Porque o racismo não se combate com inúteis notas de repúdio

Leia a coluna Política em Brasília
Romoaldo de Souza
Publicado em 22/05/2023 às 19:30
Vinícius Júnior Foto: AFP


O governo brasileiro acertou uma. Ao menos no anúncio, acertou! O Ministério da Igualdade Racial pulou das notas de repúdio - que, em geral, não dão em absolutamente nada - para acionar o Ministério Público da Espanha contra “La Liga”, como é conhecida a Primeira Divisão da Liga de Futebol Profissional. Essa interpelação judicial foi anunciada ontem pela ministra Anielle Franco, em denúncia a um caso de racismo contra o jogador Vinícius Júnior, do Real Madrid, no jogo contra o Valencia. A partida chegou a ser interrompida no estádio Mestalla, após gritos da torcida chamando o atleta brasileiro de “mono”. Macaco, em espanhol.

“Notificar e oficializar também, para que tenha resposta. Porque o histórico da La Liga não é bom, mas bem racista. Ontem mesmo, o próprio presidente [de La Liga] quis colocar o Vini como sendo culpado por ter vivido o racismo. Estamos aqui em conjunto com o governo, com muita seriedade e afinco. Quando a gente começou a pegar o histórico da La Liga, a gente viu que casos como esse já haviam ocorrido, e a La Liga não se posicionou. É inadmissível que o presidente culpe o Vinícius. Com o governo da Espanha, a gente vai, através do Ministério Público, notificar para que seja investigada La Liga e outros vários casos”, antecipou Anielle Franco.

O Ministério das Relações Exteriores tomou a medida diplomática que está ao alcance das relações internacionais. A embaixadora Mar Fernándes-Palacios conversou por telefone com a chefe da divisão de Europa e América do Norte, no Itamaraty. Maria Luisa Escorel ligou para a espanhola explicitando a posição brasileira de repúdio aos atos racistas contra o jogador brasileiro e perguntando que medidas o governo espanhol vai tomar. Já o ministro da Justiça, Flávio Dino, que tem dito que como juiz nunca teve sentença anulada, agora afirma que pode recorrer ao “princípio da extraterritorialidade”. Ou seja, em casos “excepcionais” usar a legislação brasileira para punir um crime previsto no país.

“O Código Penal prevê que, em algumas situações excepcionais, é possível que, no caso de crimes contra brasileiros, mesmo no exterior, haja a aplicação da lei brasileira. Esse é um remédio extremo, claro, mas pode funcionar, pode ser necessário”, disse o ministro da Justiça. De acordo com Flávio Dino “não é algo que iremos fazer imediatamente”, mas se a pressão diplomática não surtir efeito, essa alternativa “poderá ser usada.”

No Brasil real, de menos visibilidade que as disputas internacionais, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) recentemente atualizou o seu Regulamento Geral de Competições com “possiblidade de punição esportiva de um clube em caso de racismo”. “Para nós, a luta contra o racismo tem pressa. Medidas vêm sendo discutidas há séculos e nunca colocadas em prática. A CBF está fazendo a sua parte. Decidimos avançar ainda mais nas punições e podemos tirar até pontos de um clube em uma das nossas competições”, afirmou Ednaldo Rodrigues, presidente da CBF. Chegou a hora de uma corrente de atitudes do Estado e dos cidadãos contra o racismo no futebol, na escola, no trabalho, dentro do ônibus. Basta!

 

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