SÃO JOÃO 2022

São João do Recife: Quadrilhas juninas ficam endividadas com suspensão; investimentos chegam a R$ 150 mil

Lideranças das quadrilhas juninas estão preocupadas com a falta de confirmação da realização da festa em 2022

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Emannuel Bento

Publicado em 31/05/2022 às 15:43 | Atualizado em 01/06/2022 às 11:03
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Representantes e lideranças das quadrilhas juninas do Recife estão preocupados com a suspensão do Ciclo Junino do Recife de 2022, anunciado pelo prefeito João Campos nesta segunda-feira (31). Horas depois, o prefeito comentou sobre realizar os festejos no segundo semestre. Até o momento, enchentes e deslizamentos já causaram 106 mortos em todo o Estado de Pernambuco.

Entrevistados pelo JC afirmam que a decisão foi tomada sem diálogo com o Conselho Municipal de Cultura ou com a Comissão Especial da Câmara do Recife para o Carnaval e São João. Agora, eles se perguntam como irão pagar os custos já investidos nas apresentações - já que, até então, a verba proveniente de polos e editais iriam suprir algumas demandas.

De acordo com as fontes ouvidas, quadrilhas maiores como Alumiar, Dona Matuta, Tradição, Origem Nordestinas e Evolução gastam, em média, R$ 130 mil em investimentos para apresentações. Esse dinheiro começa sendo pago pelos membros e depois acrescentando por cachês de polos dos municípios, premiações de concursos e pela subvenção da Prefeitura do Recife.

Em nota enviada ao JC nesta terça-feira (31), a Prefeitura do Recife afirmou que "em um momento mais oportuno, irá debater com toda a cadeia cultural produtiva do ciclo junino caminhos para assegurar a salvaguarda das manifestações e brinquedos populares, além do fomento à renda de todos os profissionais envolvidos no ciclo".

"Por ora, estão sendo estudadas alternativas de calendário para programações e concursos de quadrilhas, incluindo caminhos para a retomada dos pagamentos das subvenções às agremiações, que já haviam sido iniciados", continua a nota.

Além do Recife, pelo menos quatro cidades de Pernambuco já cancelaram ou suspenderam os festejos juninos com o intuito de direcionar os recursos que seriam utilizados no São João para as vítimas das chuvas no Estado. São elas: Paulista (festa 'Vamos Paulistar'), Araçoiaba, Vicência e Paudalho - dessas, a única que tem quadrilhas é Paudalho.

Expectativa frustrada

ANDREA REGO BARROS/PCR
SÃO JOÃO DO RECIFE 2022 Quadrilha Junina Zé Matuto, vencedora do concurso de 2014 - ANDREA REGO BARROS/PCR

"O movimento já está enfraquecido porque foram dois anos sem ter a festa. As quadrilhas investiram pesado para voltar. Nos reunimos em fevereiro para pensar como seria esse retorno", diz Roberto Carlos Gomes, responsável pela Gama Produções, que produz mais de 52 quadrilhas em Pernambuco - sendo 22 no Recife.

"Após a pandemia, muitos componentes sequer queriam dançar mais. Então tivemos um grande problema para recuperar. Quando a Prefeitura do Recife abriu um concurso, isso incentivou as pessoas. Nós só íamos fazer algumas mostras, espetáculos pequenos, mas a própria Prefeitura anunciou o concurso para competir", continua.

Os editais de subvenção junina para as quadrilhas e de atrações artísticas para o São João de 2022 foram publicados no Diário Oficial em abril e já tiveram os seus resultados divulgados.

"Alguns grupos já receberam a subvenção, outros não. As adultas recebem R$ 16,6 mil e as infanto-juvenis em torno de R$ 12 mil. De toda forma, muito investimento já foi feito e já está tudo adiantado", diz o produtor cultural.

