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MULTA CELULAR AO VOLANTE: infração poderá ter o valor duplicado no Brasil

A multa para uma das infrações de trânsito que mais crescem no País e que representa muito perigo para a segurança viária, o uso do celular ao volante, poderá ter o valor aumentado. Na verdade, duplicado

Roberta Soares
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Roberta Soares
Publicado em 23/11/2022 às 13:05 | Atualizado em 23/11/2022 às 13:08
Marcelo Camargo/Agência Brasil
Atualmente, pelo Código de Trânsito Brasileiro (CTB), o uso do celular ao dirigir não é previsto como crime de trânsito, mas é classificado como uma infração administrativa gravíssima - FOTO: Marcelo Camargo/Agência Brasil
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A senadora Maria do Carmo Alves (PP-SE) apresentou um projeto de lei (PL 2699/2022) para dobrar o valor da multa para quem for pego usando o telefone celular ao volante. Vale destacar que o uso de celular na direção já é a terceira maior causa de mortes no trânsito no Brasil, ficando atrás apenas do excesso de velocidade e da embriaguez ao volante.

Essas são as razões que fundamentam a proposta da senadora. Segundo levantamento da Associação Brasileira de Medicina do Tráfego (Abramet), pelo menos 675 brasileiros se arriscam todos os dias ao utilizar o aparelho enquanto dirigem.

Essa é a média de autuações diárias, o que significa que, a cada hora, 28 condutores negligenciaram a atenção ao volante. Também de acordo com a Abramet, os riscos de se envolver em sinistros de trânsito aumentam em até 400% quando se manuseiam mensagens de texto e sobem em até 23 vezes quando elas são digitadas.

Celular ao volante: uso é a terceira causa de mortes no trânsito do Brasil

Saiba os riscos de manusear o celular ao volante

VALOR DA MULTA

Atualmente, pelo Código de Trânsito Brasileiro (CTB), o uso do celular ao dirigir não é previsto como crime de trânsito, mas é classificado como uma infração administrativa gravíssima, que prevê multa no valor de R$ 293,47 e sete pontos na Carteira Nacional de Habilitação (CNH) do motorista.

“Consideramos que o valor da multa pelo uso do celular não atende à função pretendida de dissuadir o comportamento que se mostrou nos últimos anos tão recorrente e mais perigoso ainda do que se podia imaginar quando o uso de celular não era tão disseminado como hoje. Por esses motivos, propomos a aplicação de fator multiplicador 2 (dois) no valor da multa base aplicada para a categoria gravíssima de infrações”, justifica a senadora.

USAR CELULAR É COMO ANDAR CEM METROS ÀS CEGAS

Para se ter ideia do perigo que representa o uso do celular ao volante, diretrizes da Abramet apontam que o ato de digitar uma mensagem de texto enquanto se dirige faz com que o veículo seja conduzido por diversos metros sem o olhar atento do condutor, que chega a ficar, em média, 4,5 segundos sem prestar atenção na via.

Esse “lapso” pode ser catastrófico no trânsito. Dependendo da velocidade, o motorista poderá percorrer até 100 metros absolutamente desatento, tempo e distâncias suficientes para atropelar pedestres, ciclistas e colidir com outros veículos.

“Enviar mensagens pelo WhatsApp, conduzindo um veículo a 80 km/h, equivale a estar dirigindo com os olhos vendados por um percurso nas dimensões de um campo de futebol oficial”, alerta o médico do tráfego Alysson Coimbra, diretor científico da Associação Mineira de Medicina do Tráfego (Ammetra) e integrante da Abramet.

Acredita?

E tem mais: o risco segue mesmo depois que a atividade ao celular foi finalizada. “Uma conversa no telefone celular mantém atividade mental direcionada à chamada mesmo após o término da ligação, permanecendo o risco de sinistro de trânsito em média de três segundos após o envio de uma mensagem de texto. Se o veículo estiver em velocidade média de 100km/h, percorrerá mais de 90 metros sob o efeito pós chamada”, alerta a Abramet.

Thiago Lucas/ Artes JC
Celular e direção - Thiago Lucas/ Artes JC

Segundo as diretrizes da Abramet, o cérebro tem capacidade finita de disponibilizar neurônios para atividades que exigem atenção, não somando áreas cerebrais à utilizada isoladamente quando duas ou mais tarefas são exigidas. “A audição, a compreensão do que é dito e a fala, são condições que alteram a atividade cerebral quando realizadas em conjunto com a condução de veículos automotores. Uma ou mais tarefas em execução concomitante serão parcialmente negligenciadas pelo cérebro”, segue o alerta.

