INVESTIGAÇÃO

Justiça determina nova reprodução de simulada da morte de adolescente em ação policial no Recife

Pedido foi feito pela defesa dos PMs acusados pelo homicídio duplamente qualificado de Victor Kawan Souza da Silva, de 17 anos, em dezembro de 2021

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Raphael Guerra

Publicado em 21/06/2024 às 7:00

A Justiça determinou que seja realizada uma nova reprodução simulada da perseguição policial que resultou na morte do adolescente Victor Kawan Souza da Silva, de 17 anos, no bairro de Sítio dos Pintos, Zona Norte do Recife, em 11 de dezembro de 2021. O pedido foi feito pela defesa dos policiais militares, José Monteiro Maciel de Lima e Clezya Patrícia de Souza Silva, réus por homicídio duplamente qualificado (motivo torpe e sem chance de defesa da vítima). Ainda não há data para a perícia. 

A decisão foi tomada durante audiência de instrução e julgamento realizada, na última terça-feira (18), na 2ª Vara do Tribunal do Júri da Capital. Na ocasião, foi colhido o depoimento do delegado responsável pela investigação, Ricardo Bavaresco Bongiolo, do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). O interrogatório dos réus ainda será agendado, após o resultado da reprodução simulada. 

De acordo com o Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE), foram abertas vistas para as partes (defesa e acusação) formularem quesitos que irão conduzir a referida reprodução, que ficará sob a responsabilidade do Instituto de Criminalística de Pernambuco.

O advogado Ulisses Dornelas Júnior, responsável pela defesa dos cabos da PM, o pedido da nova reprodução simulada foi feito na primeira manifestação no início do processo. Uma reprodução chegou a ser feita ainda na fase da investigação policial, mas sem a presença dos réus.

"Não houve comunicação efetiva aos policiais militares, por isso eles não estavam presentes. A dinâmica da reprodução simulada só levou em consideração os personagens ouvidos, por isso solicitamos uma nova", afirmou. 

Segundo testemunhas, Victor e um amigo andavam de moto quando passaram a ser seguidos pela viatura policial. Houve uma perseguição e, pouco depois, o adolescente, que estava na garupa, foi baleado. Ele chegou a ser levado para uma UPA, mas já estava morto.

Os policiais militares alegaram que o tiro foi disparado porque, durante a tentativa de abordagem, os garotos teriam reagido. Victor estaria sem capacete. Além disso, na época, a PM afirmou que um revólver calibre 38 com seis munições havia sido apreendido. Testemunhas negaram a versão da polícia.

Em denúncia enviada à Justiça, em outubro de 2022, o Ministério Público afirmou que os acusados teriam fraudado provas, inclusive simulado que o adolescente estivesse armado e que o corpo dele foi retirado da cena do crime, a pretexto de socorrê-lo, inviabilizando a realização de perícia. Exames do Instituto de Medicina Legal (IML) apontaram que a vítima morreu rapidamente.

Os PMs foram denunciados pelo homicídio e também por tentativa de homicídio, já que Victor estava acompanhado de um amigo, que acabou não sendo atingido. Na ocasião, a pedido do Ministério Público, a Justiça também determinou a prisão dos PMs. Atualmente, porém, eles respondem ao processo em liberdade

DEFESA QUESTIONA DENÚNCIA DO MPPE

Na denúncia do Ministério Público, há a informação de que os PMs afirmaram que cada um teria deflagrado dois tiros no momento da perseguição à moto. No entanto, testemunhas relataram cerca de dez disparos. Em um vídeo, anexado aos autos, também é possível ouvir o barulho. Além disso, a vítima foi atingida nas costas - um indicativo de que não houve reação, como alegaram os policiais. 

A defesa contesta. "Em nenhum momento deste processo, a não ser na denúncia, há a informação de que houve dez tiros. A partir de um vídeo, cuja captação de áudio foi submetida a análise, os peritos concluíram que não é possível identificar a fonte dos estampidos e nem confirmar ter sido ou não disparos. E ainda, sendo disparos, quem teria sido o autor", argumentou o advogado Ulisses Dornelas Júnior.

"A moto conduzida pelo adolescente estava com o escape modificado. Outro ponto: ele estava armado. Não houve implante de arma. Dizer que houve implante, contando com a colaboração de outros policiais, é leviano. A denúncia se baseia em relato de familiares. Na audiência, o delegado mencionou não ter havido qualquer elemento que desse suporte a essa fala", pontuou.

O advogado disse que não iria detalhar as teses que serão apresentadas pela defesa, mas reforçou que os PMs são inocentes. "A narrativa da denúncia do Ministério Público é contrária ao que está nos autos do processo."

ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO NEGA QUE ADOLESCENTE EFETUOU TIROS

A advogada Marília Falcão, que representa a família de Victor Kawan, reforçou que em nenhum momento o adolescente estava armado durante a perseguição policial.

"Ele não havia disparado nenhum tiro de arma de fogo. Não havia portado arma, diferente da narrativa construída desde o inquérito. São elementos que indicam uma fraude processual, tanto em relação à arma como da cena do crime. Há fortes indícios de um homicídio qualificado, inclusive de forma muito desproporcional, porque o adolescente não praticava crimes e não estava em fuga", disse a assistente de acusação. 

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