Acesso à leitura pela tecnologia

Em 4 anos no mercado, o aplicativo Skeelo oferece e-books, audiobooks, e agora também livros físicos
Fábio Lucas
Publicado em 28/06/2023 às 0:00
Aplicativos podem ampliar o hábito da leitura Foto: unsplash


Terceiro aplicativo de leitura mais baixado no Brasil, o Skeelo completou quatro anos em maio, com 159 milhões de indivíduos que podem acessar o serviço de um acervo com mais de 140 mil títulos. Nesta entrevista ao JC, André Palme, Chief Marketing & Content Officer (CMCO) da empresa, conta a proposta do aplicativo, fala sobre os formatos disponíveis, e aborda também o mercado de audiobooks no país, inclusive mencionando o futuro do segmento a partir da perspectiva do uso de inteligência artificial. Com participação recente no mercado editorial, o Skeelo se apresenta como agente de conquista de acesso, fazendo a ponte tecnológica para a leitura. “Precisamos muito dos conteúdos de qualidade, e os conteúdos de qualidade veem no Skeelo uma maneira de conseguir distribuição, e até uma vitrine diferente. Uma vitrine que pode ser difícil de outra maneira”, diz André Palme.

Divulgação - André Palme é CMCO do Skeelo

JC – Qual a proposta do Skeelo, que completou 4 anos de atividade?

André Palme - O Skeelo veio com o propósito de resolver dois grandes gargalos do livro no Brasil. Nasceu com a missão de facilitar, através da tecnologia, o acesso aos livros e à leitura. Porque existem historicamente muitos dados de que no Brasil não se lê, e os índices de leitura são muito baixos. A gente discorda disso. Há dois problemas que fazem com que esses números sejam sempre repetidos.

JC – Que problemas são esses?

André Palme - O primeiro é a distribuição. Claro, estamos falando de um país continental, com um monte de desafios logísticos, com poucas livrarias fora dos grandes centros. A distribuição é uma questão, seja pelo custo da operação, seja pela falta de capilaridade. E pelo tamanho do Brasil. Como fazer com que as pessoas tenham mais acesso, e a gente rompa com essas dificuldades? Duas coisas são relevantes nesse sentido. O fato de o Skeelo ser uma solução digital, um aplicativo que está nos celulares de todo mundo. O celular é uma coisa quase que onipresente, se a gente faz recortes de Brasis dentro do Brasil. Um país onde existem lugares em que não chega luz elétrica. Excluindo-se esses pontos em que não chega quase nada, infelizmente, a grande maioria da população pode ser atingida com um celular na mão.
A segunda coisa relevante foi achar parceiros que tivessem grande capacidade de distribuição de conteúdo. Fizemos parcerias desde o começo com operadoras de celular, que são canais em contato com o público. E com empresas que têm esse tipo de distribuição massiva. Hoje temos parceria também com operadoras de internet. Tem uma modalidade de empresa que se chama ISP, sigla em inglês para provedor de serviço de internet, porque quando você sai dos grandes centros, não necessariamente sua internet é a da Vivo ou da Claro, há muitos provedores locais. Muitos mesmo, são dezenas de milhares. Também fizemos parceria com o Sem Parar, com o UOL. Fomos expandindo esse rol, pensando em parceiros que poderiam nos ajudar na distribuição.

JC – E o segundo problema?

André Palme - O acesso. Não é tanto que o brasileiro não quer ler. É porque muitas vezes o acesso não existe. Seja porque não chega, ou por uma questão econômica mesmo, não há possibilidade de despender certo valor para comprar um ou mais livros durante o mês. Sempre faço um paralelo. Alguns meses atrás, teve aqui em Florianópolis a Semana Nacional do Cinema. E fui assistir a um filme numa sexta-feira à noite. Florianópolis é uma capital, cidade razoavelmente grande, mas os cinemas nunca estão lotados. Nesse dia estava lotado. De fila de meia hora para pegar pipoca. Conversando com minha esposa, comentamos que é curioso, não é que as pessoas não querem ir no cinema, é porque uma família com quatro pessoas vai gastar 200 reais ao ir no cinema. É muito mais uma questão de acesso do que de gosto. No livro, o desafio é parecido. Quando encontramos um modelo viável para os parceiros distribuidores, e que remunerasse o conteúdo das editoras, dos autores, de quem produz conteúdo, encontramos uma solução que abriu o leque. E desmontou, rompeu, de uma maneira positiva, a barreira da distribuição e do acesso. O Skeelo nasceu assim, e tem feito isso nos últimos quatro anos.

