Com informações do Estadão Conteúdo
Uma possível derrota do atual presidente da Turquia, Recep Tayyip Erdogan, nas eleições deste domingo (14), darão ao país a chace de voltar ao caminho democrático. Mas, inda que issi ocorra, a orientação geopolítica da Turquia ainda está se redesenhando. A expectativa é que os parceiros ocidentais ajudem a Turquia pós-Erdogan a seguir uma nova direção.
Recep Tayyip Erdogan está no poder desde 2003. Isso quer dizer que um terço dos jovens recém-saídos da adolescência nunca conheceram outro presidente. Ao longo de 20 anos no poder, as eleições deste domingo representam a maior ameaça das últimas décadas ao novo sultão da Turquia.
O adversário de Erdogan nas eleições, Kemal Kilicdaroglu, prometeu restabelecer o estado de direito nos seus primeiros dias como presidente, caso seja eleito e assuma ao poder. É um argumento poderoso do atual líder do Partido Republicano do Povo (CHP). Para conquistar a vitóri ele conta com uma ampla coalizão de seis partidos, que se comprometeu a libertar os presos injustamente pelo Partido da Justiça e Desenvolvimento (AKP) de Erdogan e a suspender as restrições às principais liberdades.
Kilicdaroglu também prometeu reparar a autonomia de várias instituições que foram pressionadas pelo governo de Erdogan, incluindo o Judiciário. As promessas do adversário se alinham ao compromisso do governo Biden de apoiar as democracias contra a autocracia.
Mesmo com uma possível vitória de Kilicdaroglu, o destino da geopolítica turca ainda não está claro. Na última década, Erdogan gradualmente afastou a Turquia dos Estados Unidos e da Europa. Especialmente desde a tentativa fracassada de golpe na Turquia em 2016, ele formou um vínculo com o presidente russo, Vladimir Putin, com os dois líderes frequentemente se encontrando e concordando em acordos de compartilhamento de poder na Síria, Líbia e no sul do Cáucaso.
Embora a Turquia tenha fornecido drones e outros equipamentos militares para a Ucrânia, Erdogan se recusou a participar das sanções lideradas pelos EUA contra a Rússia, fornecendo a esta última um valioso acesso aos mercados globais.
Kilicdaroglu não é amigo da Rússia. Em uma entrevista recente ao Wall Street Journal (que quem o Estadão republicou análise sobre as eleições turcas), ele disse que Ancara cumpriria as decisões ocidentais sobre sanções. Ele também prometeu aproximar a Turquia da Otan e da União Europeia. Prometeu aprovar a adesão da Suécia à Otan- sustentada por Erdogan - antes da cúpula da aliança em julho.
Se as pesquisas estiverem certas, seu maior rival, Kemal Kilicdaroglu, deve chegar à frente da disputa, mas com uma vantagem muito pequena. O ambiente altamente polarizado fazem os dois candidatos flertarem com marca dos 50% dos votos, o que decidiria a eleição no primeiro turno - o segundo, dependendo da votação dos candidatos nanicos, será realizado no dia 28.
Erdogan é um personagem controvertido. Herdou o segundo país mais populoso da Europa castigado por uma inflação crônica e taxas de juros estratosféricas. Ele tinha 49 anos e misturava um populismo nacionalista com um tempero religioso. O futuro da Turquia parecia brilhante.
"A democracia é como um bonde. Você segue até o seu destino, então você desce", dizia Erdogan, então prefeito de Istambul, nos anos 90. Mas, como presidente, ele trancou as portas, acelerou e nunca mais saiu. Foram 20 anos atacando as instituições, especialmente o Judiciário, e perseguindo opositores.
Em 20 anos, deu tempo de domar a inflação, vislumbrar um lapso de prosperidade e sonhar com a Europa. Mas foram tantos anos no poder que Erdogan foi perdendo capital político: recentemente, o custo de vida voltou a disparar, a insatisfação popular aumentou e a Turquia acordou do sonho europeu com o barulho de bombas no quintal: um conflito civil ao sul, na Síria, e uma guerra de verdade do outro lado do Mar Negro, na Ucrânia.
O sultanato de Erdogan viveu momentos de tensão. Em 2013, um movimento popular se espalhou pela Turquia - parte de uma onda global de insatisfação que varreu o mundo islâmico e chegou até o Brasil. O governo se manteve firme, resistindo aos protestos na Praça Taksim, em Istambul, reprimidos com violência pela polícia.
Em vez disso, é provável que Putin se volte para sua arma comercial para atingir a economia da Turquia. Putin pode proibir visitas turísticas à Turquia (citando “preocupações de segurança”) e pode tentar limitar as importações agrícolas. Ele também pode exigir o pagamento imediato das contas de energia atrasadas de Ancara – cerca de US$ 4 bilhões – e impor preços mais altos às exportações de gás natural para a Turquia. Essas medidas custariam muito à já frágil economia do país dezenas de bilhões de dólares, desencadeando uma crise cambial.
Tudo isso deve estar na mente de Kilicdaroglu. Ele sabe que nenhum governo de coalizão terminou seu mandato desde que a primeira administração do tipo apareceu em cena na década de 1960. Um colapso econômico, combinado com disputas internas da coalizão, tornaria seu governo fraco e ineficaz aos olhos do eleitorado. Esses desenvolvimentos podem permitir que Erdogan encene um retorno político à moda do primeiro-ministro israelense Binyamin Netanyahu.