O segundo turno na Argentina será disputado por dois candidatos com ideias opostas em quase tudo, incluindo a solução para o pior problema do país: a inflação. De um lado, o peronista Sergio Massa, atual ministro da Economia, diz que vai buscar o equilíbrio fiscal e uma taxa de câmbio competitiva sem renunciar a programas sociais. Do outro, o libertário Javier Milei promete cortar gastos e dolarizar a economia.
Para analistas, a forma de derrubar a inflação é a diferença fundamental dos dois projetos. A Argentina acumula uma inflação de 138% neste ano e sofreu uma desvalorização de quase 95% da moeda local, o peso, nos últimos quatro anos.
Massa e Milei terão de se esforçar para convencer os eleitores de que suas ideias são capazes de solucionar a grave crise econômica. A carestia na Argentina, porém, é crônica. O país viveu três grandes crises nas últimas quatro décadas e nunca conseguiu resolvê-las por completo. Apesar de ciclos econômicos virtuosos, o déficit fiscal, a alta dívida externa, a falta de credibilidade da moeda e a escassez de dólares continuam trazendo prejuízos.
CAMPANHA
O efeito prático e mais danoso é o aumento da pobreza. No primeiro semestre, segundo o Instituto Nacional de Estatísticas e Censo (Indec), órgão ligado ao Ministério da Economia, de 29,4 milhões de pessoas que participaram de um estudo em 31 áreas urbanas, 11,8 milhões viviam na pobreza (40,1%).
"Não é somente uma razão que faz a Argentina ter um problema fiscal tão grande, mas uma soma de razões", afirmou o professor de economia da ESPM, Leonardo Trevisan. Para Fabio Giambiagi, argentino e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), "algumas reformas não foram feitas, o que causa uma diferença com o Brasil, que conseguiu resolver seu problema de hiperinflação".
GASTOS SOCIAIS
O peronista Massa promete melhorar as contas internas e externas do país, mas sem mexer nas políticas sociais. "O que está por vir é mais distribuição de renda, mais educação pública, mais investimento nas universidades", disse o candidato governista durante o primeiro turno.
No entanto, as políticas que Massa implementou como ministro da Economia, cargo que assumiu em julho de 2022, já no cenário de hiperinflação e crise, não são vistas por analistas como mudanças estruturais.
Segundo Giambiagi, não está claro como Massa pretende aliar o ajuste das contas argentinas com as políticas de gastos públicos que pretende manter. Também paira sobre o candidato o histórico de reviravoltas no perfil político. No passado, Massa apresentou soluções pró-mercado para a Argentina. "Ele vai ter de mexer, mas não está muito claro como isso vai ser feito", declarou.
CORTE DE DESPESAS
Já Milei, que defende um liberalismo radical, promete soluções mais severas, com um corte nos gastos públicos de até 15% do PIB. Sua principal aposta, a dolarização da economia, dizem especialistas, levaria ao fim da autonomia da Argentina no comando da macroeconomia.
Neste caso, a Argentina perderia a capacidade de desvalorizar a moeda ou emitir dívida pública, o que em alguns casos é necessário dentro de determinadas condições econômicas. "Quando você dolariza, você perde a autoridade sobre a macroeconomia. Você submete a sua economia a uma outra realidade, que é a dos EUA", disse Trevisan.