Reforma do Judiciário vista como ameaça à democracia gera manifestações, greves e crise política em Israel

JC
Publicado em 28/03/2023 às 0:00


Num país forjado pelos conflitos, a saúde da democracia e o funcionamento pleno das instituições democráticas tem mobilizado a população e atores políticos de variados matizes. Todos unidos contra uma proposta do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, que pretende reformar o Poder Judiciário, colocando os juízes, na prática, em submissão ao Poder Legislativo. Como esse é um movimento conhecido de governos autoritários, a reação dos israelenses vem sendo proporcional à ameaça, com muita gente nas ruas, greves que paralisaram o país, e até a declaração de greve de fome por quase três dezenas de prefeitos de diferentes partidos.

A intensificação das manifestações nas últimas semanas chegou ao ápice ontem, com o adiamento da reforma, em comunicado do premiê. A polêmica foi provocada, especialmente, pela possibilidade contida na reforma, de que o Parlamento seja capaz de mudar decisões da Suprema Corte de Israel. A aprovação causaria um claro desequilíbrio entre os poderes, pondo a democracia em xeque, e o país, à mercê da vontade dos parlamentares – que por sua vez reflete a base de apoio do primeiro-ministro. Com o agravamento da crise política, Netanyahu foi alvo de uma moção de censura que poderia tê-lo tirado do cargo. No entanto, por 60 votos a 51, o primeiro-ministro continua. E diz que está aberto ao diálogo, mas segue firme na disposição de aprovar as mudanças no Judiciário – concentrando o poder no Parlamento e estreitando a democracia.

Os manifestantes encheram as ruas em Tel Aviv e Jerusalém. No próprio governo, há ministros que afirmam que vão renunciar, caso a reforma prospere. O ministro da Defesa pediu publicamente a interrupção do processo de reforma, e foi exonerado por Netanyahu um dia depois. Vale ressaltar que o ministro demitido, Yoav Galant, pertence ao mesmo partido conservador que o primeiro-ministro, o Likud. Nas palavras de Galant, a reforma impõe “uma ameaça real para a segurança de Israel”, pelo tumulto que está causando à ordem democrática no país.

O teor é semelhante à declaração do presidente israelense, Isaac Herzog – que não pode ser demitido por Netanyahu. O presidente afirmou que a proposta ameaça a segurança, a economia e a sociedade do país. Clamando por liderança e responsabilidade da parte do chefe de governo, o chefe de Estado aponta o risco da polarização criada pelo primeiro-ministro, ao insistir na reforma do Judiciário desde o início do ano. Em uma fala que destaca a importância, ao mesmo tempo, da democracia para Israel, e de Israel para a democracia, Herzog declarou aos integrantes do governo, sobretudo para a base no Parlamento: “Os olhos do povo de Israel estão voltados para vocês. Os olhos de todo o povo judeu estão em vocês. Os olhos do mundo inteiro estão em vocês”.

Sustentado pela direita radical que apoia a proposta e quer assumir a função do Judiciário, Benjamin Netanyahu pode perder sua base, se desistir da reforma. Por isso, por enquanto, assumiu somente o ônus da suspensão. Mas pelo visto, enquanto a proposta não for cancelada, a crise continua, ecoando a defesa das instituições democráticas pelos israelenses.

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