O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva deu um "grito de socorro" sobre a situação da Faixa de Gaza e que o teor da fala do presidente pode ser debatido, mas não se deve perder de vista o essencial da discussão.
Haddad lembrou que o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) não votou nenhuma resolução sobre a situação de Israel e Gaza - conflito que Lula comparou ao Holocausto. As declarações foram dadas à jornalista Miriam Leitão, da GloboNews, em entrevista gravada à tarde e exibida na noite desta quarta-feira, dia 21.
Em meio à tensão provocada pela fala de Lula, o secretário de Estado dos EUA, Antony Blinken, se reuniu na quarta-feira, 21, com o presidente brasileiro no Palácio do Planalto, em Brasília - uma escala do chefe da diplomacia americana antes da reunião de chanceleres do G20, no Rio.
Segundo o porta-voz do Departamento de Estado, Matthew Miller, na conversa entre os dois, a portas fechadas, Blinken disse a Lula que discorda da comparação de Gaza com o Holocausto, feita pelo brasileiro no domingo, 18.
"O secretário (Blinken) teve a oportunidade de discutir os comentários com o presidente Lula no encontro, no contexto da discussão geral sobre o conflito em Gaza, e deixou claro que são comentários com os quais discordamos", afirmou Miller. O tema é sensível para Blinken, que é judeu e já relatou algumas vezes a história de como o seu padrasto, o advogado Samuel Pisar, sobreviveu ao Holocausto.
A crise diplomática entre Brasil e Israel foi desatada após a comparação que o presidente fez entre o Holocausto e a campanha militar israelense contra o Hamas. Após uma troca de reprimendas e de consultas com embaixadores, Lula foi declarado persona non grata em Israel - uma forma de dizer que o brasileiro não é bem-vindo no país.
Em um post no X (ex-Twitter), a chancelaria de Israel chegou a afirmar que Lula havia negado o Holocausto. O Itamaraty respondeu na terça-feira. O chanceler Mauro Vieira acusou o governo israelense de atacar o Brasil de forma "insólita" e "revoltante". O governo estudou vários cenários, mas optou por não alimentar mais a crise.
Expulsão
Uma das alternativas analisadas é a expulsão do embaixador de Israel no País, Daniel Zonshine, que por enquanto está descartada. Mas, em conversas reservadas, auxiliares de Lula dizem que a ideia foi apresentada a ele e o tema pode voltar à agenda se a diplomacia israelense subir o tom ou adotar alguma medida mais séria.
"Hoje, o nosso foco é no G20, não em amplificar a tensão", disse um diplomata ao Estadão. A expulsão de um embaixador é uma atitude muito drástica, que será tomada apenas em último caso, embora o cenário tenha sido apresentado a Lula na reunião de segunda-feira, que contou com a presença de integrantes da coordenação política do governo e do assessor para Assuntos Internacionais, Celso Amorim.
Nos últimos meses, o Itamaraty já teve quatro consultas com Zonshine para manifestar insatisfação com Israel ou com ele próprio, após sua participação em uma reunião com parlamentares de oposição com a presença de Jair Bolsonaro, no ano passado.
Agora, um dos alvos da insatisfação brasileira é o chanceler israelense, Israel Katz, que levou o embaixador do Brasil em Tel-Aviv, Frederico Meyer, ao Museu do Holocausto para lhe passar uma reprimenda pública em hebraico. Lula e Vieira consideraram o episódio uma humilhação. Meyer foi chamado de volta a Brasília, mas Lula não decidiu ainda pela remoção completa.
Interesses
A relação entre Brasil e Israel está deteriorada no mais alto nível, entre Lula e o premiê Binyamin Netanyahu, e no primeiro escalão ministerial, entre Vieira e Katz. Mas o Brasil não quer colocar mais lenha na fogueira. A expulsão de Zonshine poderia desencadear o rompimento de relações diplomáticas, algo que não interessa a nenhum dos lados.
A indisposição com embaixador não é nova. Desde o ano passado, parlamentares do PT pedem sua expulsão, entre eles o líder do governo na Câmara, José Guimarães (CE). Agora, aliados de Lula voltaram a defender uma atitude mais severa. O Itamaraty, porém, busca uma trégua. Segundo uma fonte a par da última conversa entre Vieira e Zonshine, a posição brasileira de não escalar a crise foi claramente transmitida a ele.