E quando falta a esperança, de que pode viver um povo? A sensação é que as rinhas políticas vivenciadas no Brasil, intensificadas nos últimos ciclos eleitorais, nos tiraram as linhas mestras do debate sobre o que realmente importa. A falta de consistência das nossas políticas públicas ficou ainda mais evidente com a tragédia climática que dilacerou o Rio Grande do Sul.
Muitos vêm se esforçando para apontar causas e culpados pelo ocorrido. De fato, toda tragédia tem seus responsáveis, mas, observando algo dessa magnitude, não podemos cair na tentação de encontrar respostas fáceis e estrategicamente convenientes com discursos políticos acalorados e imediatistas. Agora já se desenha uma disputa entre governo federal e governo estadual pelo protagonismo nas ações de socorro e suporte à população. A situação fiscal do Rio Grande do Sul, herança de sucessivas gestões, trouxe à tona o debate sobre a distribuição de recursos entre os entes federados, além da incapacidade de termos uma gestão no Brasil pautada, de fato, pelo equilíbrio dos gastos públicos.
O fato é que em outubro teremos eleições municipais e certamente o fenômeno ocorrido nos municípios gaúchos terá impactos nos discursos dos candidatos e na avaliação que os eleitores farão para orientar sua escolha. A pronta resposta do gestor, aliada à sua habilidade para se mostrar empático e próximo das pessoas, podem ser elementos determinantes, conforme ensinou o processo eleitoral realizado durante a pandemia da Covid 19. Mas há fatores anteriores aos acontecimentos trágicos, como a correlação de forças políticas, que podem levar o debate para outras direções. Questões estruturais, como a renda e escolaridade do eleitor, também alicerçam as percepções sobre o desempenho dos atores políticos na condução de crises.
Medidas de curto prazo certamente não serão suficientes para mitigar os efeitos da tragédia climática. Como no Brasil não somos especialistas em desenhar políticas públicas estruturadoras, a capacidade de equilibrar respostas imediatas com visão de longo prazo vai ser testada. Outro aspecto é a sabedoria dos gestores para aprenderem lições que possam apoiar na revisão dos paradigmas que norteiam a ação pública.
Fora as pesquisas de opinião pública, que outros fóruns a sociedade civil tem para apontar prioridades? As camadas mais vulneráveis, que estão neste momento recebendo assistência, serão incluídas como parte ativa da produção de soluções? Suas dores, suas necessidades, estarão no centro das mesas de planejamento? Estamos falando da reconstrução de um Estado, da infraestrutura básica de locomoção, das atividades produtivas, dos lares, das histórias que foram arrastadas pelas águas. Serão necessários recursos, organização, planejamento, mas muita capacidade de repensar os pilares que nos constituem e, sobretudo, ter a política como parte da solução, conjugada com o verbo esperançar. É com esperança que o povo brasileiro se move, sobrevive e se reinventa. E que ela não nos falte dessa vez.
Priscila Lapa, jornalista e doutora em Ciência Política.