O que muda com o novo Código de Trânsito Brasileiro a partir desta segunda-feira
Na avaliação de especialistas, há pontos positivos, mas muitos negativos, que vão incentivar o motorista infrator
A partir desta segunda-feira (12/4), passam a vigorar novas mudanças no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) que vão afetar a todos que compõem o trânsito: motoristas, passageiros, pedestres e ciclistas. E que vão impactar, principalmente, no futuro da segurança viária brasileira. Na avaliação de especialistas, há mudanças para melhor, mas também existem muitas que deixam claro que a vida não foi prioridade.
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Alterações que incentivarão o motorista infrator e, como consequência, provocarão ainda mais colisões, mortes e mutilações de motoristas, motociclistas e pedestres. E defendem que essa conta chegará em poucos anos, talvez dois, um, ou até menos tempo. E para toda a sociedade. Lembrando que o trânsito brasileiro provoca a morte de 30 a 35 mil pessoas e mutilações em outras 250 mil por ano, além de gerar um custo alto: R$ 132 milhões ao ano e R$ 1,5 trilhão em onze anos, segundo levantamento recente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).
Há avanços nas mudanças, sem dúvida, mas o entendimento é de que os retrocessos são maiores. Principalmente no aspecto da qualificação do motorista e na caracterização das infrações. As principais críticas à Lei 14.071/2020, que alterou o CTB, recaem sobre a duplicação da pontuação para a perda da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) pelo motorista infrator, que passou de 20 pontos para até 40 pontos escalonadas, e do período para renovação do documento, ampliado de cinco anos para dez anos para os condutores com até 50 anos. A visão dos especialistas é de que a flexibilização atendeu às pressões políticas e que, no intuito de buscar a redução do custo e a desburocratização para retirar e renovar a CNH, o Brasil deu dez passos para trás, indo de encontro às medidas de segurança viária adotadas no mundo - que a cada ano amplia a fiscalização das vias e o controle sobre os motoristas. O entendimento é que o País está reduzindo a qualidade da avaliação de capacidade do condutor brasileiro.
“A mensagem final para toda sociedade brasileira é que essas alterações do CTB ainda estão muito distantes do cenário ideal para redução da tragédia nas ruas, estradas e rodovias. O trânsito precisa ser visto como uma questão de saúde pública. Precisamos de uma legislação atuante, de uma Justiça que puna e, principalmente, de medidas estruturais, modernização de nossas vias, adaptação de pontos já conhecidos e marcados pelo número de eventos de trânsito. É uma luta diária para que o trânsito seja entendido de maneira multidisciplinar. Hoje, gasta-se 3% do nosso PIB com o custeio da violência do trânsito. São gastos imediatos superiores a R$ 50 bilhões por ano. Quando consideramos o período entre o evento de trânsito até a possível alta da vítima, são mais de R$ 220 bilhões. Dinheiro que poderia estar sendo investido na saúde e na geração de emprego, por exemplo”,alerta o médico Alysson Coimbra, diretor da Associação Mineira de Medicina do Tráfego (Ammetra).
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Entre os pontos positivos, o fim da possibilidade de sentenças alternativas. A partir do dia 12 de abril, os motoristas que estiverem dirigindo embriagados e provocarem crimes de homicídio e lesão corporal sem intenção (culposos) ao volante não poderão mais ter a pena de prisão substituída por sentenças alternativas (como trabalhos voluntários e pagamento de cestas básicas). As mudanças relacionadas ao uso das cadeirinhas também é outro aspecto elogiado. A nova lei ampliou a obrigatoriedade do uso do equipamento para crianças de até dez anos de idade que não tenham atingido 1,45 metro de altura. Elas deverão ser obrigatoriamente transportadas no banco traseiro em assento de elevação e utilizando o cinto de segurança.
“Essa conta chegará e será em breve. Dez anos para renovação de uma habilitação? 40 pontos para suspensão de uma carteira? De 3% a 5% da população habilitada é de infratores contumazes. Apenas. Essas mudanças foram promovidas para atender a essa pequena parcela. Enquanto isso, toda a sociedade pagará, com vidas e financeiramente, pela flexibilização. Já temos uma imensa dificuldade de fiscalização nas nossas estradas e avenidas. 60% das UTIs do Brasil são ocupadas pelas vítimas do trânsito. É preciso lembrar disso”, afirma Sílvio Médici, presidente da Associação Brasileira das Empresas de Engenharia de Tráfego (Abeetrans).
