As pessoas precisam se deslocar nas grandes cidades e nos centros urbanos formados por regiões metropolitanas, de algum modo. São massas populacionais que se movimentam, diariamente, para o trabalho, o estudo, o atendimento de saúde, a visita familiar, e desses e outros destinos de volta para casa. Nada mais lógico e esperado que a demanda pela mobilidade tenha a resposta adequada em serviços coletivos, em estrutura suficiente para o contingente sabido. Infelizmente, em muitas metrópoles brasileiras, o transporte público é um problema que se agrava, há anos, sem que os governos tenham conseguido reverter seus efeitos, seja por má gestão dos sistemas em utilização, seja por falta de investimentos necessários à modernização e ampliação dos serviços.
O JC vem trazendo nos últimos dias uma série de reportagens especiais, na coluna Mobilidade, de Roberta Soares, que trata de uma consequência direta do vácuo no transporte coletivo no Brasil: a transformação da motocicleta em transporte de massas. “Uber moto: perigo sobre duas rodas” aborda a exploração comercial do nicho gerado pela ausência de políticas públicas voltadas para a questão. Sem o correto uso dos equipamentos de proteção, o fenômeno se torna preocupante não apenas para o tráfego já complicado das grandes cidades, mas também para a saúde pública, por sua vez, também, já sobrecarregada por causa de sinistros envolvendo as motos, responsáveis por até 50% das mortes no trânsito brasileiro.
Mesmo que os cuidados com a segurança venham a ser seguidos e fiscalizados – e não são, nem uma coisa, nem outra – o aumento do serviço de passageiros nas motos, como já se deu anos atrás com as vans, se estabelece como opção ao transporte coletivo ineficiente, desconfortável e com poucas rotas ofertadas. Sem um metrô decente e acessível, os habitantes da Região Metropolitana do Recife igualmente não contam com os ônibus para se deslocar de forma segura e rápida. Além do investimento maciço, adiado há décadas, no sistema metroviário, falta decisão política que privilegie o transporte coletivo rodoviário, através de faixas exclusivas e veículos de qualidade, para que a população, de todas as classes sociais, seja atraída e se faça adepta desse meio de deslocamento.
O transporte coletivo na moto é uma demonstração do desapreço de seguidos gestores públicos, de todos os níveis de governo, pelos sistemas rodoviário e metroviário no país. No caso dos ônibus, a solução requer mais decisão do que recursos, e algum investimento na melhoria dos veículos e ampliação de rotas e frotas. A adoção de faixas exclusivas pode ser vista como sucesso em cidades como São Paulo, cujo trânsito, apesar do tamanho, flui mais do que o do Recife, até por ter um sistema metroviário que funciona. Enquanto as decisões sensatas não são tomadas, e os investimentos não passam de promessas, a mobilidade equilibrada em duas rodas surge como alternativa prática – ainda que arriscada – para a população.