Sempre que acordo, tenho um sonho novo para contar. Na verdade, o dia consiste na enorme quantidade de fantasias que invadem o íntimo. O tempo se alonga em realismos ficcionais. Não importa o dia ou a hora, vale a capacidade de gerar um mundo imaginário. Então, existo em plenitude. Trago sensações que me invadem a qualquer hora, basta apenas um minuto de inventividade. Assim, deixo-me levar pelo que há de invenções na existência. Nada me escapa em momentos de solidão. Descubro-me a qualquer hora do dia, importa alimentar o excesso de ilusões. Sento na poltrona do quarto de estudo e permito exaltar o plasma da ironia que permeia o ânimo. Serei única nesses momentos tão frequentes? Creio que não. Todos guardam eflúvios no imaginário. Sigo à toa pelos esconderijos diários que me cercam.
E os segundos se somam na continuidade do que ouso inventar. Sempre fui assim. Desde criança a mãe externava a constante observação no ato solitário. Chamava-lhe a atenção o fato de os olhos piscarem com mais intensidade. Então, espantava-se com o silêncio que disfarçadamente me envolvia. Sempre fui pensativa e não me escaparam os rodeios do analisar. Afinal, viver é acreditar nos fantasmas que nos acompanham. Não sou única e jamais serei. Estou rodeada de milhares de enigmas que se apossam dos momentos silenciosos. Sinto em demasia o ato da presentificação e a saudade se estende mundo afora.
A infância me vem numa onda de alegria, quando a renovação se faz mais forte que qualquer outra coisa. Vez por outra me assusto com o excesso de imagens à frente. Tão reais quanto imaginárias. Não vale poupar os anseios que invadem a mente e a transformam em múltiplas realidades. Gosto do ato dos devaneios, tão sábios e tão heréticos; que os cenários hipotéticos me permitam prolongar o dia e a noite em verdadeiros santuários! Vou e volto pisando leve o chão que me acompanha. Desde quando recuso os fantasmas? Nunca os recusei. Urge acolhê-los intensamente para que a vida se transforme em uma tela inventiva. Passados existem e a lembrança sabe renová-los com a máxima precisão. Não adianta fugir dos enigmas. Opto por assumi-los com a máxima gratidão. Se durmo sem sonhar, desconfio do tempo perdido. Acolhem-me milhares de devaneios. "Se alguém me dissesse,/ que quisera crer./ Mas sinto-o, e é esse/ O ar bom que me tece/ Visões sem as ver." Nada mais pertinente que usufruir da beleza oculta. Necessito ir além de mim, em um inventário que faz parte do Eu. Longe de esconderijos à toa. Vale, sim, acreditar em todos os anseios que elevam a imaginação. Assim, os caminhos se tornam mais crédulos. Vou e volto, um percurso que me deixa feliz. Acredito nos enlevos, daí aceitar os rodeios do instante.
E o tempo passa sem pedir licença; ir em frente é seguir a ânsia de encontrar suposições outras. Quantas vezes me perco em uma insistente procura! Vale acreditar em cada passo que se segue. Chego a transbordar de excitação. E não me arrependo. Urge aceitar as curvas do caminho. A alma sabe acreditar no nada e no tudo. E o poeta me afaga: "Revivo, existo, conheço,/E, ainda que seja ilusão/O exterior em que me esqueço,/Nada mais quero nem peço./Entrego-lhe o coração." Quantas metáforas Fernando Pessoa nos entrega? Em cada momento, um suspiro de euforia. Difícil responder. As suposições se alongam pelo mundo afora. Nada mais vibrante que a existência. Melhor assumir as contradições; então, a estrada se divide para nos acolher.
Perdoe-me Santa Tereza d´Ávila: a imaginação não é a louca da casa.
Fátima Quintas, da Academia Pernambucana de Letras-email:fquintas84@terra.com.br.