Cenário econômico em Pernambuco, no Brasil e no Mundo, por Fernando Castilho

JC Negócios

Por Fernando Castilho
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Coluna JC Negócios

Com renúncia fiscal, inflação e taxas de juros acima de 10%, Bolsonaro repete Dilma antes da crise de 2015 e 2016

Nessa quarta-feira (2), ao fixar a taxa básica de juros em 10,75%, o Comitê avisou antever como mais adequada, neste momento, a redução do ritmo de ajuste da taxa básica de juros

Fernando Castilho
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Publicado em 03/02/2022 às 7:30
ALEXANDRE GONDIM/JC IMAGEM
RENOVAÇÃO DE ESTARTÉGIA Em ano eleitoral, governo Bolsonaro estuda reduzir imposto sobre produtos industrializados entre 15% e 30%, medida já utilizada na gestão de Lula - FOTO: ALEXANDRE GONDIM/JC IMAGEM
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O final do governo Jair Bolsonaro está cada vez mais parecido com o início do segundo governo Dilma Rousseff, em 2015, quando o Brasil começou a conviver com taxas de inflação e básica de juros (Selic) acima dos 10%.

Como a ex-presidente, do PT, Bolsonaro também cogita conceder renúncia fiscal, desta vez no IPI, enquanto Dilma promoveu uma desoneração da folha de pagamento em 57 setores, 40 deles revogados mais tarde.

Em 2014, quando foi reeleita Dilma, a taxa Selic estava numa tendência de crescimento, e já no mês de janeiro chegou a 10,5% (na reunião do Copom de 15 de janeiro).

Nessa quarta-feira (2), ao fixar a taxa básica de juros em 10,75%, o Comitê avisou antever como mais adequada, neste momento, a redução do ritmo de ajuste da taxa básica de juros. Essa sinalização reflete o estágio do ciclo de aperto, cujos efeitos cumulativos se manifestarão ao longo do horizonte relevante. Desde janeiro de 2021, quando a Selic estava em 2%, o Copom sobe as taxas de juros.

A taxa de juros de 10,75% é a maior desde 1º de janeiro de 2017, no Governo Michel Temer. Mas há uma grande diferença de cenários econômicos. A reunião que fixou a taxa vinha numa sequência de baixas desde setembro de 2015, quando estava em absurdos 14,25%, no meio da crise política que nos levou ao segundo impeachment da democracia brasileira.

 ROBERTO STUCKERT FILHO/PR
LONGE DEMAIS Dilma Rousseff tomou várias medidas controversas para garantir um segundo mandato - ROBERTO STUCKERT FILHO/PR

Desta vez, a taxa básica de juros está em forte crescimento, com o Banco Central considerando que, diante do aumento de suas projeções e do risco de desancoragem das expectativas para prazos mais longos, é apropriado que o ciclo de aperto monetário avance significativamente em território contracionista.

O Comitê ainda enfatiza que irá perseverar em sua estratégia até que se consolide não apenas o processo de desinflação, como também a ancoragem das expectativas em torno de suas metas.

Diz também que a inflação ao consumidor seguiu surpreendendo negativamente. Essa surpresa ocorreu tanto nos componentes mais voláteis como principalmente nos itens associados à inflação.

Na questão da inflação, o governo Bolsonaro também tem uma assustadora coincidência com o de Dilma Rousseff. Nos dois, ela chegou a mais de 10%. Em 2021, a taxa apurada pelo IBGE chegou a 10,06%. Como no governo de Jair Bolsonaro, a taxa em 2015 chegou a 10,67% depois de uma trajetória que começou a subir em 2012.

Alta do IPP

A coincidência de indicadores negativos assusta economistas e historiadores da economia. Especialmente porque, esta semana, o IBGE divulgou a taxa de IPP, que fechou 2021 com alta recorde de 28,39%.

