A batalha que vem sendo travada entre rodoviários e empresários de ônibus há meses poderá ficar mais confusa, vindo a afetar ainda mais os passageiros que dependem do transporte público na Região Metropolitana do Recife em plena pandemia de covid-19. Parecer da Procuradoria Geral do Estado de Pernambuco (PGE) diz que a Lei Municipal n.º 18.761/2020, que proíbe motoristas de acumularem a função de cobrador nos ônibus da capital, é inconstitucional. Que não tem aplicabilidade às linhas metropolitanas e, nem mesmo, às linhas de ônibus do sistema municipal do Recife porque estas integram um sistema metropolitano. E mais: recomenda que o Estado provoque o Supremo Tribunal Federal (STF) para que ele se manifeste.
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“Entendemos que a Lei Municipal n.º 18.761/2020, oriunda do Município de Recife, se limita a disciplinar o “transporte público coletivo do Município do Recife ”, como tal entendido aquele delegado pelo próprio Município de Recife, não abarcando as linhas objeto de operação consorciada no bojo do CTM (Grande Recife Consórcio de Transporte Metropolitano), que ostenta a condição de empresa pública multifederativa”, diz na conclusão. E segue: “Diante dos fortes indícios de inconstitucionalidade da lei municipal em questão, sugere-se ao Gabinete da Procuradoria Geral do Estado que adote providências no sentido de provocar a manifestação do Supremo Tribunal Federal sobre a matéria”, finaliza. O parecer é o de nº 0476/2020 e foi solicitado pelo CTM logo após a sanção do prefeito do Recife, Geraldo Julio.
A análise da PGE se fundamenta no fato de que o transporte público de passageiros da RMR é um serviço de natureza intermunicipal, com condições operacionais, tarifárias e físicas metropolitanas. “Em respeito às competências constitucionalmente estabelecidas, que fixa a competência legislativa municipal em razão dos interesses locais (art. 30, I, da Constituição Federal), natural que uma lei do Município de Recife não deve ter impacto em uma operação que envolve, a bem da verdade, uma região metropolitana, muito além das fronteiras do próprio município”.
E segue: “Se o município possui competência constitucional para legislar sobre questões apenas locais, é óbvio que uma operação de transporte público de passageiros, via operação consorciada, responsável até mesmo pela concessão do serviço público, não pode ser impactada por lei do Município de Recife, que tem como campo de abrangência o território do próprio município”. Para concluir: “Nesse sentido, a rigor, não se tem hipótese de “ transporte público coletivo do Município do Recife ”, senão um transporte intermunicipal que transita por dentro de Recife” .
CONFIRA O PARECER DA PGE NA ÍNTEGRA:
DIREITO DO TRABALHO
No parecer, a PGE também identifica que a lei municipal extrapola competências ao tratar do direito do trabalho, restrito à União. E novamente recomenda a provocação do STF. “Há fortes indícios de que a lei em questão tenha invadido competência legislativa da União (art. 22, I, da Constituição Federal), caso se entenda que o tema tratado é de Direito do trabalho, reclamando a provocação do Supremo Tribunal Federal (STF) para deliberar sobre o tema”.
Sobre o artigo da lei que prevê punições para as empresas que descomprirem a legislação, mais uma vez a PGE desconstrói o texto. “Além disso, a mesma lei municipal disciplina nova forma de extinção da concessão/permissão, ao prever a possibilidade de “cassação” em virtude do descumprimento do dispositivo, além de estabelecer também como penalidade a “impossibilitadas de participar de processo licitatório de serviços de transporte público coletivo municipal ”, o que pode configurar norma geral de Licitações e Contratação, cuja competência legislativa cabe privativamente à União (art. 22, XXVII, da Constituição Federal)”.
EFEITOS NA PRÁTICA
A reportagem não sabe dizer, entretanto, qual o impacto real do parecer na decisão do CTM, já que o documento é datado do dia 1º de dezembro e, mesmo assim, o governo de Pernambuco vem garantindo, via CTM, que irá cumprir a fiscalização nas linhas que circulam nos limites da capital. É tanto que, como avisado pelos rodoviários, a categoria conseguiu impedir, na manhã desta quarta-feira, a saída dos ônibus sem cobradores das garagens de pelo menos três empresas das 11 que operam o sistema. Duas delas, completamente, como foi o caso da Caxangá e da Metropolitana, que atendem não só o Recife, mas também cidades da RMR.
POSICIONAMENTO DO CTM
“O Grande Recife Consórcio de Transporte vem perseguindo o cumprimento da Portaria 167/ 2020, que proíbe a dupla função do motorista no Sistema de Transporte Público de Passageiros na Região Metropolitana do Recife. O Consórcio já havia notificado, desde a última sexta-feira (04.12), todas as empresas operadoras para o cumprimento da Lei Municipal 18.761/2020. Inclusive fiscalizando e autuando linhas municipais que circulam sem a presença do cobrador.
Em paralelo a essas ações, o Sindicato das Empresas de Transportes de Passageiros de Pernambuco (Urbana-PE) enviou ofício questionando a abrangência da Lei Municipal 18.761/2020 e da Portaria 167/ 2020, e informando da impossibilidade de cumprir as determinações no prazo estipulado. De imediato, o Consórcio consultou a Procuradoria Geral do Estado de Pernambuco (PGE), que proferiu parecer quanto à inaplicabilidade da lei municipal do Recife no âmbito do sistema metropolitano gerido pelo Consórcio.
Como o assunto foi objeto de audiência de mediação e conciliação junto ao Tribunal Regional do Trabalho e ao Ministério Público do Trabalho, a Secretaria de Desenvolvimento Urbano e Habitação (Seduh) e o Grande Recife Consórcio têm procurado o diálogo com os sindicatos para alcançar um entendimento em comum, e irá informar o TRT sobre as dificuldades enfrentadas”.
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