Roberto Carlos Gomes diz que, nos bastidores das quadrilhas, não existe tanta esperança de que a programação seja retomada ainda neste ano, já que o investimento de R$ 15 milhões foi destinado às ações que vão ajudar às vítimas das chuvas, de acordo com a gestão municipal.

"Se não tem recurso, não tem como fazer. O Carnaval também foi 'suspenso' em 2022 e até hoje não ocorreu. Ainda temos que lembrar que teremos eleições, o que inviabiliza festas nas ruas", opina.

"A cidade do Recife já teve muitas tragédias como esta, mas nunca deixamos de ter a festa. Não é que vamos normalizar as mortes, mas isso só vai piorar a situação de quem investiu: quadrilhas, bandas, artistas em geral. É uma falta de compromisso, pois aumenta ainda mais a vulnerabilidade dos artistas que foram afetados pela tragédia".

Grupos temem endividamento

DIEGO NIGRO/ACERVO JC IMAGEM
2018 Concurso de Quadrilhas Juninas, no Sítio da Trindade, Recife - DIEGO NIGRO/ACERVO JC IMAGEM

Fábio Andrade é diretor da quadrilha Lumiar, uma das que mais investe no período junino, diz que o grupo recebeu a suspensão com perplexidade. "Temos consciência do que aconteceu na cidade, temos esse problema há décadas pois o inverno é intenso. Mas entra gestão, sai gestão, e as coisas são empurradas com a barriga".

Ele explica que um grupo como o Lumiar costuma gastar com tecidos, costureira, serralheiro, cachês de músicos que vão para o estúdio e transporte. "Estamos todos com as mãos na cabeça", resume o produtor.

"Fizemos um São João de menor proporção pelo tempo que ele foi liberado. Chegamos a gastar R$ 150 mil, no mínimo. O valor é dividido entre os membros, sendo que muitos usaram cartões de crédito. Até o momento, quando não confirmam a realização, alguns de nós estamos endividados", diz.

"Nos preparamos para fazer os polos, pois as atividades geradas em paralelos, como eventos particulares, são poucas. O que nos sustenta são as atividades criadas pela Prefeitura, nos polos que dançamos e com o edital das subvenções", reforça.

O que diz a Prefeitura do Recife

Procurada pela reportagem na segunda-feira (31), a comunicação da Prefeitura do Recife, através da Secretaria de Cultura do Recife, esclareceu que, "diante da mais grave tragédia climática que se abateu sobre a capital pernambucana na última metade do século, entende que não há qualquer espírito de confraternização que justifique a realização do ciclo junino neste momento, motivo pelo qual suspendeu, momentaneamente, qualquer promoção de eventos públicos municipais característicos da época".

"A gestão assegura ainda que, em um momento mais oportuno, irá debater com toda a cadeia cultural produtiva do ciclo junino caminhos para assegurar a salvaguarda das manifestações e brinquedos populares, além do fomento à renda de todos os profissionais envolvidos no ciclo. Por ora, estão sendo estudadas alternativas de calendário para programações e concursos de quadrilhas, incluindo caminhos para a retomada dos pagamentos das subvenções às agremiações, que já haviam sido iniciados", continua.

"A Cultura é considerada retrato de seu povo e prioridade na gestão, que se tornou uma das primeiras capitais do país a estabelecer um Auxílio Emergencial destinado à classe artística ainda no Carnaval de 2021, repetindo o benefício no São João e ampliando no que foi possível a liberação de editais para fomento à cadeia cultural, além de criar o mecanismo de Patrimônios Vivos", finaliza.

Câmara sugere festa a partir do Dia de São Pedro

Parlamentares da Câmara Municipal do Recife têm se movimentado para encontrar soluções para a suspensão do Ciclo Junino do Recife 2022. O vereador Marco Aurélio Filho (PTRB), presidente da Comissão Especial da Câmara do Recife para o Carnaval e São João, propôs em decisão coletiva que a programação do São João seja realizada a partir do dia 29 de junho, Dia de São Pedro.

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