O Presídio Advogado Brito Alves, onde está o padre Airton Freire de Lima, fundador da Fundação Terra, tem uma superlotação de 161%. Apesar disso, o religioso está em uma cela isolada por estar sendo investigado por estupro.
No presídio, que fica localizado no município de Arcoverde, no Sertão de Pernambuco, há 1.183 presos, segundo dados atualizados no final da semana passada. A capacidade, no entanto, é de até 452 pessoas privadas de liberdade.
Padre Airton Freire foi preso preventivamente na última sexta-feira (14). De acordo com o Ministério Público de Pernambuco (MPPE), cinco inquéritos estão em andamento, mas o número de possíveis vítimas em cada um deles não foi revelado.
Em nota divulgada no sábado, a Secretaria Executiva de Ressocialização (Seres) reforçou que o padre Airton Freire está numa cela separada dos outros presos "dada a natureza da conduta investigada pela Polícia Civil".
O procedimento, de fato, é comum no sistema prisional com o objetivo de garantir a integridade das pessoas suspeitas de abusos sexuais, porque se tratam de crimes que geram revolta e ameaças até dos próprios presos.
A Polícia Civil de Pernambuco continua as buscas para cumprir dois mandados de prisão preventiva contra funcionários do padre Airton Freire.
Um dos suspeitos é o motorista Jailson Leonardo da Silva, também denunciado à polícia por suposto estupro da personal stylist Sílvia Tavares de Souza, de 53 anos.
O crime, segundo a mulher, teria sido praticado durante um retiro espiritual na Fundação Terra em agosto de 2022.
Em entrevista à TV Jornal, ela disse que mantinha uma relação próxima com o padre e o tinha como uma figura paterna e santa. Mas que a admiração deu lugar ao pavor após ser violentada pelo motorista a mando do padre, que teria presenciado tudo enquanto se masturbava.
Na ocasião, ela teria sido chamada pelo religioso para realizar uma massagem. "Quando pulei da cama, o motorista colocou a faca no meu pescoço, me deu uma gravata e disse 'quieta que ninguém vai morrer'", disse a mulher.
Após o início dessa investigação, outras passaram a ser apuradas pela Polícia Civil, com acompanhamento do MPPE. Por determinação da Procuradoria-Geral de Justiça foi criada uma força-tarefa formada por três promotores para atuar no caso.
Em nota, o MPPE disse que tem feito "exame criterioso dos elementos de prova até então colhidos". E que está "preocupado principalmente com os direitos humanos e com as medidas necessárias para resguardar e evitar revitimizações das vítimas que buscaram o aparato estatal para relatarem violências sexuais que estão sob investigação".
O MPPE reforçou também que a prisão preventiva "mostra-se necessária para garantir a continuidade do trabalho investigativo; afastar os riscos de reiteração delitiva; bem como assegurar proteção às vítimas que procuraram o Estado para relatarem fatos criminosos contra suas dignidades sexuais".
Por fim, declarou que "por se tratarem de inquéritos sigilosos, não serão divulgadas, no momento, mais informações sobre o caso".
Desde o final do mês de maio deste ano, padre Airton Freire estava suspenso das atividades religiosas, após publicação de decreto da Diocese de Pesqueira.
O documento assinado pelo bispo que comanda a Diocese, Dom José Luiz Ferreira Salles, determinou a suspensão do "Uso de Ordem", ou seja, a proibição de que o padre Airton presida publicamente ritos religiosos (sacramentos). A exceção é para celebrações eucarísticas privadas com até três fiéis.
O decreto pontuou que a decisão foi tomada "considerando advertências anteriores e a gravidade dos fatos atualmente denunciados com investigação na esfera estatal e eclesiástica em andamento". Além disso, citou o cumprimento do dever, "para o bem da Igreja com a finalidade de prevenir os escândalos e garantir o curso da justiça".
O documento ainda destacou que a medida é válida a partir da publicação e notificação do padre até o término do procedimento penal. E que o não cumprimento das medidas pode significar desobediência e pode implicar em outras medidas canônicas.
Uma nota oficial foi divulgada pelos advogados Mariana Carvalho e Marcelo leal, responsáveis pela defesa do padre Airton Freire. Confira o texto na íntegra:
Surpreendeu a defesa do padre Airton Freire a decisão de decretar a prisão preventiva do sacerdote. O feito é totalmente contrário às condições previstas em lei e será tratado em habeas corpus a ser impetrado pela defesa. Importante lembrar que o padre, um homem de 67 anos, sofre sérias restrições de saúde.
A decisão ignora que o padre havia se afastado das funções eclesiásticas e da presidência da Fundação Terra, onde desenvolve um trabalho social que atendeu milhares de pessoas nos últimos 40 anos. Depois do afastamento, ficou isolado em sua residência — que é fixa, onde ele pode ser encontrado a qualquer momento —, de forma a não interferir nas investigações.
Apesar de todo o apoio que tem recebido de milhares de pessoas na internet e em manifestações públicas nas ruas de Arcoverde (PE), o padre jamais estimulou ou insuflou movimentos, de modo a não causar comoção social ou desordem pública. E mais: agiu de boa fé ao concordar em se apresentar espontaneamente à Justiça após a decretação da prisão, sem criar mecanismos de retardamento do cumprimento da ordem legal.