JC - O que isso representa para o leitor?

André Palme - Para o usuário, para o potencial leitor, o Skeelo é um serviço que está incluído dentro do plano de empresas parceiras, como um benefício, sem que se pague nada a mais por isso. Por ser cliente de empresas que são nossas parceiras, você tem direito ao Skeelo. E ter direito significa baixar o aplicativo do Skeelo, criar uma conta com seu e-mail, e uma senha, como em qualquer aplicativo que se vai usar, e aí passar a receber todo mês um livro, sem custo adicional nenhum.

JC – Como se dá a escolha dos livros?

André Palme - A gente sempre faz uma sugestão de título, e você tem uma janela do mês em que pode trocar esse título por outro, caso aquele conteúdo não agrade. O livro é o que a gente chama de posse definitiva, ou seja, quando você foi numa loja de operadora e contratou um plano com uma linha de celular, a operadora nos passa, e diz que há um usuário novo, para começar a entregar livro pra ele. Mesmo que você esteja na operadora há um ano, e descubra hoje que tem o Skeelo, e baixar o aplicativo, já tem 12 livros na sua estante esperando. Nesse caso, como não foi realizada a troca, você recebeu 12 títulos sugeridos por nós. Uma vez que baixa o aplicativo e passa a acessar, vem a opção de fazer a troca dos próximos. E vamos supor que daqui a três meses você quer mudar de operadora. Os livros que você recebeu durante esse benefício são seus para sempre. Você vai fazer a leitura deles através do Skeelo, mas estão na sua estante, são sempre seus. É diferente de um serviço de assinatura que você contrata, e enquanto você contrata tem conteúdo, e quando deixa de contratar, deixa de ter acesso.

JC – Qual foi a evolução do serviço, desde o início?

André Palme - Os últimos quatro anos foram uma jornada para que esses dois pilares melhorassem para os consumidores: a distribuição e o acesso. Passados 3 anos e meio, mais ou menos, no ano passado, entendemos que já tínhamos uma comunidade interessante de pessoas usando o aplicativo, descobrindo títulos, às vezes descobrindo o hábito da leitura, formando-se leitor. E que existia a possibilidade de expandir isso, que a gente chama de ecossistema, oferecendo mais coisas, relacionadas ao livro. Com o livro como uma espinha dorsal do que a gente oferece. Fizemos um primeiro movimento que é uma loja online para se comprar livros, e-books e audiobooks, e agora, recentemente, também livros físicos.

JC – Por que houve a expansão?

André Palme - Porque compreendemos que muita gente entra por esse benefício do Skeelo, de ter um livro por mês, e quer completar a estante com títulos que não estão ali, ou ler mais, efetivamente. Quer comprar um título a mais, um conteúdo adicional. A loja dispõe hoje de cerca de 140 mil títulos de e-books ou audiobooks, e em torno de 80 mil títulos de livros físicos. Desde novembro do ano passado, além de uma vitrine aberta e gigantesca para você escolher os seus títulos, podemos também fazer a curadoria de determinada categoria de livros para você, e entregar todo mês um livro específico. Que a gente chamou de clube do livro digital. Com exatamente a mesma mecânica de um clube do livro, só que ao invés de receber um título físico na sua casa todos os meses, você recebe um livro digital no aplicativo. E além deste livro, tem conteúdos extras que rodeiam esse conteúdo: um capítulo a mais, um vídeo do autor dizendo como foi escrever o livro, um capítulo extra em áudio, e coisas desse tipo. Inicialmente esse produto está disponível para o público juvenil, a categoria YA, que vem do TikTok. E lançamos no mês passado a mesma mecânica, mas voltado para a educação financeira com o Me Poupe!, a metodologia e a marca da Nathalia Arcuri. Uma autora conhecida, influenciadora digital e criadora de conteúdo. O Skeelo é, depois de 4 anos, um grande ecossistema de livro e leitor, que tem como principal missão facilitar o acesso à leitura através da tecnologia. O Skeelo tem sido uma ponte entre conteúdos e pessoas. Fazemos isso através de parceiros que nos permitem largas a grandes avenidas para distribuir esse conteúdo.

JC - Como é feita a renovação do acervo de oferta? Editoras pequenas podem ter seus livros no Skeelo?

