O Prêmio Nobel da Paz foi atribuído, nesta sexta-feira (6), à ativista iraniana Narges Mohammadi, atualmente presa em Teerã, por seu combate à opressão das mulheres na República Islâmica, onde as autoridade classificaram a decisão como "tendenciosa e política".
O prêmio de Mohammadi chega em meio a um amplo movimento de protesto na República Islâmica, após a morte sob custódia policial, há um ano, da jovem curdo-iraniana Mahsa Amini, detida pela acusação de violar o rigoroso código de vestimenta feminino.
VIDA EM DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS
Narges Mohammadi, de 51 anos, dedicou sua vida à defesa dos direitos humanos em seu país, opondo-se à obrigatoriedade do véu, ou à pena de morte, e sendo repetidamente detida e encarcerada por isso desde os 22 anos, quando foi presa pela primeira vez.
A presidente do Comitê Norueguês do Nobel, Berit Reiss-Andersen, afirmou que a ativista foi premiada por "sua luta contra a opressão das mulheres no Irã e por sua luta para promover os direitos humanos e a liberdade para todos".
Após o anúncio, seu filho Ali, de 17 anos, declarou em uma coletiva de imprensa que estava "muito, muito orgulhoso" de sua mãe, acrescentando que o prêmio é "uma recompensa para o povo iraniano", disse ele em Paris, onde vive com a irmã gêmea e o pai, Taghi Rahmani.
A ativista e jornalista, que foi presa pela última vez em 2021, não reencontra o marido nem seus dois filhos há oito anos e não se sabe se foi informada sobre sua atribuição, disse Rahmani.
Mohammadi, que está detida na prisão de Evin, em Teerã, também é vice-presidente do Centro de Defensores dos Direitos Humanos, fundado pela iraniana também vencedora do Prêmio Nobel da Paz Shirin Ebadi, que defende, entre outras causas, a abolição da pena de morte.
O anúncio não foi bem recebido por Teerã, que denunciou a decisão como "tendenciosa e política" e criticou que a iraniana "foi considerada culpada de reiteradas violações da lei e que cometeu atos criminosos", disse o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores do Irã, Nasser Kanani.
BUSCA PELA LIBERDADE
A ONU e o Comitê Norueguês do Nobel instaram o Irã a libertar a jornalista, enquanto a organização Repórteres sem Fronteiras lembrou que ela é alvo de um "assédio judicial e policial para silenciá-la".
Reiss-Andersen ressaltou que sua "luta corajosa" teve "um tremendo custo pessoal", com 13 detenções, cinco condenações e uma sentença de um "total de 31 anos de prisão e 154 chicotadas".
O secretário-geral da ONU, António Guterres, comemorou esta "homenagem a todas as mulheres que lutam por seus direitos, arriscando sua liberdade, saúde e até suas vidas".
Este Nobel é "um lembrete importante de que os direitos das mulheres e meninas estão enfrentando uma forte resistência, inclusive através da perseguição às defensoras dos direitos humanos, no Irã e em outros lugares", afirmou em um comunicado.
Em uma entrevista concedida à AFP em setembro, em que respondeu por escrito da prisão de Evin, a ativista considerou que o protestos recentes aceleraram "o processo de democracia, liberdade e igualdade no Irã" e que a mudança no país era "irreversível".
Em 16 de setembro, Mohammadi e outras três prisioneiras queimaram seus véus no pátio da prisão, por ocasião do aniversário da morte de Mahsa Amini, segundo publicação em sua conta no Instagram, administrada por sua família.
De acordo com a a organização Iran Human Rights (IHR), um total de 551 manifestantes, incluindo 68 crianças e 49 mulheres, foram mortos pelas forças de segurança em meio a estas mobilizações. Milhares também foram presos.
A revolta continua, embora de outras formas. Agora as mulheres saem sem véu nas ruas, sobretudo em Teerã e outras grandes cidades, apesar dos riscos, algo impensável há um ano.
"Narges Mohammadi é uma heroína para muitos no Irã e em todo o mundo", elogiou Abram Paley, enviado especial interino dos EUA no Irã, em sua conta na rede social X (antigo Twitter).
O presidente americano, Joe Biden, reforçou o pedido ao governo de Teerã para que liberte "imediatamente" a ativista iraniana.
"Este prêmio é um reconhecimento de que, embora atualmente esteja detida injustamente na prisão de Evin, o mundo ainda escuta a voz de Narges Mohammadi pedindo liberdade e igualdade", afirmou Biden em um comunicado.
No ano passado, com a guerra na Ucrânia como pano de fundo, o prêmio foi entregue a um trio muito simbólico de defensores dos direitos humanos: a ONG russa Memorial - oficialmente dissolvida na Rússia -, o Centro ucraniano para as Liberdades Civis (CCL) e o militante bielorrusso preso Ales Bialiatski.
O prêmio inclui uma medalha de ouro, um diploma e uma quantia de 11 milhões de coroas suecas (cerca de um milhão de dólares ou 4,7 milhões de reais, na cotação atual).