A FALHA DE ATENÇÃO E O PERIGO EM NÚMEROS

Todo o problema do uso do smartphone ao volante passa pela FAC (falhas de atenção ao conduzir). Segundo a Abramet, a média de sinistros fatais provocados por elas é de 14%.

Uma avaliação realizada em parceria com o Instituto de Ortopedia do Hospital das Clínicas de São Paulo (IOT) , no autódromo de Interlagos, comprovou a relação. Os voluntários com o telefone celular na mão, realizaram guinadas bruscas no volante e curvas exageradas na execução de manobras simples para percorrer uma fileira de cones.

Conduzindo a 90 km/h, os voluntários reduziram a velocidade para 60 km/h durante uma conversa pelo celular e quase pararam na pista quando enviavam mensagens. Nos testes com barreiras de cones, só desviaram em cima da hora, demonstrando o quanto é difícil dirigir com a atenção dividida, principalmente quando precisam decidir rapidamente para evitar um sinistro de trânsito (não é mais acidente de trânsito que se diz. Entenda).

O uso do smartphone na direção de um veículo também é mais comum entre jovens, numa faixa etária inferior a 30 anos. E são as mulheres, em comparação com os homens, as mais propensas a se envolver em sinistros de trânsito ao dirigir distraídas. A dependência dos smartphones se tornou tão grande que, segundo a Abramet, um estudo de sinistros de trânsito nos EUA apontou que motoristas jovens relataram acessar sites enquanto dirigem e se sentirem “perdidos e desconfortáveis” sem o telefone celular.

ÁLCOOL É ERRADO, MAS CELULAR NÃO

Outro dado relacionado ao uso de celular na direção impressiona. A maioria dos motoristas minimiza os perigos de manusear o smartphone. Condena o hábito de dirigir alcoolizado, mas releva o de mandar mensagens de texto ao volante. 70% dos motoristas acreditam que direção e telefone celular não combinam, mas somente 20% se privam da combinação.
O Brasil nunca calculou o estrago do celular ao volante na prática - aliás, a ausência de estatísticas de sinistralidade no trânsito é, talvez, a maior dívida do poder público com o brasileiro nesse setor -, mas o mundo já. E os números assustam.

Na Espanha, a Diretoria Nacional de Tráfego (DGT) estima que 59% dos motoristas editam textos durante a direção veicular e as falhas de atenção ao conduzir são responsáveis por 35% dos sinistros fatais.

Também de acordo com a Abramet, um estudo publicado na revista New England Journal of Medicine concluiu que as falhas de atenção ao conduzir pelo uso do telefone celular quadruplicam o risco de ocorrer uma colisão durante chamadas breves, taxa equivalente ao prejuízo causado pelo consumo de bebidas alcoólicas dentro do limite legalmente estabelecido.

A troca de mensagens eleva vertiginosamente os riscos de envolvimento em sinistros de trânsito quando se checa mensagens de texto (400%) e quando elas são digitadas (23%).

LEGISLAÇÃO MAIS RIGOROSA, MAS AINDA SEM RESULTADOS

O uso descontrolado do celular ao volante é um problema que tem crescido muito com os serviços de delivery e de transporte por aplicativo, como Uber e 99. Nem mesmo a alteração da legislação, em 2016, ampliando a punição para quem segura ou manuseia os aparelhos enquanto dirige - até então o CTB citava apenas o uso, algo que poucas pessoas fazem atualmente -, tem conseguido inibir o hábito.

PERNAMBUCO

Os números de Pernambuco confirmam a constatação de que o celular ao volante é um perigo. Dados do Detran-PE mostram que o uso e/ou manuseio do celular oscila entre a 4ª e a 6ª infrações mais cometidas no Estado pelo menos entre 2019 e 2022.

E que o crescimento ainda predomina. É, em média, de 30% ano após ano. Entre 2016 e parte do mês de maio de 2022, foram 458.713 registros de notificações. Com destaque para o salto a partir de 2017, o primeiro ano após a alteração do CTB: de 5.589 para 65.698 notificações.

AUTUAÇÕES EM PE

Pelo uso de celular (somando as três infrações diferentes: usar, segurar ou manusear)

2016 - 5.589 atuações
2017 - 65.698 atuações
2018 - 83.890 atuações
2019 - 106.670 atuações
2020 - 105.488 atuações
2021 - 68.876 atuações
2022 - 22.502 atuações (*)

(*) Até primeiros dias de maio


NO BRASIL

Em 2021 - 246.438 infrações de trânsito por uso de celular

Equivale a 28 pessoas multadas a cada hora usando o dispositivo enquanto dirigem

Mais de um terço (37%) das multas foi registrado no Estado de São Paulo

O uso do smartphone é a terceira causa de mortes no trânsito do País, ficando atrás apenas do uso de álcool e do excesso de velocidade

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