideia de enfrentar a crise, sabendo que a economia pode chegar a ter crescimento negativo.
O problema é que o presidente já foi longe demais na sua interpretação e, por estar certo de suas verdades, agora parte para pressionar os que pensam diferente. O ministro Paulo Guedes - que leu os relatórios do BC e viu as curvas dos modelos matemáticos ali rodados – sabe disso.
O seu discurso de ministro da Economia o obriga a liderar a força de tomada das ações que reduzam o estrago. Mas sabe que os números mostrados pelo presidente do BC, Roberto Campos, são inquietantes. Mas Paulo Guedes sabe que essa é sua missão no governo, manter o moral alto. Ao menos da boca para fora.
Isso também pode explicar a irritação do presidente como o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta. Médico, político e experiente em gestão, Mandetta viu que tem que alarmar mesmo pois, se aliviar, o brasileiro vai aproveitar a ordem de ficar em casa para ir à praia e fazer churrasco na laje. Para quem está com a mãe na fila do SUS com diagnóstico de câncer, o coronavírus é quase nada.
Mas o covid-19 já está precificado do ponto de vista médico. O que o ministro faz é uma política de redução de danos mirando não colapsar o SUS. Esse é o foco central. E para isso que defende que a economia terá que hibernar.
O problema do presidente é que ele decide rápido, com poucas informações e age por impulso. E tende a ser influenciado pelas suas emoções. Bolsonaro chama isso de feeling político pelo tempo que passou na Câmara.
Daí porque a ideia de decretar calamidade pública para ele é uma porta para se livrar de uma acusação de impeachment por gastar mais ou legalmente errado. Na sua cabeça, o decreto lhe dá um “Salvo Conduto” legal para atuar do jeito que bem entende. Daí seus alertas de que a economia não pode parar pela histeria da nova doença.
Mas ele terá que se render aos fatos. E quem vai pressioná-lo não é o exército de apoiadores digitais que estão dispostos a resistir nos teclados de seus smartfones.
Quem pode ameaçar, de fato, seu governo são os mais de 42 milhões de trabalhadores na informalidade — cerca de 41% do total de ocupados. Serão essas pessoas que até votaram nele, mas que podem passar a ficar sem qualquer renda com o avanço de um sistema mais rígido de quarentena que começarão a pressionar por ações do seu governo.
Isso explica por que Bolsonaro está falando mecanismos que injetar dinheiro aos beneficiários do Bolsa Família, Minha Casa Minha Vida e todos os demais programas sociais herdados dos governos do PT. É nesse contingente que ele mira.
Por uma dessas ironias da política, Bolsonaro e sua equipe econômica liberal terão que se valer desses cadastros para injetar o dinheiro que pode garantir a sustentação do seu governo. Porque para os aposentados, beneficiários do BPC e pessoas com deficiência ele não faz nenhum favor ao lhe dar mais dinheiro. Esse é um direto seu conquistado pela Constituição de 1988.
Esse público - que nunca reconheceu que essa foi uma conquista no Governo de José Sarney que a implantou - não vai achar que Bolsonaro lhe deu uma ajuda salvadora numa hora de crise.