POR ROBERTA SOARES, DA COLUNA MOBILIDADE
Um dia depois de um acordo prevendo a reversão de todas as três mil demissões de motoristas, cobradores e fiscais de ônibus da Região Metropolitana do Recife ser homologado diante do Ministério Público do Trabalho (MPT), diversas denúncias de empresas que estariam descumprindo o combinado foram feitas pelo Sindicato dos Rodoviários. A categoria denunciou que algumas operadoras continuam convocando os trabalhadores para rescindir os contratos de trabalho. Além disso, não estariam chamando de volta aqueles demitidos nos dias 30 e 31/3 e, ainda, condicionando o recebimento de rendimentos à assinatura de um acordo extrajudicial de quitação do vínculo empregatício. As denúncias já estão sob análise do MPT.
Motoristas e cobradores demitidos que conversaram com a reportagem e enviaram áudios das negociações nas garagens das empresas de ônibus afirma que os empregadores insistem nas rescisões tendo como base o artigo 486 da CLT, que prevê que o governo federal pague o aviso prévio e os 20% de multa do FGTS sob a alegação de calamidade pública, como foi decretado no País devido à pandemia do coranvírus. Além disso, funcionários de algumas operadoras, ao chegar na empresa, foram informados que apenas receberiam o salário de março se assinassem a rescisão e um acordo extrajudicial como condicionante para ter liberados o FGTS e o seguro desemprego. Mas, de acordo com a análise jurídica dos advogados que defendem a categoria, a quitação do contrato de trabalho impede que o trabalhador faça questionamento judiciais, como pleitear valores rescisório que não foram pagos, como horas extras, aviso prévio, multa FGTS, entre outros.
Segundo o Sindicato dos Rodoviários, quem concordar com a demissão pelo Artigo 486 da CLT recebe apenas o saldo de salário pelos dias trabalhados, as férias e os valores do FGTS - aqueles depositados mês a mês na Caixa Ecônomica Federal referente a 8% do salário. E perde o aviso prévio indenizado e a toda a multa de 40% do FGTS. Nas denúncias, são citadas as empresas Cidade Alta, Itamaracá e Rodotur (que integram o Consórcio Conorte, tendo contratos licitados com o governo do Estado), Caxangá e Borborema – essas duas permissionárias (ou seja, sem contratos licitados). “Estamos analisando as denúncias e, ao mesmo tempo, esperando para que a situação de descumprimento do acordo se configure. A grande premissa da nossa exaustiva negociação foi a manutenção dos empregos. Não há lógica em as empresas fazerem uso da Medida Provisória 936, criada para preservar o emprego e a renda a partir do uso do seguro desemprego para ajudar os empregadores e, ao mesmo tempo, demitirem os trabalhadores. É um ato incongruente, contraditório, que só beneficia o empresário”, alerta o procurador do trabalhador José Laízio, que está à frente das negociações entre rodoviários e empresários de ônibus.
O MPT afirma que, se o descumprimento do acordo ficar caracterizado pelas empresas, consequências judiciais serão necessárias. “Porque ficará claro que as operadoras estarão abusando do direito que lhes cabe. Mas para isso precisamos saber quantas e quais empresas estão descumprindo. E confesso: será péssimo para as relações futuras. O dissídio da categoria será em julho e novas conversas serão necessárias. É um futuro muito ruim, muito escuro porque não haverá confiança entre as partes”, reforçou. Além disso, o MPT informou ter notificado o Sindicato das Empresas de Transporte de Passageiros de Pernambuco (Urbana-PE) para que informe, em até cinco dias, a relação de profissionais afastados. “Queremos saber a quantidade de demissões efetivadas, revertidas e de novos afastamentos”, disse o procurador. A Urbana-PE ainda não se posicionou oficialmente nem sobre o acordo nem sobre as denúncias.
ACORDO
A base do acordo firmado entre o Sindicato dos Rodoviários e a Urbana-PE, diante do MPT e do governo de Pernambuco, foi a MP 936, prevendo que os motoristas, cobradores e fiscais teriam a manutenção dos empregos, mas em compensação perderiam até 40% dos salários e reduziriam a jornada de trabalho em 70%. A MP criou o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda, prevendo redução de jornadas e salários do quadro de pessoal pelas empresas com a cobertura, pelo seguro-desemprego, de 25% a 75% do rendimento dos trabalhadores.
No caso dos cobradores de ônibus, a redução de salário acordada teria sido bem menor do que a dos motoristas: 3% apenas, garantindo o salário mínimo. Pelo que ficou acordado, todas as demissões estariam canceladas, inclusive daqueles profissionais que já assinaram as rescisões. Durante a negociação ainda foi acordado que a categoria terá estabilidade no emprego por três meses após o fim da pandemia do coronavírus e da validade da MP, que vigora até o mês de junho. Caso a situação não se resolva, com a vida e o transporte público voltando à normalidade, haverá uma redução salarial menor e escalonada para os rodoviários. O escalonamento será diferente para motoristas e cobradores e valerá de julho a setembro.
A partir de julho, quando acaba a MP e permanecendo a pandemia, a redução salarial se dará da seguinte forma para os motoristas: de no máximo 40% em julho, de até 30% em agosto e de até 20% em setembro. Já os cobradores terão descontos de até 30% em julho, 20% em agosto e 10% em setembro. Os salários da categoria atualmente são de R$ 2.343,93 para motoristas de ônibus, R$ 1.078,19 para cobradores e de R$ 1.515,72 para os fiscais.
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