Diz o famoso frevo de Luiz Bandeira: "É de fazer chorar/ quando o dia amanhece e obriga/ o frevo a acabar". A reclamação da canção é para a "Quarta-Feira Ingrata", responsável por anunciar o fim do ciclo do Carnaval. Mas em 2021, se trocarmos o trecho "o dia amanhece e" por "a pandemia", o lamento fica tão forte quanto.
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Com o Carnaval suspenso no Estado e em várias partes do Brasil devido à pandemia do novo coronavírus, o sentimento de muitos é de tristeza e saudade. Em vias normais, neste sábado (6) por exemplo, estaríamos na expectativa pelo Baile Municipal do Recife, que simboliza a abertura das prévias para o período carnavalesco. E para os artistas, que faziam essa folia acontecer, o lamento vai além das canções.
"É um sentimento de perda por estar longe dos amigos, dos músicos, dos palcos e dos foliões", resume o cantor, compositor e Patrimônio Vivo de Pernambuco J. Michiles, de 77 anos. "É muito triste para muitos cantores, muitas orquestras e músicos. O Carnaval vai, realmente, fazer falta. É lamentável essa pausa, mas temos que respeitar as condições sanitárias da cidade e do Estado", reflete o cantor Claudionor Germano, 88 anos, também Patrimônio Vivo do Estado.
A carnavalesca Léa Lucas, com seus recém-completados 92 anos, também sente a suspensão da festa: "É triste, né? Porque eu amo o Carnaval! Eu brinco todo ano no Galo da Madrugada. Também brincava no Bloco das Ilusões. E já que não vai ter esse ano, temos que esperar o ano que vem, não é? É o jeito. Vai ficar na saudade".
O Maestro Forró, 46 anos, comentou o quão inédito é ficar sem a folia das ruas. "É uma coisa superinusitada, inesperada. Acho que nenhum ser humano vivo nessa geração atual se imaginou passar por isso. O primeiro sentimento é o de impacto dentro da nossa alma. Na cadeia produtiva da música, das artes em geral, principalmente daqueles que trabalham com aglomeração, multidões, gera primeiro uma profunda tristeza, melancolia. Mas, ao mesmo tempo, gera uma oportunidade da gente se reinventar, não jogar a toalha. É o caso de nos perguntarmos: O que eu posso fazer diante disso?", questiona.
Se o Carnaval não vai às ruas este ano, o que resta é ficar com as boas lembranças desta festa tão característica do nosso Estado. "Minha melhor lembrança de Carnaval, sem sombra de dúvida, foi da alegria que tive quando ouvi pela primeira vez a minha voz em Boneca, um frevo-canção que gravei na Fábrica de Discos Rozenblit, em 1953. A primeira de 478 canções que tenho gravadas", relembra Claudionor Germano.
"Minha melhor lembrança é do Galo do Madrugada. Eu gosto muito! Porque sempre vou na frente, nos carros alegóricos, onde sempre danço bastante. Brinco muito, o tempo todo! As pessoas sempre ficam admiradas. Também sinto falta do Bloco das Ilusões, do Bal Masqué, onde ganhei muitos prêmios nos concursos de máscara, do Baile Municipal também", recorda Léa Lucas.
"Tenho lembrança de todos os Carnavais que já passei, principalmente aquele de 35 anos atrás, em 1986, com o 'estouro' de Bom Demais, na interpretação de Alceu Valença, quando meu nome passou a ser destaque na cena carnavalesca", relata J. Michiles.
"Ontem, por exemplo, fez cinco anos exatos — também numa sexta-feira — que fui um dos homenageados do Carnaval do Recife. Ontem seria a abertura, onde recebi amigos no palco, amigos e parceiros, como Lenine, Chico César, Luiza Possi, Otto, Johnny Hooker, Elba Ramalho... E ainda entrei de tirolesa, tocando trompete, cantando e voando pelo Carnaval do Recife, saindo de um prédio de 28 metros de altura", rememora Maestro Forró, cheio de saudade.
E AGORA?
Munidos de tantas lembranças, o que será que esses artistas farão nesse período sem Carnaval? "Não sei ainda se vou ficar por aqui. Mas, caso fique, posso tentar brincar na rua e voltar para casa", responde Léa Lucas, aos risos.
"Eu prefiro aguardar a melhora do povo, com a saúde do povo preservada, e pensar em brincar novamente no ano que vem. Estamos de castigo há muito tempo, mas essa doença não é brincadeira não", completa Claudionor Germano.
"Estarei participando de algumas lives, em comentários históricos musicais, relembrando meus sucessos, no lamento desse Carnaval sem multidão", avisa J. Michiles.
Já Maestro Forró dá deixa: "No sábado dia 13, à noite, vou participar de uma live, ao vivo, do Galo da Madrugada, seguindo todos os protocolos. Eu sou uma das atrações. Temos uma live pronta, um show pronto, para ser lançado em algum dia do Carnaval, mas estamos buscando patrocínio público e privado ainda".
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