O principal opositor russo, Alexei Navalny, morreu nesta sexta-feira (16) aos 47 anos em uma prisão do Ártico onde cumpria uma pena de 19 anos, um mês antes das eleições que devem consolidar no poder o presidente Vladimir Putin.
As principais potências ocidentais e países do ex-bloco soviético atribuíram a morte ao governo russo, que ainda não divulgou as causas do falecimento e considerou "totalmente inaceitáveis" essas acusações.
O presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, disse estar "indignado" com a morte de Navalny e afirmou que "Putin é responsável" por sua morte.
OPOSIÇÃO REDUZIDA
A morte de Navalny, que em 2020 sobreviveu a um envenenamento e estava preso desde 2021, priva de sua maior voz uma oposição russa reduzida ao mínimo pela repressão que se intensificou após o inicio da ofensiva na Ucrânia, em fevereiro de 2022.
Depois do anúncio de sua morte, convocações de manifestações circularam na Internet.
A promotoria de Moscou advertiu que "organizar ou celebrar manifestações não autorizadas, convocá-las e participar delas é uma infração administrativa".
MORTE SEM DETALHES
As autoridades russas revelaram poucos detalhes das circunstâncias da morte de Navalny, limitando-se até o momento a assegurar que foram feitos todos os esforços para reanimá-lo.
"Em 16 de fevereiro de 2024, no centro penitenciário N°3, o prisioneiro Navalny A.A. passou mal após uma caminhada e quase imediatamente perdeu a consciência", afirmou o serviço penitenciário da região ártica de Yamal em um comunicado.
O ativista, condenado por "extremismo", cumpria pena de 19 anos de prisão em uma colônia penal remota do Ártico. Os vários processos contra ele foram tachados de motivados politicamente.
Advogado, Navalny começou a ganhar fama na Rússia na década de 2010 por vídeos em que denunciava a corrupção. Ele também ajudou a organizar grandes manifestações da oposição em 2011 e 2012, que foram duramente reprimidas.
Navalny, que em um primeiro momento foi muito próximo do nacionalismo, se consolidou como o principal opositor de Putin, que criticava com veemência ao afirmar que seu partido era integrado por "ladrões e vigaristas".
Putin deve ser considerado "pessoalmente responsável" e "punido" pelas atrocidades cometidas contra Navalny, declarou a viúva do opositor, Yulia Navalnaya.
Até o momento, o mandatário russo não comentou a morte de seu adversário.
ACUSAÇÕES GROSSEIRAS
As acusações, no entanto, provocaram uma resposta das autoridades russas.
"Em vez de fazer acusações grosseiras, valeria mais dar demonstrações de moderação e aguardar os resultados oficiais da investigação médica", afirmou o Ministério de Relações Exteriores.
"Não há nenhuma informação sobre a causa dessa morte e, no entanto, essas declarações se multiplicam [...] Nós as consideramos totalmente inaceitáveis", disse, por sua vez, o porta-voz de Putin, Dmitri Peskov.
O secretário-geral da ONU, António Guterres, pediu uma investigação "crível" sobre as causas da morte de Navalny.
Biden afirmou que, embora não se saiba "exatamente o que aconteceu", Putin é definitivamente o "responsável" pela morte de uma figura presa em duríssimas condições, que havia se tornado "uma voz poderosa para a verdade".
Já o primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, classificou Putin como "monstro".
"É uma tragédia que faz o mundo inteiro lembrar-se de que Putin é um monstro", declarou o premiê canadense à emissora pública CBC.
'RESPONSABILIDADE DE PUTIN'
Os países que fizeram parte da União Soviética ou que integraram o bloco comunista até sua dissolução nos anos 90 também não duvidam da "responsabilidade" de Putin.
O presidente da Ucrânia, Volodimir Zelensky, declarou que Putin deve "prestar contas por seus crimes".
A primeira-ministra da Estônia, Kaja Kallas, escreveu no X que a morte de Navalny era "uma lembrança sombria do regime desonesto ao qual somos confrontados", enquanto o chefe da diplomacia polonesa, Radoslaw Sikorski, destacou à agência polonesa PAP que Putin "era responsável por tudo isso".
Nos últimos meses, Navalny apareceu muito magro e abatido nas audiências de seus processos, das quais participou por vídeo.
Leonid Solovyov, um dos advogados de Navalny, declarou ao jornal independente Novaya Gazeta que o opositor estava "normal" quando um de seus representantes o visitou na quarta-feira.
O diretor de redação do Novaya Gazeta, o jornalista russo Dmitri Muratov, prêmio Nobel da Paz em 2021, chamou a morte de Navalny de "assassinato".
'NÃO SE RENDAM'
O opositor enfrentou vários problemas de saúde relacionados a uma greve de fome e ao envenenamento que sofreu em agosto 2020 na Sibéria, em plena campanha para as eleições regionais.
Ele precisou ser levado para a Alemanha para receber tratamento, uma decisão autorizada pelo Kremlin.
Embora soubesse que a detenção o aguardava, Navalny decidiu regressar à Rússia e foi preso em janeiro de 2021 no aeroporto.
A prisão não abalou sua determinação. Nas últimas audiências e nas últimas mensagens publicadas em suas redes sociais por meio dos advogados, Navalny não deixou de criticar Putin.
No dia 1º de fevereiro, sua equipe publicou uma mensagem na qual convocava uma manifestação na Rússia para as eleições presidenciais de 15 a 17 de março.
A vitória de Putin parece ser um fato consumado, dado que todas as figuras da oposição estão presas ou no exílio ou suas candidaturas foram impugnadas.
Em uma de suas últimas mensagens, Navalny defendeu o voto em "qualquer candidato" diferente de Putin.
E em um filme do canadense Daniel Roher sobre sua vida, que recebeu o Oscar de melhor documentário em 2023, o opositor deixou um "testamento" aos russos caso morresse: "Não se rendam!".