A determinação política da economia não tardaria a se fazer valer em ano de eleições. A pressão aumenta com o avanço do calendário, e o governo federal vai abrindo a porteira aos poucos, para o aumento de gastos, deixando o déficit zero prometido pelo ministro Fernando Haddad cada vez mais distante. Ainda na margem do novo arcabouço fiscal, os ministérios do Planejamento e da Fazenda anunciaram o desbloqueio de quase R$ 3 bilhões em despesas não obrigatórias, que foram bloqueadas para aliviar a projeção do déficit. O desbloqueio às vésperas do encerramento do primeiro semestre não é surpresa, e parece atender a demandas do jogo eleitoral. Apesar da liberação, o governo Lula ainda conta com R$ 2,5 bilhões para usar no cheque especial do arcabouço fiscal, em caso de necessidade – política – que não leva em consideração os efeitos para o endividamento nacional.
Quando governos fazem estimativas para gastar mais do que arrecadam, na prática estão empurrando enormes dívidas para a população. Porque não são governos que se endividam, são nações, estados ou cidades. A Argentina quebrada, por exemplo, é resultante de uma série de presidentes populistas que fizeram administrações despreocupadas com o limite dos gastos. O Brasil volta a ir na mesma trilha, caso se continue fazendo de conta que a questão fiscal é um obstáculo ao desenvolvimento, e seria preciso o Estado gastar mais para gerar empregos – uma falácia que não se sustenta na história perdulária do Brasil. O preço dos gastos públicos é sempre cobrado depois, e por isso a maioria dos governantes não se importa com isso, a não ser que a dívida acumulada antes de sua gestão atrapalhe os planos de novos endividamentos.
O que seria um déficit primário de zero, em 2024, já vai em R$ 14,5 bilhões, de acordo com os novos cálculos oficiais. Por outro lado, o Produto Interno Bruto (PIB) poderá crescer 2,5%, segundo o governo federal, 0,3% acima da previsão anterior, no primeiro bimestre. O desbloqueio de R$ 2,9 bilhões veio junto à permissão de crédito suplementar de quase R$ 16 bilhões. Apesar da meta de equilibrar receita e despesa, o arcabouço fiscal estica a margem da meta para 0,25% do PIB, o que representa a possibilidade de um déficit de até R$ 28,8 bilhões este ano. Desse modo, o rombo pode e vai aumentar, uma vez desmantelado o arcabouço após a negação do teto de gastos que vigorava anteriormente.
A meta zero fica para o ano que vem com a mesma naturalidade com que os gastos são elevados no país da dívida sem fundo. Não é por acaso que tantas obras são anunciadas – e até inauguradas – sem que se saiba a fonte de financiamento para sua conclusão. O interesse político imediato prevalece sobre a viabilidade econômica, na maioria dos casos da gestão pública brasileira.