Editorial JC: Desequilíbrio tributário
Ainda sem faixa de isenção mais justa, a abertura do prazo de declaração do IR lembra a necessidade da contrapartida de melhores serviços públicos

O terceiro mandato do presidente Lula corre para o seu desfecho político e temporal, sem que uma das principais demandas dos brasileiros tenha virado realidade. Nesta segunda, abre-se o prazo para a entrega da declaração do Imposto de Renda. E mais uma vez, este ano, o desequilíbrio tributário castiga os contribuintes em uma faixa de renda que deveria ser poupada de pagar além do que já paga – o país segue com um dos lugares onde se dá uma das maiores cargas tributárias do mundo, em um sistema que sobrecarrega os cidadãos, incidindo na produção e no consumo de bens e serviços.
A distorção favorece o Estado, que infla o orçamento público pela arrecadação. Mas será que devolve o que recebe em serviços públicos de qualidade? Ou promove a justiça social que se espera da tributação, investindo prioritariamente em ações para a população de baixa renda?
A abertura anual do prazo de entrega do IR configura um lembrete da precariedade das entregas da gestão pública – de governos de todos os níveis – num país marcado pela desigualdade permanente, que atravessa gerações. Há uma crueldade intrínseca ao desequilíbrio tributário, e ao mau uso do orçamento gerado em grande parte pela arrecadação de impostos e taxas de toda ordem: as pessoas que mais precisam de atenção e aplicação dos recursos, continuam sem ver os resultados, enquanto governos e parlamentares disputam a primazia de sustentar privilégios, distribuir favores e gastar mal.
O Poder Judiciário não está fora desse círculo vicioso, com supersalários e benesses, por exemplo, que afrontam a realidade nacional. E o dinheiro cobiçado e utilizado pelos Três Poderes vem do povo e das empresas que pagam seus impostos.
Para não parecer alheio à continuidade da distorção no IR, o governo federal promete para esta semana o envio, para o Congresso, de um projeto de ampliação da faixa de isenção para quem recebe até R$ 5 mil mensais – hoje esse valor é de R$ 2.824,00. O presidente da República aproveitou os últimos dias antes do período de declaração para tocar no tema, como se viesse a ser um favor, ou uma grande proposta de sua autoria.
A questão é antiga, e poderia ter sido tratada no primeiro ano de mandato, para aplicação, ao menos, no segundo ano. Agora, programada para entrar na pauta legislativa na semana inicial da entrega das declarações, com previsão de aplicação para 2026, o projeto soa como busca de voto para um ano eleitoral. Ainda assim, caso seja aprovado, será a necessária correção mais justa da tabela, depois de longo atraso.
Para o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, mais complicado do que aprovar a nova isenção é fazer a compensação financeira no orçamento, que terá um rombo por causa da correção. Uma alternativa seria dar uma olhada nas emendas opacas dos parlamentares no Congresso, ou nos gastos ministeriais com a máquina burocrática e administrativa. Mas se o governo Lula não fez isso até agora, não será para um ano eleitoral que irá fazê-lo.
Confira a charge do JC desta segunda-feira (17)
