"O Brasil tem não apenas o dever, mas o direito de conhecer com intimidade a obra de Tereza Costa Rêgo". A frase do crítico de arte e curador Marcus Lontra, registrada em nova publicação sobre a prestigiada artista plástica pernambucana (1929-2020), pode condensar bastante o objetivo das iniciativas que chegam ao público nesta quinta-feira (20). São elas: o lançamento do livro "A Liberdade em Vermelho" (Cepe Editora), organizado pela neta Joana Rozowykwiat com o artista plástico Raul Córdula, e a inauguração da exposição "Viva Tereza, Tereza Viva", com curadoria de Bruno Albertim e Marcus Lontra.
Ambos os eventos ocorrem no Espaço Cultural Cícero Dias, do Museu do Estado de Pernambuco (Mepe), Zona Norte do Recife, a partir das 19h. Os projetos são desejos antigos da artista que, apesar de bastante conhecida em Pernambuco, ainda merece mais visibilidade nacional por suas contribuições à arte moderna brasileira. Ela acompanhou de perto a movimentação regionalista do Nordeste com pinturas figurativas que abordavam questões sociais, sobretudo ligadas à opressão sofrida pelas mulheres, além do seu marcante engajamento político.
Livro contempla a obra
"Tereza Costa Rêgo - A Liberdade em Vermelho" reúne fotografias de suas criações e textos inéditos assinados por destacados críticos, curadores e artistas do país: Raimundo Carrero, João Câmara, Clarissa Diniz, Marcus Lontra, Bruno Albertim, Denise Mattar, Cida Pedrosa e Ana Mae Barbosa. Foram convidadas personalidades com olhares distintos.
"Fomos procurados pela Cepe com pouco tempo do falecimento dela, então o processo de luto ainda estava muito presente e o livro acabou tendo um processo igualmente intenso", diz a jornalista e escritora Joana Rozowykwiat, neta que assinou o projeto curatorial. Ela diz que apesar da existência do livro "Tereza Costa Rêgo - Uma Mulher em Três Tempos"(Cepe, 2018), de Bruno Albertim, ainda faltava uma publicação sobre a obra.
"O Raul Córdula já tinha sido curador de várias exposições dela, então iniciamos um trabalho de pesquisar onde estavam essas obras. Descobrimos telas de quando ela era bastante novinha, alguns trabalhos voltados para a academia. Traçamos o caminho que ela fez até ter a sua obra conhecida, passando pelo exílio em Paris, quando ela assinou como Joana", continua.
Desde a morte da artista, em 2019, a família da artista tem sentido uma responsabilidade maior de atuar como guardiã desse legado. "Tereza Costa Rêgo é uma artista muito reconhecida em Pernambuco, mas carece de reconhecimento no resto do país", ressalta Rozowykwiat. "Esperamos que os atuais lançamentos instiguem mais pesquisas, indo além da preservação e chegando na divulgação. Em 2019, morreu uma pessoa. A obra do artista não morreu. Queremos que, quando se fale em arte no Brasil, se fale em Tereza."
Exposição quer rodar pelo Brasil
A exposição Viva Tereza, Tereza Viva" reúne quase 50 obras de destaque em diferentes períodos, ocupando do hall às três galerias do 1º andar. A mostra é realizada pela Cepe, Secretaria de Cultura de Pernambuco (Secult-PE/ Fundarpe) e Mepe. A ideia é que o projeto se torne itinerante.
A presença de Marcus Lontra da co-curadoria é, inclusive, um passo para uma maior nacionalização da obra de Costa Rego. Ele foi diretor da Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio de Janeiro, sendo curador da mostra "Como Vai Você, Geração 80?" (1984), um marco da arte brasileira que trouxe nomes como Daniel Senise, Beatriz Milhazes, Luiz Pizarro, entre outros.
"Tereza é um gênio. Ela é a maior mulher da arte moderna de Pernambuco e uma das mais contundentes do Brasil no século 20, mas ainda desconhecida fora de suas fronteiras. Então esse seria um esforço inicial nesse sentido, atendendo ao seu desejo mais íntimo", sintetiza o co-curador Bruno Albertim.
São telas de grande dimensão, a exemplo da série "7 Dias de Sangue", em que a artista retrata sete momentos de violências presentes na formação do Brasil. É dessa série a famosa "Lua Pátria", em que a nação é representada por uma mulher despida numa mesa com figurões da República e ratazanas em volta. Mulheres nuas, inclusive, aparecem em sua obra com tom político.
"Como filha da aristocracia canavieira pernambucana, ela viveu de perto a violência a musculatura do patriarcado. Em determinados momentos da sua vida, ela se rebela e passa a pintar mulheres despedidas. São suas naturezas políticas, porque são de deliberação", continua o Albertim.
"São obras que contam a sua história. Podemos dizer que Tereza viu o século 20 se construir diante de si. Ela contribuiu para o estabelecimento de uma estética moderna de Pernambuco, já que começou a pintar no começo do século e morreu com 90 anos”, finaliza o jornalista, que em fevereiro lançará pela Cepe o livro "Modernismo Pernambucano".
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