MÉDICO DO TRÁFEGO
A liberação da realização dos exames de aptidão física e mental para retirada e renovação da CNH por qualquer especialidade médica e, não mais, restrita aos médicos e psicólogos peritos examinadores, com titulação de especialista em medicina do tráfego e em psicologia do trânsito, era um dos pontos extremamente criticados também. Mas a Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet) conseguiu trabalhar nos bastidores junto ao Congresso Nacional e reverter a situação.
Na época da aprovação das alterações do CTB, o Congresso Nacional manteve a restrição, mas o presidente Jair Bolsonaro vetou o trecho do PL. Foi quando a Abramet entrou em cena no início de 2021 e conseguiu que o Congresso derrubasse o veto do presidente, fazendo valer a restrição.
CICLISTAS
Outro ponto positivo das novas alterações do CTB está relacionado aos ciclistas. As alterações permitem que os usuários da bicicleta tenham mais protagonismo nas ruas e avenidas diante dos veículos motorizados. Ao punir com mais rigor os motoristas infratores, garante mais segurança para quem pedala. A mudança mais importante se refere à obrigatoriedade, por parte dos carros, de reduzir a velocidade ao ultrapassar um ciclista de forma compatível com a segurança do trânsito. A partir de segunda-feira (12), essa infração deixa de ser grave e passa a ser gravíssima, punida com 7 pontos na CNH e multa de R$ 293,47.
Também passa a ser proibido parar ou estacionar o carro em ciclovia ou ciclofaixa. Antes, não havia punição. Agora, será infração grave, com multa de R$ 195,23 e 5 pontos na CNH. Lembrando que, quando não houver ciclovia, ciclofaixa ou acostamento na via, as bicicletas têm preferência sobre os automóveis.
NÚMEROS DO TRÂNSITO
O Brasil é o terceiro País no mundo com mais mortes no trânsito, segundo o mais recente estudo da Organização Mundial de Saúde (OMS). Em dez anos, o País saiu da marca de 44.553 mil mortos no trânsito em 2011 para 30.371 mil mortos em 2019, segundo dados do DataSus). O Brasil fecha a Década de Ação pela Segurança no Trânsito, um desafio lançado em 2011 pela Organização das Nações Unidas (ONU), sem alcançar a meta de redução em 50% das mortes no trânsito. Houve queda, mas de apenas 30%.
“Atualmente, o Brasil é o terceiro País no mundo com mais mortes no trânsito, segundo o mais recente estudo da OMS. Diante deste cenário, a grande maioria das novas alterações do CTB em nada contribuem para ampliar a segurança viária. Ao contrário, reduzem e flexibilizam a efetividade da fiscalização e punição para quem descumpre as regras. Uma série de estudos internacionais demonstraram que um sistema de pontuação rígido e eficaz é uma das principais ferramentas para a efetividade da fiscalização do trânsito. É o caso da Espanha, Itália, Austrália e Noruega. Eles deixaram claro que o aumento de pontos caminha na contramão de todo padrão mundial. Esses países, que já têm uma pontuação inferior a do Brasil, têm reduzido ainda mais. Além de tudo isso, as alterações foram feitas sem discussão com a sociedade e votadas de forma remota, no meio de uma pandemia”, diz Rafael Calabria, coordenador do Programa de Mobilidade Urbana do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec).
CONFIRA AS PRINCIPAIS MUDANÇAS DO CTB
VALIDADE CNH
Passa a ser de 10 anos para condutores com até 50 anos de idade. Atualmente, é preciso refazer os exames a cada cinco anos. A renovação a cada três, hoje obrigatória para motoristas acima de 65 anos, passa a ser exigida apenas a quem tem mais de 70. Para pessoas entre 50 e 70 anos, a exigência é a cada cinco anos.
SUSPENSÃO DA CNH
Foi criado um dispositivo que estabelece uma gradação de 20, 30 ou 40 pontos em 12 meses conforme haja infrações gravíssimas ou não. Atualmente, a suspensão ocorre com 20 pontos, independentemente do tipo de infração. Dessa forma, o condutor será suspenso com 20 pontos se tiver cometido duas ou mais infrações gravíssimas; com 30 pontos se tiver uma infração gravíssima; e com 40 pontos se não tiver cometido infração gravíssima no período de 12 meses.
