Getúlio Cavalcanti comemora 80 anos de vida e 60 de frevo com disco e livro
Homenageado do 2º Concurso Nordestino de Frevo da Fundação Joaquim Nabuco, compositor lançará livro de sonetos e seu primeiro álbum de samba
Reconhecido como compositor de clássicos do Carnaval, como Último Regresso, Getúlio Cavalcanti andava "para cima e para baixo" em Camutanga, município pernambucano na fronteira com a Paraíba, com um violão nos braços. Era um jovem seresteiro. Ao chegar ao Recife para estudar, em 1957, rapidamente foi contaminado pelo micróbio do frevo: "Evocação nº 1", de Nelson Ferreira, estava estourada nas rádios. Você Gostou de Mim, seu primeiro frevo, entrou num disco da Rozenblit em 1962.
Sessenta anos passaram desde a primeira gravação, uma marca que chegou junto aos seus 80 anos de vida, celebrados no último 10 de fevereiro. Mesmo sem a realização da grande festa, Cavalcanti comemora as efemérides com homenagens e lançamentos.
Ontem, a Fundação Joaquim Nabuco anunciou que o compositor é o homenageado do 2º Concurso Nordestino de Frevo. Na primeira edição do evento, que reverenciou Maestro Duda, Cavalcanti mostrou sua atemporalidade ao vencer o primeiro lugar na categoria Frevo de Bloco com a composição Fantasia.
"Dizem que a luta já foi um tamborim/ São Jorge, um bumba meu boi no céu sem fim/ As nuvens de algodão doce/ Tão bom que fosse, meu amor gostar de mim". Esses foram os primeiros versos de Fantasia que surgiram na mente de Getúlio. "Eu estava desfilando com o Bloco da Saudade na Rua do Bom Jesus e veio um estalo. Foi em cima dele que fiz a música", diz o artista, em entrevista ao JC.
"Se eu soubesse que os meus 80 anos seriam tão celebrados, eu tinha feito 80 há dez anos", brinca o cantor, bem-humorado. É que o mote do aniversário também acabou sendo acompanhado por outros projetos: o livro Entre Sonetos, Cantigas e Cordel, que sairá pela editora Novo Estilo, e o disco O Samba Pernambucano de Getúlio Cavalcanti, o seu primeiro com esse ritmo. Ambos os lançamentos serão num evento em 26 de março, com um pocket show na Casa Estação da Luz, em Olinda.
"Escrevi o meu primeiro livro quando completei 40 anos de carreira, o 'Por que os Blocos Cantam', que saiu pela Vitali, uma das editorias mais antigas do Brasil. Noventa por cento das minhas músicas estão editadas lá. Recentemente, fiz um poema e mostrei para José Paulo Cavalcanti, que hoje é imortal da Academia Brasileira de Letras, e ele opinou que eu deveria escrever sonetos. Esse é um tipo de poesia muito difícil e que eu levava jeito", conta Getúlio.
Com prefácio de José Paulo Cavalcanti Filho, o livro reúne 30 sonetos e 65 composições, que, segundo ele próprio, "não deixam de ser poesias". O projeto ainda conta com um cordel em homenagem a Manoel Francisco dos Santos, o Garrincha. "É uma homenagem a uma figura que teve seus transtornos e não soube gerenciá-los. É um trabalho mais sociológico sobre um homem que admirei muito."
Já o samba sempre esteve presente na sua carreira, mas com algumas faixas esporádicas em alguns dos seus 15 discos. Ele convidou Jorge Simas, especialista em violão de 7 cordas, para o projeto, que tem patrocínio da Chesf. Também faz um dueto com a sua filha, Alessandra Nilo, em Responda por Mim. "Eu sempre compus samba e gosto muito. Um deles agradou muito o pessoal do Bloco de Samba A Turma do Saberé, do bairro de São José, que fará uma homenagem a mim assim que possível. A música chama-se 'Meu Sabaré'."
Neste ano, o primeiro frevo gravado em estúdio, Borboleta Não É Ave, completa 100 anos. Ao comentar a efeméride, Getúlio se recorda de Nelson Ferreira, que compôs esse frevo com J.B Diniz. "Foi ele quem me deu a mão. Eu devo muito a ele. Comecei a ajudar no coral da fábrica de discos Rozenblit, todos os Carnavais eu participei fazendo parte do coral. Nelson foi um gênio, um dos maiores arranjadores que conheci. Figura pura."
História no frevo
Ao chegar ao Recife, Getúlio teve o seu primeiro emprego de carteira assinada como cantor profissional da TV Rádio Clube, uma filial da TV Tupi em Pernambuco que fechou em 1980. "Nelson Ferreira mandou um recado para mim através do Claudionor Germano, dizendo que tinha interesse em ouvir o frevo que eu tinha. Eu vi naquilo a única oportunidade, pois gravar aqui era muito difícil. Só existia gravadora no eixo Rio-São Paulo, então só dava se eu entrasse na história do frevo. Eu consegui e me animei. José Menezes, Aldemar Paiva, Gildo Branco, Gildo Moreno, Edgar Moraes. Tive a honra de viver com todos eles."
Getúlio teve algumas pausas na carreira, como entre 1963 e 1965. Depois, entre 1966 e 1975. O seu retorno após esse segundo hiato foi com O Bom Sebatião, homenagem ao compositor Sebastião Lopes (1905/1974), que venceu um concurso promovido pela TV Jornal. Após isso, iniciou uma fase de grandes frevos de bloco, a exemplo do clássico Último Regresso, cuja composição continua viva na mente daqueles que relembram carnavais cada vez mais saudosos.