Nas semanas que antecederam o segundo turno de 2018, uma frase colocada nas redes sociais previa a vitória de Bolsonaro com uma advertência: “É bom já ir se acostumando.”
Quatro ano depois, a frase parece adequada em relação às movimentações do ex-ministro da Fazenda no Governo Dilma Rousseff, Guido Mantega, que voltou ao noticiário, seja como autor de artigos, seja como personagens de articulação de temas econômicos junto ao ex-presidente Lula ou ainda como possível integrante da futura equipe econômica num eventual terceiro governo Lula.
Portanto, apesar da surpresa de uma possível “reabilitação” de Guido Mantega, é bom já ir se acostumando.
Apesar de todas as críticas que podem ser feitas a Mantega, é importante lembrar que o economista formado na USP e professor da PUC-SP é uma figura conhecida nos meios acadêmicos e respeitado no PT porque, junto com Aloisio Mercadante e Márcio Porchman, forma o chamado núcleo formulador de fundamentos econômicos acadêmicos do partido.
Mantega também sempre circulou com muita desenvoltura pelo empresariado paulista, pela sua origem: filho empresário, apesar de suas posições ligadas à esquerda desde os bancos da universidade. Ou seja, o genovês Guido Mantega nunca foi um estranho dentro da elite paulistana.
É importante lembrar que Mantega foi estrela no governo Dilma. No governo Lula ele ficou no BNDES, onde foi um dos formuladores da política de campeões nacionais - que transferiu R$ 500 bilhões ao setor privado a juros baixos.
Mantega está de volta aos jornais. Nesta quarta-feira, por exemplo ele assina um artigo na Folha de São Paulo onde diz que Bolsonaro faz “um dos piores governos da história republicana brasileira” para lembrar que, no Governo Lula, quando esteve à frente do BNDES, o PIB brasileiro entre 2003 e 2014 teve um crescimento médio de 3,5% ao ano, enquanto o desemprego caiu para abaixo de 6% da população economicamente ativa; em 2008, o Brasil recebeu avaliações positivas de grau de investimento e a pobreza caiu de 26,7%, em 2002, para 8,4%, em 2014.
Mantega, naturalmente, nunca explicará sua contabilidade criativa ou as “pedaladas fiscais” - série de eventos que derrubou Dilma Rousseff do governo.
Por isso é importante lembrar que sua presença no ministério da Fazenda ficou marcada por mudar despesas e receitas dentro das empresas estatais, fazendo transferências de recursos para apresentar um resultado positivo nas contas.
Mudar dinheiro de uma empresa para outra, transferir recursos de uma área para outra é comum em grupos privados, onde o acionista controlador tem esse poder. No setor público, isso é amarrado por um orçamento aprovado pelo Congresso.
Mas, enquanto ministro, Mantega fez. E todo mundo lembra que ajudou Dilma Rousseff e o presidente do Banco Central, Alexandre Tombini, a reduzir os juros forçadamente para os 7,25% e atuar no câmbio para evitar que o dólar atrapalhasse os planos do governo. Num eventual Governo do PT, Mantega não poderia fazer isso, já que Roberto Campos Neto tem mandato.
E para quem reclama que Bolsonaro mexeu na Petrobras, é bom lembrar que ele, como ministro de Dilma, também impediu reajuste dos combustíveis enquanto o caixa da companhia era corroído pela alta do petróleo no mercado internacional.
Ditaduras costumam promover expurgos e reabilitações. Isso aconteceu na Rússia de Stalin. Aliás, Wladimir Putin cuida entre outras coisas de reabilitar o velho ditador. Na China também. O próprio Xi Jinping é filho de um dirigente do BC chinês que, após servir anos ao partido, foi expurgado por Mao Tsé-Tung na Revolução Cultural.
Nas Democracias, a história procurar acrescentar novo fato, mas não é raro que personagens com participações críticas no passado voltem a ganhar novas missões.
Mas mesmo que entre empresários, o mercado e políticos incomode que ele esteja de volta ao centro das articulações, Guido Mantega poder compor a equipe da campanha presidencial petista parece ser uma realidade.
Guido Mantega estava no jantar de Lula com Alckmin, onde não estava Dilma Rousseff. E muitos parecem ter esquecido que Mantega mandava e desmandava nos desembolsos dos cofres públicos – tudo para mascarar, novamente, os já péssimos resultados das contas públicas.
É importante lembrar que então ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante confessou a empresários que o governo foi “longe demais” com as desonerações tributárias concedidas a segmentos da economia. Todos sabemos o que isso significou.
E o PT parece ser muito seletivo quando faz as contas apenas entre 2002 e 2014. Ou como diz Mantega, quando o Brasil era um País pouco endividado, com uma dívida pública líquida igual a 32,5% do PIB, enquanto o Banco Central acumulava reservas de US$ 374 bilhões.
O PT tem um modo de atuação conhecido. Não faz aliança onde não controle o resultado. O PT tem uma marca da Direita que é a de “não abrir nunca”. Mantega nunca renegou uma linha do que fez quando estava no comando da Economia.
Portanto, como diziam os bolsonaristas: “É bom já ir se acostumando.”