O Índice de Preços ao Produtor (IPP) das Indústrias Extrativas e de Transformação mede os preços de produtos “na porta de fábrica”, sem impostos e fretes, e abrange as grandes categorias econômicas: bens de capital, bens intermediários e bens de consumo (duráveis, semiduráveis e não duráveis).

O destaque foi o refino de petróleo e biocombustíveis (69,72%), outros produtos químicos (64,09%), metalurgia (41,79%) e madeira (40,76%). O IPP de 2021 revela ainda que, no caso dos alimentos, pelo sexto mês consecutivo houve alta de preços no setor (2,09%), na comparação com o mês anterior.

Foi o terceiro ano consecutivo em que a variação anual fechou acima de 10%: em 2019, 10,14%; em 2020, 30,40%; e, agora, 18,57%.

Desonerações e redução de impostos

Finalmente, Bolsonaro se aproxima do perfil do Governo Dilma em 2015 em relação às desonerações e redução de impostos. Nessa quarta-feira, o Governo admitiu que estuda reduzir as alíquotas do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) linearmente em 15% a 30%.

A redução de 30%, se efetivada, impactaria em R$ 24 bilhões a arrecadação de tributos. Também no Governo Dilma, no dia 15 de setembro, ocorreu desoneração na folha de pagamento, concedida a 56 setores e aumentou as alíquotas incidentes sobre a receita bruta das empresas.

Iniciada em 2011 no governo da ex-presidente, a renúncia fiscal atingiu, em 2014, cerca de R$ 22 bilhões. A desoneração trocava a contribuição patronal de 20% sobre a folha de pagamentos para a Previdência por alíquotas incidentes na receita bruta das empresas.

É coincidência demais.

Redução de impostos é bom para qualquer empresa. Aumenta a competitividade e, bem-negociada, gera empregos. Concedida como ato de governo sem crédito, aumenta a crise.

No caso da desoneração ampla de tributos sobre os combustíveis e energia elétrica, o ministro da Economia, Paulo Guedes, recuou de seu apoio inicial à medida, que poderia custar cerca de R$ 70 bilhões aos cofres da União.

O governo, contudo, manteve a intenção de zerar impostos federais, como PIS/Cofins, sem contrapartida na arrecadação, mas agora com foco no diesel. Paulo Guedes admite que a renúncia dos tributos para o diesel pode custar até R$ 18 bilhões.

FÁTIMA MEIRA / ESTADÃO CONTEÚDO
EXPLICAÇÃO Aumento do dólar teria sido por crise política e covid-19 - FÁTIMA MEIRA / ESTADÃO CONTEÚDO

Como em 2015, temos subida de juros e o governo fragilizado falando em redução de impostos sem qualquer foco no objetivo, abrindo mão de receitas.

Os anos de 2015 (-3,8%) e 2016 (-3,6%), como se sabe, nos levaram a uma crise econômica que encolheu a economia em quase 8% e o trauma de um segundo impeachment.

O problema é que, fora a questão da manutenção da desoneração da folha de pessoal para 17 setores responsáveis por 6 milhões de empregos, não há nenhuma negociação do Governo Bolsonaro com setores de economia. A proposta foi colocada pelo governo com forma de obter apoio nas próximas eleições.

O gesto ocorre exatamente como aconteceu em 2015, quando a desoneração de 57 setores pegou uma parte deles de surpresa. A presidente decidiu incluir a desoneração para também ampliar seu apoio no Congresso.

É difícil citar Karl Marx no século XXI, mas lembro da conhecida frase: “A história se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa”. Existem coincidências demais entre 2022 e 2015.

O perigo de 2022 é que uma nova farsa nos encaminhe para uma nova tragédia na economia. Tomara que, no nosso caso, Marx esteja errado.

MARINA RAMOS/AGÊNCIA CÂMARA
LEGISLATIVO Apelo é para que disputa não atrapalhe votações importantes - MARINA RAMOS/AGÊNCIA CÂMARA

 

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