André Palme - A proposta de conteúdo, no começo, foi sempre trazer os melhores livros. E melhores livros, para alguns, são os livros mais conhecidos... é igual a vinho: o melhor é aquele que você gosta de tomar, não necessariamente o mais famoso. Mas a proposta era o de trazer os best-sellers. Como trazer os livros que todo mundo conhece, e todo mundo possui o desejo de ler, numa solução que visa ampliar distribuição e acesso? Hoje, das maiores editoras do Brasil, em termos comerciais, que publicam os livros mais vendidos, os autores mais reconhecidos, não só para o público de literatura, mas para o público de uma maneira geral, das 15 maiores, 12 estão com a gente, de maneira exclusiva. No modelo B to B to C, que não é a venda direta para o consumidor, é a venda através de uma empresa, mas que atinge o consumidor final. Mas o catálogo apresenta um espectro bem aberto. Inclusive, no final do ano passado, quando começamos a operar com a loja, trouxemos plataformas que publicam autores no modelo de autopublicação. Contamos com editoras médias e estreantes. Quando a gente abriu esse leque do ecossistema, com mais ofertas, pôde contemplar mais editoras. Pra nós, nos interessa conteúdo de uma maneira geral, que tenha possibilidade de atingir o leitor. Há alguns cortes que pra gente são muito caros: qualquer conteúdo que promova homofobia, transfobia, racismo, discurso de ódio, não é o tipo de conteúdo que a gente prioriza na plataforma.

FERNANDO GENARO - Equipe do aplicativo Skeelo, reunida em evento da empresa

JC - Como o Skeelo se comporta no mercado editorial, como uma âncora digital?

André Palme - Até brinco dizendo que o Skeelo tem uma distribuição de TV aberta, estamos falando com todo mundo mesmo. Por isso tentamos ser o mais generalistas possível, para que cada um dentro da plataforma consiga fazer o seu mundo. Para uns vai ser romance, para outros, biografia, ou conteúdo de desenvolvimento pessoal, ou mais voltado para espiritualidade. Daí termos parcerias com as editoras as mais diversas, seja em tamanho, seja em linha editorial. O que importa é ajudar o mercado de uma maneira geral. A gente tem se mostrado ao mercado como um bom parceiro. Que trouxe para a mesa uma possibilidade de receita que não existia. O Skeelo é o líder nesse segmento. Precisamos muito dos conteúdos de qualidade, e os conteúdos de qualidade veem no Skeelo uma maneira de conseguir uma distribuição, e até uma vitrine diferente. Uma vitrine que pode ser difícil de outra maneira.

JC - Qualquer editora ou autor pode chegar e oferecer um livro para o Skeelo?

André Palme - As editoras, sim. Os autores, ainda não. Trabalhamos ainda diretamente com as editoras. Mas há empresas que fazem a ponte, não só conosco, mas com outros jogadores do mercado, para permitir essa distribuição. Dentro do ecossistema, em relação às editoras, procuramos receber todo mundo, e ver o que faz sentido para cada parte incluir na plataforma.

JC - Como tem sido o engajamento do leitor potencial, nesse universo das parcerias? E como o interesse no aplicativo cresceu?

André Palme - Temos um trabalho muito grande no dia a dia de acordar essas pessoas, fazer com que elas saibam do benefício, que já podem começar a ler livros todos os meses no celular delas. Ou ouvir livros. Fazemos isso através dos canais dentro do próprio aplicativo, de e-mail, dos canais de rede social. Somos um dos parceiros do Tik Tok no Brasil. O Skeelo é hoje a página mais seguida de leitura e literatura no Brasil. Todas as redes sociais são interessantes pra gente. Trabalhamos muito com os influenciadores e os criadores de conteúdo, vetores importantes para contar essa história, sobre o benefício disponível às pessoas. As editoras ajudam, porque elas também têm interesse em que os leitores venham. É bom lembrar que tudo começou com o e-book, o livro digital em texto para ser lido. Adicionamos, depois de um tempo, o audiobook, a opção de ouvir o conteúdo. Claro que nem todo o acervo está em todos os formatos, porque não é nem uma limitação nossa, mas uma questão do direito que as editoras possuem sobre determinado formato, e o quanto elas investem ou não. A gente até faz co-produção com editoras, para ajudar a ofertar mais acervo. Encontramos uma maneira de distribuir e de dar acesso. Agora, como é que a gente mostra que isso existe? É um trabalho de todos os dias.

JC – O que é o minibook?

André Palme - São conteúdos originais, que começamos a oferecer no ano passado. Não são resumos. Até tivemos um pouco de resumos no começo, todos autorizados pelas editoras, obviamente, porque se faz muito resumo sem respeito a direito autoral, e é uma coisa que a gente não faz aqui dentro. Mas criamos conteúdos seriados, curtos, que as pessoas podem ler ou ouvir, recebem todos os dias, com mais ou menos 10 a 15 minutos de duração. São conteúdos de ficção e de não-ficção.