TRANSPORTE REMUNERADO E ESCOLAR
As mesmas regras de duplicação da validade da CNH e da pontuação para suspensão do direito de dirigir valem para os motoristas que exercem atividade remunerada, inclusive no transporte de passageiros, como os condutores de aplicativos, táxis e ônibus. E, ainda, para os condutores de transporte escolar.
USO DA CADEIRINHA
A nova lei também obriga o uso da cadeirinha para crianças de até dez anos de idade que não tenham atingido 1,45 m de altura. Elas deverão ser transportadas no banco de trás dos veículos.
CADASTRO DE MOTORISTAS
O projeto cria o registro positivo de motoristas, com a intenção de cadastrar os condutores que não tiverem cometido infração de trânsito sujeita a pontuação nos últimos 12 meses.
MULTAS
Com as mudanças, passa a ser obrigatória a substituição de multas leves ou médias por advertência para infrator que não cometeu nenhuma outra infração nos últimos 12 meses. Antes, isso era apenas recomendado e o condutor tinha que solicitar.
SENTENÇAS ALTERNATIVAS
A partir de 12 de abril, está proibida a conversão de penas de reclusão (privativa de liberdade) por penas alternativas como serviços comunitários ou doações de cestas básicas. As mudanças atingem os motoristas que estiverem dirigindo embriagados e forem responsáveis por crimes de homicídio e lesão corporal, principalmente.
CICLISTAS
A mudança mais importante se refere à obrigatoriedade, por parte dos carros, de reduzir a velocidade ao ultrapassar um ciclista de forma compatível com a segurança do trânsito. A partir de segunda-feira (12), essa infração deixa de ser grave e passa a ser gravíssima, punida com 7 pontos na CNH e multa de R$ 293,47. Também passa a ser proibido parar ou estacionar o carro em ciclovia ou ciclofaixa. Antes, não havia punição. Agora, será infração grave, com multa de R$ 195,23 e 5 pontos na CNH.
MÉDICO DO TRÁFEGO
A realização dos exames de aptidão física e mental para retirada e renovação da CNH não seria mais restrita aos médicos e psicólogos peritos examinadores, com titulação de especialista em medicina do tráfego e em psicologia do trânsito. Ou seja, qualquer médico, de qualquer especialidade, poderia realizar o exame. Mas a mudança foi derrubada pelo Congresso Nacional, após articulação da Abramet.
USO DOS FARÓIS
Os faróis que anteriormente eram obrigatórios em rodovias federais, agora serão necessários somente em casos de rodovias fora do perímetro urbano durante a luz do dia e também sob neblina, chuva, cerração e em rodovias de pistas simples.
TRANSPORTE DE CRIANÇAS EM MOTOCICLETAS
O transporte de crianças por motocicleta só poderá ser realizado se a criança for maior de 10 anos e tiver condições de cuidar da própria segurança.
EXAME TOXICOLÓGICO
A exigência é para condutores com carteiras das categorias C, D e E fazerem o exame toxicológico para obtenção ou renovação da CNH e a cada dois anos e meio. Os motoristas com menos de 70 anos precisarão fazer novo exame depois de dois anos e meio da renovação. Anteriormente, a regra era para quem tem 65 anos ou mais, repetir o exame depois de um ano e meio. Essa periodicidade passa a ser exigida agora com 70 anos ou mais.
RECALL
O documento do carro que possuir qualquer tipo de recall não poderá ter o licenciamento retirado, em casos de algum recall pendente há dois anos ou mais.
ÁREAS DE ESPERA
A nova lei determina a adoção de áreas de espera para motocicletas próximo aos semáforos, à frente da linha de retenção dos outros veículos, e muda o nível da infração cometida por motoqueiros que trafegarem com faróis apagados para gravíssimas.
“A mensagem final para toda sociedade brasileira é que essas alterações do CTB ainda estão muito distantes do cenário ideal para redução da tragédia nas ruas, estradas e rodovias. O trâns
alerta o médico Alysson Coimbra, diretor da Associação Mineira de Medicina do Tráfego (Ammetra).