Bolsonaro sonha vender Petrobras para poder acusar os novos donos de culpados pela inflação de seu governo

Presidente não se enxerga como responsável pela alta dos preços dos combustíveis e culpa a estatal que o seu governo controla
Fernando Castilho
Publicado em 14/10/2021 às 16:20
Questionado sobre o Auxílio Brasil, o programa que substitui o Bolsa Família, o presidente desconversou e disse que a prioridade, neste momento, é a disparada do valor dos combustíveis Foto: MARCELO CAMARGO/AGÊNCIA BRASIL


Num desabafo que revela o nível de preocupação que o assunto representa hoje para o seu governo, o presidente desabafou, nesta quinta-feira: "É muito fácil, 'aumentou a gasolina, culpa do Bolsonaro'. Eu tenho vontade, já tenho vontade de privatizar a Petrobras. Tenho vontade, vou ver com a equipe econômica o que a gente pode fazer", disse o presidente.

Vontade ele pode ter, mas fazer isso é um enorme desafio e até hoje nenhum presidente foi além de sua queixa contra a estatal. Embora, em alguns momentos, todos os presidentes tenham a usado para alavancar as ações do Governo.No governo Lula, por exemplo, com as condições internacionais que dobraram as exportações brasileiras e o Brasil virou o centro das atenções do mundo, não se falava em privatizar a companhia.

Na verdade, no governo Lula, a Petrobras decidiu entrar como investidora em qualquer tipo de negócio relacionado com energia, ainda que isso significasse fortíssimo endividamento que, aliás, a transformaram na petroleira mais endividada do mundo. O resultado a gente conhece. Ela foi usada para todos os tipos de atos de corrupção e, desde 2016, vem se desfazendo de ativos que nunca deveriam ter comprado.

Mas a pergunta sempre é: o Governo é mesmo o dono da Petrobras? É, mas tem que esclarecer. O Governo tem a maioria das ações do chamado Grupo de Controle. O Governo do Federal é dono de exatas 3.740.470.811 ações que representam 50,26%. O BNDES, através de sua subsidiária BNDESPar, tem mais 10.700.392, que representam 0,24%. É esse percentual que permite ao governo definir o nome do presidente e ter a maioria dos assentos no Conselho de Administração.

O problema do presidente é que a companhia tem um outro grupo de acionistas que tem importância capital e, tecnicamente, obrigam a Petrobras a prestar contas aos outros sócios. Por exemplo, a Petrobras tem ações na Bolsa do Brasil (B3), mas tem ações na Bolsa de Nova Iorque (NYSE) e esses sócios controlam outros 39,75%. Ou seja, eles não controlam a empresa, mas o peso do dinheiro que aplicaram na empresa tem que ser respeitado. Isso de acordo com as leis brasileiras e com a leis americanas.

O que quer dizer que a Petrobras tem que prestar contas aos seus outros sócios. Quer dizer: o fato do Governo controlar 50,50% das ações da empresa não lhe dar o direito de não respeitar os 49,50% dos demais sócios. Nos últimos anos - depois do Petrolão – a Petrobras precisou se reorganizar parta atender uma série de normas internacionais e passou a cuidar de seus negócios de acordo com os interesses não apenas do Governo, mas dos outros acionistas.

Embora possa se queixar, o presidente Bolsonaro não pode dizer como a estatal deve proceder, mesmo que hoje isso seja o principal problema de seu governo - depois da inflação.

Mas mesmo que deseje vender as ações do Governo e Privatizar a Petrobras, Bolsonaro não pode fazer isso de um dia para o outro. O Congresso precisa aprovar a venda que terá que ser feita em blocos podendo qualquer pessoa ou empresa comprar.

O problema da visão simplória de Bolsonaro é que ele fala em vender a Petrobras para poder dizer que a culpa não é do Governo e que se ela fosse uma empresa privada, o próprio Governo poderia intervir na companhia e resolver baixar os preços praticados, mesmo que isso representasse um enorme prejuízo aos novos donos.

Ou seja, o presidente pensa em vender a Petrobras para acusar os donos de serem responsáveis pela inflação.

O que dificulta a ação do Governo é que, sendo estatal com ações da Bolsa do Brasil e dos Estados Unidos, ela tem que ser submeter às regras internacionais. Até porque se o presidente mandar baixar os preços por sua livre vontade pode ser acionado, não na Justiça brasileira, mas na dos Estados Unidos.

Bolsonaro sabe disso, embora não esteja ajudando o seu próprio governo a buscar soluções econômicas e politicas para baixar a cotação do dólar e fazer a Petrobras comprar petróleo mais barato.

Na verdade, esse tipo de declaração simplória só prejudica a empresa - e o consumidor ainda mais -, pois com o dólar alto, a Petrobras paga mais reais para comprar petróleo e assim repassar os aumentos.

Portanto, do jeito que Bolsonaro governa o Brasil, ele só pode mesmo ficar na vontade de privatizar a Petrobras para, em público, acusar os novos donos de impatrióticos.

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