JC – O que pode dizer sobre o mercado de audiobooks no Brasil, dentro do que vocês vêm ofertando, e como isso tem criado maior interesse do público?

André Palme - O audiobook é o formato sobre o qual mais se tem falado na indústria editorial, não só no Brasil. O curioso é ser um formato que não tem nada de novidade. Se a gente recordar a maneira como a raça humana transmite histórias e conhecimento, é o primeiro, como os anciões em volta das fogueiras. Muito antes da escrita e de qualquer mídia de massa. O que mudou muito nos últimos anos foi o digital. A possibilidade de distribuição e de consumo desse conteúdo. A chegada dos aplicativos, mais do que dos celulares, e da internet móvel, permitiu que o audiobook ganhasse um novo fôlego. Há mercados de audiobook consolidados, como os Estados Unidos ou a Alemanha, onde o audiobook foi da fita cassete para o CD, e agora chegou no aplicativo. Na maior feira da indústria editorial do mundo, em Frankfurt, é possível ver estandes de editoras de audiobook da Alemanha vendendo em CD até hoje! É um formato que, em alguns mercados, passou por todos os suportes.

JC – O que muda para o usuário, agora, no digital?

André Palme - Com os aplicativos de celulares, a possibilidade de consumo aumentou muito. Sempre digo que é o formato do enquanto: o tipo de conteúdo que se consome enquanto se está lavando louça, enquanto se está correndo. Com uma sinergia enorme com o dispositivo móvel. O audiobook para nós é estratégico. Por isso apoiamos as editoras para aumentarem o acervo delas.

JC – Qual a diferença do audiobook, para a editora?

André Palme - Em relação ao e-book, o custo de produção do audiobook é bem mais alto. O e-book no Brasil já virou uma commodity dentro da produção da editora. O mesmo conteúdo já vai para a impressão e para o e-book. O audiobook é um processo diferente. Mas temos feito testes e já lançamos um primeiro título com gravação de voz com inteligência artificial. Não é de modo nenhum uma tentativa de substituir o narrador e o artista que conta a história, mas uma maneira de acelerar catálogos que não vão chegar ao audiobook tão cedo, porque o investimento é tão alto que não vale a pena, se for feito de maneira tradicional.

JC – A vantagem é perceptível, para o mercado e para os consumidores?

André Palme - Os avanços tecnológicos colaboram para multiplicar o acervo disponível, e fazer com que se coloque mais conteúdo para as pessoas. Lançamos assim “A lei da atração”. Com uma redução de custo para mais ou menos um quinto, ou um quarto, do custo de uma produção tradicional de audiobook. Mas a qualidade boa ainda está restrita aos conteúdos de não-ficção. Ainda não vi caso de conteúdo de ficção com inteligência artificial. Porque há uma questão de ritmo, de entonação, de contar uma história, que exige mais refinamento da tecnologia. E na não-ficção não há personagens diferentes. Mas para mim, não é uma questão de “se”, mas de “quando” – não é se a gente vai poder produzir ficção com voz de inteligência artificial, é quando isso vai acontecer. Dois anos atrás, não achávamos que seria viável produzir audiobook com voz de inteligência artificial, e agora já estamos produzindo. É só uma questão de tempo.

JC – E o mercado de livros para escuta está pronto para crescer?

André Palme - O mercado de audiobook tem crescido, seja na quantidade de acervo disponível, seja na demanda de consumo. Os podcasts, de maneira colateral, ajudam na formação desse consumidor, porque é o consumidor mais próximo do audiobook, alguém que está disposto a ouvir uma história pelo celular, uma entrevista, algo que não é música. Há podcasts sendo chamados de storycast, ou dramacast, que no fim das contas é um audiobook – uma história mais longa sendo contada através do áudio.

JC – Como vocês participam no estímulo ao mercado editorial do lado de fora do digital? Participam ou promovem eventos literários?

André Palme - Sim. A gente não só faz todas as ações digitais, mas está presente em eventos literários físicos. Estivemos na Festa Literária Internacional de Paraty (Flip), no ano passado, na Bienal de São Paulo, patrocinamos alguns eventos e prêmios. Também vamos estar na Bienal do Rio, provavelmente não com participação própria, mas através de parceiros. Promovemos o mundo do livro, porque, apesar de sermos um player quase que exclusivamente digital, só agora começamos a ofertar livro físico também, mas entendemos que o mundo do livro é o nosso mundo. E nos interessa poder ajudar esse mundo, de uma maneira geral.

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