TETO DE GASTOS: Tesouro propõe nova regra fiscal para substituir o modelo em vigor desde Temer

Nova proposta, escrita por oito técnicos, permite o crescimento das despesas do governo acima da inflação
Marília Banholzer
Publicado em 14/11/2022 às 22:43
VERBAS Desde que entrou em vigor em 2017, o teto de gastos já foi furado várias vezes pelo governo federal Foto: MARCELLO CASAL JR./ AGÊNCIA BRASIL


Com Agência Estado

O Tesouro Nacional concluiu nesta segunda-feira (14) o desenho de uma reforma que cria uma nova regra para substituir o atual modelo de teto de gastos. A nova proposta, escrita por oito técnicos, permite o crescimento das despesas do governo acima da inflação de acordo com o nível e a trajetória da dívida pública. A regra prevê ainda um bônus quando houver superávit primário, ou seja, as contas públicas ficarem no azul.

A proposta, que começou a ser escrita antes das eleições e foi antecipada pelo Estadão, é divulgada no momento de transição para mandato do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que prometeu na campanha revogar o teto de gastos - regra constitucional que limita o crescimento das despesas à variação da inflação.

O Tesouro escolheu como referência a dívida líquida do governo geral - que, em setembro, estava em 59% do PIB. O ponto central da proposta é: quanto maior o nível de dívida pública, menor será a taxa de crescimento real (acima da inflação) das despesas No cenário mais favorável, os gastos do governo federal poderiam crescer até 2,5% acima da inflação. Esse patamar, porém, está condicionado a um cenário com dívida abaixo de 45% do PIB, em trajetória decrescente e mediante esforço para aumentar a arrecadação e fazer bons resultados primários para evitar uma farra de expansão de despesas.

Com a dívida líquida acima de 55% do PIB - como agora, por exemplo -, haveria possibilidade de um crescimento real de 0,5% ao ano das despesas no caso de o endividamento público estar em trajetória de queda. Se a dívida estiver em alta, não poderia haver crescimento real das despesas.

Para um patamar da dívida entre 45% e 55% do PIB, o crescimento real da despesa poderia ser de 0,5% (com alta da dívida) ou de 1% (com redução da dívida). Para dívidas abaixo de 45% do PIB, seria permitido crescimento real da despesa de 1% ou de 2% ao ano.

'BONIFICAÇÃO'

Além desses cenários, o modelo prevê uma "bonificação" no limite de crescimento da despesa de 0,5%. O bônus seria concedido quando o resultado primário (receitas menos despesas, exceto o pagamento dos juros da dívida pública) das contas do governo for positivo e se encontrar em trajetória ascendente ou acima de um determinado patamar. Se a meta fiscal não for cumprida, o Ministério da Economia teria de dar explicações, como ocorre com o Banco Central no sistema de metas de inflação. O custo, porém, é reputacional: não haveria punição aos gestores.

A reforma estabelece que a meta de resultado primário se transforme num mecanismo de incentivo para manutenção do esforço de arrecadação. Ela perderia sua configuração atual, na qual há contingenciamento (bloqueio) de despesas no Orçamento para seu cumprimento ou sanção em caso de descumprimento.

O arcabouço conta também com gatilhos, que têm o objetivo de reduzir o ritmo de crescimento das despesas obrigatórias. Gatilhos são medidas adotadas pelo governo para conter a aceleração dos gastos.

A regra prevê ainda cláusulas de escape - saídas para gastar mais em caso de cenários econômicos adversos, como a pandemia da covid-19 e a guerra da Ucrânia, sem que seja preciso alterar a Constituição para suspender as regras em vigor.

Na proposta dos técnicos do Tesouro, há previsão para que o crescimento real da despesa seja fixado a cada dois anos. O objetivo, segundo o estudo, é dar maior previsibilidade e capacidade de planejamento à política fiscal em comparação à fixação por apenas um exercício, além de dar mais estabilidade para a execução das despesas no médio prazo, em especial dos investimentos.

MERCADO

O Ibovespa conseguiu sustentar alta na segunda etapa do pregão desta véspera de feriado. Em dia de liquidez contida, o mercado acionário se guiou pela melhora de seus pares em Nova York em boa parte do dia, mas reagiu forte a ruídos durante a sessão marcada por compasso de espera sobre o teor da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) da Transição, que deve ser anunciada na próxima quarta-feira.

Informações de que a equipe de transição do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva, cogita uma saída menos pesada do teto para gastos sociais podem ter ajudado o Ibovespa a escalar aos 114 mil pontos uma hora e meia antes do fechamento.

Também à tarde, o vice-presidente eleito, Geraldo Alckmin, anunciou que o grupo de trabalho da Infraestrutura do novo governo contará com nomes como o do mestre em economia e ex-presidente do Banco Fator Gabriel Galípolo, da ex-ministra do Planejamento durante o governo Dilma Rousseff Miriam Belchior, e do ex-ministro-chefe da Secretaria Nacional dos Portos do Brasil Maurício Muniz.

Rodrigo Moliterno, head de renda variável da Veedha Investimentos, ressalta que o mercado está em um momento positivo com o Brasil já tendo feito o aperto monetário necessário para conter a inflação. "Uma hora o mercado cobra o preço da fatura sobre o fiscal, como vimos a semana passada", disse.

No cenário externo, praticamente dado, com aperto monetário nos Estados Unidos precificado. Mas os olhares também se voltam para China, uma vez que mudanças na política covid zero já impactaram a cotação do minério de ferro e, por sua vez, as ações de Vale e mineradoras por aqui. A Vale saiu de uma cotação em torno de R$ 70, semana passada, para perto de R$ 84 durante o dia, fechando em alta de 1,23% a R$ 83,31.

O alívio se sobrepôs à cautela pré-feriado no mercado local de câmbio, que seguiu acompanhando no detalhe as negociações entre o governo eleito e o Congresso para ampliação de gastos em 2023. Relatos de uma proposta mais conservadora para a PEC da Transição fizeram com que o dólar terminasse o dia abaixo de R$ 5,30, menor marca de fechamento desde a quarta-feira passada, dia 9.

O dólar à vista encerrou o dia aos R$ 5,2998, desvalorização de 0,64%. No segmento futuro, a moeda para dezembro recuou 0,25%, aos R$ 5,3595, com giro financeiro de quase US$ 12,5 bilhões.

 

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