Enquanto o chamado arcabouço fiscal que substitui o teto de gastos continua deixando mais dúvidas do que confiança na austeridade financeira do novo governo Lula, o ministro Fernando Haddad, da Fazenda, busca articulação para a costura de uma reforma tributária digna desse nome. Trata-se de articulação que envolve a União e os estados, para combinação que traga, no mesmo pacote, algum alívio para o bolso dos cidadãos, recursos para os entes federativos e garantia para a efetividade do arcabouço, sem comprometer o nível do endividamento nacional, com consequências perniciosas para o país, nos próximos anos.
O ministro Haddad procurou ser sincero, ao realçar a importância de uma reforma tributária neste momento, na metade do primeiro ano de governo. “Está todo mundo pisando em um solo pouco firme, não temos segurança nem para tomar as decisões de investimento, tanto do lado privado quanto do lado público”, disse, em evento promovido pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), ontem. De acordo com ele, a aprovação da reforma é prioritária para as próximas semanas, e o presidente da Câmara dos Deputados, Artur Lira, já avisou que deve ser votada no início de julho.
Na visão do ministro da Fazenda, a aprovação de reforma dos tributos é um pressuposto para o funcionamento do arcabouço fiscal, por ser supostamente capaz de conferir segurança jurídica ao ambiente econômico. Ao afirmar isto, Haddad reconhece que os brasileiros estão pisando na insegurança jurídica e na instabilidade econômica, à espera de construções políticas que possam mudar o quadro, nada tranquilo, seja para a conjuntura social, seja para fundar alicerces de um novo ciclo de desenvolvimento. O mais inquietante da afirmação do ministro mora exatamente na condição transformadora, que valeria instantaneamente, em caso de aprovação de uma reforma tributária sobre a qual pairam, a exemplo do arcabouço, dúvidas e desconfianças.
A montagem do novo modelo tributário terá hoje uma reunião de governadores e secretários estaduais com o presidente da Câmara, a respeito do valor de um fundo de desenvolvimento regional, contido no projeto em discussão. Para o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, depois de muito debate, está na hora de a reforma ser aprovada, o que deve acontecer no segundo semestre, segundo ele. A expectativa para isso vem de muitos anos, mas os efeitos devem demorar, como já sinalizou o próprio ministro da Fazenda. Segundo Fernando Haddad, haverá um longo período de transição, para não prejudicar ninguém imediatamente, e a implementação do que for aprovado será gradual.
A dúvida acerca da velocidade de implantação da reforma tributária começa pelo apoio que o governo Lula conseguir com esse objetivo no Congresso – o que é uma incógnita, diante dos sinais de uma base difusa, susceptível a diversos tipos de pressão e interesses. Por outro lado, há flagrante contradição entre a urgência requerida por um “solo pouco firme”, onde repousa a instabilidade, e uma reforma proposta para ter consequências ao longo de uma ou mais décadas. Pois não nenhuma indicação de que a mera aprovação de um novo sistema tributário irá tornar o solo da economia mais firme.